NO VAI E VEM DA VASSOURA

Quatro horas da manhã e dona Maria já está de pé, desde muito cedo aprendeu a trabalhar para sustentar a casa. Quando seu pai morreu de tuberculose ela era apenas uma criança e sentiu na pele o que aquilo lhe representava, não só na ideia de não ter a figura paterna e sim pelo fato dele ser o provedor, pois trabalhava de sol a sol para sustentar os 7 filhos e sua mulher.

Casaram-se jovens e as crianças vieram muito rápido. Ao passo de sete anos de casamento, sete crianças já levavam uma vida dura no interior da Paraíba. Moravam em uma casa de taipa que seus pais a exibiam com orgulho por ter construído com suas próprias mãos e sem ajuda de ninguém.

Quando completou 9 anos de idade seu pai faleceu e como era a primogênita teve que amadurecer muito rápido, deixou a boneca e passou a “brincar de adulto” cuidar dos irmãos mais novos era sua obrigação, ir para a roça campinar e pedir a Deus para mandar chuva era sua constante oração.

Não se sabe ao certo o que aconteceu, mas sua irmã mais nova teve uma febre muito alta durante a noite e quando amanheceu ela não mais se movia, tinha morrido. A mãe consternada de tristeza e desesperança adoeceu. Não comia e nem bebia, era de cortar o coração.

Por mais que os outros filhos implorassem, a mãe nada fazia, era como se não suportasse viver e quisesse ir ao encontro da filha morta. Com o passar dos dias o inevitável aconteceu: de fome e sede sua mãe morreu.

Sem a ajuda de ninguém, a menina mulher trabalhou na roça e criou os irmãos com muito esforço. Ela queria que todos estudassem, mas não tinha condições de comprar o básico para comer, imagina material para que os irmãos pudessem estudar?

Um a um, os irmãos foram crescendo e aos poucos todos estavam amigados. Menos Maria, ela se dedicou de uma forma tão exaustiva para criar os irmãos que esqueceu de cuidar dela mesma. Ao rezar, pedia a Deus que colocasse em seu caminho um homem bom, mas o coração a fez se apaixonar por João.

Por mais que fosse a mais velha, Maria era ainda ingênua, não percebeu que o destino lhe pregaria uma peça. Engravidou muito rápido, antes mesmo de João pensar em casar, ele quando soube que seria pai, quis tirar o corpo fora, mas o seu pai que era homem de honra o obrigou a casar.

Hoje, Maria vive uma vida “Severina” cria os 5 filhos de seu sofrido casamento, amor já não existe, o que vivenciam é apenas sofrimento, pois seu marido é um malandro, só liga para beber. O sustento dos seus filhos ela tem que recolher, por isso é que ela passa o dia todo varrendo, ganha trocados e mais trocados e com isso vai vivendo.

Mas tem dia que é difícil e ninguém a vem chamar para dar uma faxina e a casa de alguém limpar. Quando alguém a chama, leva logo as filhas que é já para elas irem aprendendo.

Ao varrer a calçada da dona do Botequim, ela repara em uma mulher que vem a sua procura, de salto alto 15, em um vestido vermelho apertado, sinalizando os quadris para ambos os lados, é a mulher do prefeito, cheia de joias e exalando um perfume caro, passa quase esbarrando na vassoura e não dar a menor importância para dona Maria, que olha fixamente para a dama. A mulher do prefeito age como se ninguém estivesse ali.

Dona Maria para de varrer e fica prestando atenção, atenta aos movimentos que a dama de vermelho faz: ruído dos sapatos, cheiro no ar, cor vibrante. Aos poucos Dona Maria se permite mudar, usa o escapismo e vai para outro lugar. Ela se imagina que é dona de um grande restaurante, que sua casa é bonita, sua geladeira é sempre cheia e seus filhos são sadios. O seu marido amoroso, levanta cedo e vai trabalhar é dono de uma concessionária e são ricos naquele lugar. Sua casa é feliz, e seus negócios vão muito bem.

De repente a vassoura cai. Dona Maria se assusta e volta a pensar na mulher do prefeito que a olhou com indiferença. Ela reconhece esse olhar a quilômetros de distância, sabe que para os outros é insignificante, pois não sabe ler ou escrever e não tem posses. E assim, continua varrendo, não dá muita importância, pois sabe que quando chegar em casa verá os pequeninos olhos famintos dos seus filhos e isso a enche de esperança. Para eles, ela é a pessoa mais importante do mundo e isso para ela é melhor que toda a riqueza do mundo.

Daniele Pereira
Enviado por Daniele Pereira em 17/03/2022
Código do texto: T7474868
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