Conto das terças-feiras – Professor de primeira viagem
Gilberto Carvalho Pereira – Fortaleza, CE, 15 de março de 2022
Garoto ainda, em vias de receber o grau de Bacharel em Comunicação, Reinaldo fora convidado por um professor a ministrar aulas para alunos do primeiro semestre de uma Universidade, da qual o experiente mestre era diretor. O convite partiu depois que aquele senhor de excepcional conhecimento, acabara de participar da apresentação do Trabalho de Término de Curso (TCC), do jovem formando. Uma verdadeira aula! manifestou-se o sábio homem.
Inexperto, o jovem candidato a professor, embora inteligente e conhecedor da disciplina que iria ministrar, aproximou-se cautelosamente da sala de aula, abriu a porta e, por delicadeza, falou, quase sussurrando:
— Boa noite!
Ninguém respondeu, tentou mais uma vez, agora com a voz mais impostada:
— Boa noite, alunos!
Alguém lá no fundo gritou:
— Sai fora seu palhaço! Aqui não é sala de analfabetos, já sabemos as regras da faculdade.
Uma gargalhada ecoou pela sala. Alguns, os mais novos, jogaram bolas de papel em direção à pessoa que acabara de cumprimentá-los delicadamente. Ele olhou para a turma, percebendo que a maioria era composta de senhores de idade bem acima da dele, por certo estavam ali para completar mais uma graduação e, deveras, bastante críticos.
O jovem, sem saber o que fazer, procurou a porta de saída. Já fora da sala de aula, encostou-se na parede, respirou fundo, e pôs-se a pensar em voz alta, atitude que ajuda a mente a visualizar os pensamentos e a pensar sobre eles de maneira muito mais clara. Olhou para a caderneta de chamada e falou alto consigo mesmo:
— Eu sou um professor graduado, tenho consciência disso. Conheço muito bem a disciplina, vou ministrar. Eles não vão me intimidar!
Abriu novamente a porta, desta vez sem demonstrar ansiedade irracional, apreensão em relação ao que acabara de presenciar quando entrara pela primeira vez. Abriu a caderneta de chamada que estava em sua mão, e iniciou a chamada:
— Francisco José Cardoso, encontra-se presente?
— Presente!
— Arnaldo Junqueira Feitosa?
— Presente!
— Carla Maria de Almeida?
— Presente!
A classe quedou-se, os alunos e alunas tentavam se acomodar em suas cadeiras, sem fazer barulho, parecia uma sala de adolescente, depois de terem recebido uma bronca do professor. Alguns minutos adiante, a chamada foi completada, todos exclamando presente quando seus nomes eram anunciados. O professor fechou a caderneta e deu início à sua apresentação:
— Caros alunos, sou o professor Ronaldo Freitas, da disciplina Métodos Quantitativos, teremos três aulas por semana. Espero que da próxima vez, seja recebido com mais respeito. Serei sempre respeitoso com vocês, portanto, nossa convivência será uma troca de sentido duplo.
Lá do fundo da sala alguém pediu para falar, Ronaldo deu a palavra para o seu interlocutor, um jovem dos seus vinte anos que pediu desculpas por tê-lo chamado de palhaço, justificando-se:
— Professor, antes de sua entrada ingressou um gaiato, e, fazendo-se passar por professor do curso, começou a ditar regras para nós, calouros. Todos nós, atentos e respeitosamente, ouvimos esse energúmeno, que ao final passou a dizer impropérios para a classe toda, tentando, com deboche, nos envergonhar, nos ridicularizar. Descobrimos tratar-se de um aluno do quarto ano, que estava passando trote, coisa antiga. Quando o senhor apareceu, todos da classe, já aborrecida por ter sido enganada por mais de vinte minutos, pensava que seria outra palhaçada armada pelos veteranos.
O professor aceitou as desculpas, a aula acabou e todos foram dar as boas-vindas ao novo integrante do corpo docente da Universidade.