A Saga de Godofredo XV - A Acareação

31.03.22

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Saladino e Abbdul vieram ao estábulo com Nabi para ver as vestimentas dos assassin encontradas na cocheira de Schain por Halim e Abbud. Estes as guardaram até a chegada do sultão e do seu braço direito. Vieram com eles o chefe da guarda do castelo e o sentinela que o avisou da descoberta a pedido de Halim.

-Grande Sultão e Senhor, aqui estão as roupas dos mercenários que incendiaram os seus navios encontradas na cocheira de Schain. Nossas investigações nos trouxeram até aqui. Podem ver com seus próprios olhos e façam o seu julgamento – fala Nabi aos dois comandantes sarracenos.

Saladino observou a cena demoradamente sem nenhuma expressão em seu rosto. Avaliava friamente a situação. Abbdul também permanecia silencioso.

Passados alguns minutos, o chefe dos mouros falou:

-Quem garante que são as túnicas dos mercenários que incendiaram os meus navios?

-Nobre Sultão, o que nos garante que não são? Fizemos as nossas investigações pela cidade, pois segundo os boatos correntes, Schain é quem teria organizado esse ataque e chegamos até aqui por causa deles. Cabe ao grande senhor avaliar as evidências para que possa ter um veredito justo na acareação de hoje. Fizemos a nossa parte em nome de nosso nobre irmão Hassan, que se convalesce do ataque covarde que quase o matou, sendo injustamente acusado por Schain desse ato aos seus navios – respondeu eloquentemente Nabi.

-Meu filho nega veementemente essa ação e lhe garanto que ele não é um traidor! Meu nobre senhor o conhece desde pequeno e sabe de suas qualidades e deficiências, mas jamais nos trairia! – respondeu rispidamente o general Abbdul a Nabi.

-Senhores, os fatos e evidências estão postos à mesa. Iremos agora fazer o confronto dos dois e definirei a solução do caso. Temos algo maior com que nos preocupar do que nos enfrentarmos, pois a nossa próxima jornada é grande e honrada e sei que Alá nos mostrará a verdade e a vitória. Capitão Hamed, leve essas roupas para o castelo. Encontraremo-nos no início desta tarde. Que Alá nos faça justos!

O sultão e o general saíram para o castelo. Nabi, Halim e Abbud acompanharam o oficial sarraceno na retirada das vestimentas do piso da cocheira de Schain.

Os três companheiros saíram da cavalariça. Dirigiram-se à murada do porto para definirem as próximas ações. Nabi começou a falar:

-Ótimo, foi como o esperado. Hassan quer criar uma situação de dúvida e no confronto de hoje deixar Schain nervoso o bastante para que faça um novo ataque.Vamos ao seu encontro, relatar o que ocorreu.

Hassan estava em pé amparado por Mira na chegada dos três correligionários. Abraçou cada um deles saudando-os:

-Que Alá me traga boas notícias! Então, como foi a vistoria na cocheira de Schain?

-Que Alá lhe ajude hoje, meu irmão Hassan – retribui-lhe Nabi a saudação, acompanhado dos outros dois.

Nabi relatou o episódio da manhã. Hassan acompanhou com atenção. Mira também e depois de terminado o relato, ela disse:

-Eu sabia que era obra de Schain! Ele é intempestivo e acha que pode se safar desta situação.

-Sim, mas o seu pai continua desconfiado de mim, querida.

-Quero ver como ele agirá estando eu presente ao seu lado hoje na acareação. Serei a sua testemunha de defesa – completou Mira.

Nabi comentou mentalmente com Hassan:

-Seria ótimo ela estar ao seu lado. Vai deixar Schain ainda mais cego de ciúmes. Atacar-te-á com certeza!

-Sim, concordo. Vou me passar por vítima – respondeu Hassan.

A hora do confronto chegou. Hassan entrou amparado por Mira e caminhando claudicante no grande salão da fortaleza, com os seus companheiros atrás. Saladino, já sentado em seu trono, acompanhava-os com olhar duro e gélido. Hassan sentiu calafrios. Havia também mais dois senhores que Hassan não conhecia. O general Abbdul sentado tinha a sua frente uma cadeira vazia para Schain. Hassan sentou-se de frente ao assento do rival, separado por alguns metros. Abbdul lhe encarava com olhos de fúria. Mira puxou outra cadeira e acomodou-se ao lado de Hassan. Ela pegou a sua mão direta e a segurou carinhosamente. Era o seu apoio. Um silêncio sepulcral imperava na sala.

Schain entrou algum tempo depois. Tinha feições agressivas, dentes cerrados e olhos fulgurosos fixos em Hassan, que manteve a cabeça altiva encarando-o com um leve sorriso nos lábios. Um cão raivoso pronto para o ataque - deduziu Hassan. Ótimo! Halim, Abbud e Nabi sentaram-se atrás de Hassan para defendê-lo.

Saladino iniciou a acareação:

-Que Alá nos dê sabedoria e justeza! Vamos iniciar o confronto com as versões sobre o incêndio das nossas naus. Ao meu lado direito está Schain, filho do meu honrado general Abbdul, indicado como suspeito do ataque por parte do nobre mercador Hassan. Ao meu lado esquerdo está Hassan, acusado por Schain de ser o responsável pelo incêndio dos navios. Estão presentes também os nobres conselheiros Ibrahim e Islam, que darão o seu voto junto com o meu. Com a palavra Hassan para que prove a sua inocência.

Hassan levantou-se. Mira também e o apoiou em seu ombro. Hassan ainda estava fraco. Os três companheiros postados atrás também se levantaram, mas Saladino pediu que permanecessem sentados. Hassan encarou desdenhosamente a Schain e deu um beijo carinhoso no rosto de Mira, pedindo que se sentasse. Ficou em pé sozinho. Começou a falar a sua versão dos fatos:

-Nobre sultão e senhores conselheiros provarei aqui com as evidências colhidas hoje que os boatos correntes pelas ruas desta fortaleza e vilas adjacentes comprovam que o nobre filho do general foi quem orquestrou o ataque com mercenários da seita assassin às naus de comando. Ele tentou me incriminar alegando serem estes criminosos da tripulação do meu navio. O que não é verdade.

-Foram sim membros da sua tripulação quem incendiaram os nossos navios. Você é um cão mentiroso e descarado. Traidor! – retrucou Schain agressivo e raivoso levantando-se do seu assento e indo ao encontro de Hassan. Seu pai o segurou.

Hassan, mantendo a calma e o sarcasmo, respondeu com um largo sorriso de galhofa:

-Então é mentira que fui covardemente atacado pelo nobre filho do general Abbdul, que cego de ciúmes por eu ser o grande amor de Mira (olhando-a com carinho) quase me matou, senhores? Na noite de nosso duelo, em que foi batido por mim, ele fugiu covarde e rapidamente do salão logo que apunhalou o meu ombro, indo ao encontro destes mercenários, que para não serem reconhecidos efetuaram a troca das suas túnicas deixando-as na sua cocheira e encontradas hoje por meus companheiros aqui sentados. Confirma assim os rumores correntes pela cidade com essa evidência posta sobre esta mesa a minha frente –disse virando-se para Mira e abaixando-se para dar um beijo carinhoso na sua boca úmida e sensual.

Nesse momento, Schain intempestivamente pulou em direção a Hassan com duas facas em cada mão. Nabi gritou alertando-o. Halim e Abbud interpuseram-se segurando suas mãos impedindo um novo ataque. Mira aflita puxou Hassan para junto de seu colo.

-Mentiroso! Traidor! Eu te mato, eu te mato, cão imundo! – berrava compulsivamente Schain seguro pelos dois companheiros de Hassan. O general veio ao seu filho e o olhou nos olhos com firmeza dizendo-lhe: solte as facas! Schain, totalmente descontrolado e com lágrimas de raiva nos olhos, desabou nos braços do seu pai soluçando. Mas manteve as facas nas mãos.

Mira então se pronunciou de forma firme ao seu pai, com Hassan em seu colo:

-Meu querido e venerável pai, saiba que te amo muito, mas como pode ter desconfiança de quem protegeu corajosamente a sua amada filha e confiar em um desiquilibrado e covarde, que se esconde atrás das suas costas e das do seu pai, podendo fazer o que bem entende sem qualquer punição? Isso é justiça? Como Alá irá nos julgar?

Saladino ficou quieto e pensativo por um longo período. Depois, chamou o capitão Hamed para que desarmasse Schain. General Abbdul amparava o seu filho que soluçava em seu ombro. Quando Hamed foi sacar as facas, Schain golpeou-o na garganta indo em direção a Hassan que continuava inerte no colo de Mira. Abbud puxou sua adaga e golpeou a mão direita de Schain decepando-a com a faca ainda empunhada. Schain caiu hurrando de dor segurando o braço sem mão. Hamed jazia em uma poça de sangue no chão frio da sala. Estava morto.

Nota do Autor:

É uma obra de ficção e qualquer semelhança é mera coincidência.

Fernando Ceravolo
Enviado por Fernando Ceravolo em 31/03/2022
Reeditado em 31/03/2022
Código do texto: T7485350
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