Vontade
Vi-te. Já antes te olhara sem interesse, já antes te sabia, cirandando pelos muitos lugares da casa, limpando e rindo, um riso tonto, um correr desajeitado, uma sombra furtiva que só era natural sem gente por perto. Depois de te saber precisava ver o resto, a carne firme, a boca carnuda, os dentes torcidos, os dedos longos, a pele lisa.
Surpreendia-te. Assustava-te. Aparecia onde nunca esperavas. Seguia-te quando ias às compras ou passear nas folgas. A certa altura deixaste de ter medo e mostraste-te com ele ao lado. Mãos dadas, olhos brilhantes, alegria. Depois a intimidade, os abraços, a fuga para onde te não via.
Quando disseste que te casarias tinhas o ventre crescido e a maleta pronta. Ainda uma vez mais os meus olhos te seguiram até que o táxi desapareceu ao fundo da rua.