GUERRA E PAZ

Certa feita, presenciei um episódio, onde uma mãe passeando com seu filho, em um sítio onde havia vários bichos, como bois, jabotis, carneiros, cavalos, patos, gansos e outras tantos animais domesticáveis.

O local era ideal pra diversão de qualquer criança, porém algo não dava certo, pois o menino aos prantos e indócil, jogava-se ao chão e por nada lhe convencia em entrar naquele recinto campestre.

Como entender tamanha intransigência, como contornar tal conflito? Tácito, pensei a solução. -Se o pai desse menino aqui estivesse, arrastaria o garoto na marra pra dentro daquele ambiente, pois a partir dali o imaturo, ao se dar conta de tanta variedade de coisas interessantes, dos lagos, campos extensos, certamente seria convencido que ali seria o local de tanto entretenimento, que a birra logo cessaria.

Outra solução que me batia à mente, seria deixá-lo dentro do carro, junto com a sua mãe, até que o choro lhe cansasse, e depois disso poderia lhe ser oferecido a outra opção, pois o escândalo do guri de dois anos de idade, chamava atenção dos visitantes, contrastando com comportamento de outras crianças que ali se divertiam na presença dos seus.

Eu conhecia bem de perto a mãe daquele menino, não tinha dúvidas do amor que eles se nutriam, todavia o comportamento daquela genitora me surpreendeu ao estabelecer um dialogo de entendimento por quase uma hora, mostrando ao seu rebento a compreensão necessária, a empatia estabelecida entre ambos ao se compreenderem e se aceitarem, e dali em diante passaram o resto do dia em plena harmonia e desfrute do local tão agradável.

A revolta do molequinho se deu porque quando estávamos à procura daquela fazendinha, onde havíamos feito uma reserva com antecedência, por engano, ingressamos em outro recinto muito parecido, e o garoto entusiasmado com os brinquedos, tratou de correr para ali usufruir de todo aquele ambiente colorido. Logo em seguida, ao percebermos que tínhamos entrado no local errado, fomos buscar o endereço correto, que era logo ao lado. Mas depois de constatarmos o equívoco, como explicar e retirar daquela criança aquilo que lhe dava imenso prazer? Sua revolta, seu esperneio, era justificável?

O comportamento do infantil, agora depois de esclarecido, para o leitor que chegou até aqui, pode ser percebido e discutível até certo ponto, de acordo com a forma que cada um lhe possa ser perceptível a interpretação psicológica da vida.

Já a forma diplomática que a mãe teve em saber contornar os gritos e a rebeldia, sem em momento algum, demonstrar irritação, pelo contrário, soube entender a dificuldade do seu querido, mostrando-lhe as possíveis possibilidades que dali poderiam transcorrer até o final do dia, fez-me ver o quanto ainda somos tão imperialistas na busca de se apontar soluções dos outros.

Como reagimos diante das inúmeras equações que nos são apresentadas pelo transcorrer da vida, denota efetivamente como estamos. Toda as vezes que nos excedemos, ali damos mostras de como somos.

Encantado com as pairagens, ingressei naquele ambiente verde, de muitas árvores, muito vento, de uma atmosfera bastante saudável. Por lá, mata a dentro, deparei-me, com um local onde havia também dois animais que permaneciam isolados, onde não era permitida a aproximação. Um era um cavalo que não era adestrado, e por ser mostrar indomável, às crianças seria um eminente perigo. Mais adiante havia também um cão bravio, da raça pitbull, preso a uma forte corrente.

Ao ingressar naquele espaço mais denso, rapidamente também se aproximou de mim o chefe daquele novo cenário, que não se furtou o direito de expor o porquê daquelas estâncias.

De imediato, o recepcionista não tardou em explicar que ambos animais tinham seus adestradores. O responsável e cuidador do cavalo, todos os dias como meio de domesticar o quase silvestre, tratava de passear com o equino pelas manhãs, logo ao despertar do sol, sem montá-lo, sem pressa de se mostrar seu senhor.

Já o treinador canino, empregava uma tática diferente, logo ao amanhecer, antes da primeira refeição, o cão recebia advertências de chicotes, dentro do pequeno espaço de jaula que permanecia a maior parte do tempo, com fim de lhe impor respeito e temor. O cachorro era obediente tão somente àquele que lhe alimentava.

Curioso, indaguei ao prestimoso senhor por que tratamentos diferentes aos animais?

O anfitrião, desembaraçado, laconicamente respondeu. Todos somos diferentes, porém somente damos o que temos, e só recebemos aquilo que nos propomos a dar.

Ainda com o propósito de justificar a sua administração, disse-me que à cada animal é dado aquilo que compete o seu fim, e pelo que demonstra a sua natureza. Ao cavalo que teria a função de transportar crianças em suas costas, e ainda por ter uma natureza mais dócil, caberia um tratamento adequado e um treinador da mesma quietude.

Já ao cão que desde cedo, demonstrava uma genética agressiva, teria o papel de mais tarde ser o vigilante daqueles portais, ameaçando todo e qualquer incauto que se atrevesse a ingressar naquelas terras após o expediente.

Aquele homem era de poucas falas, porém como entender a sua administração de acordo com os conceitos que lhe era próprio? Afinal ao cavalo e ao cão, estariam estabelecidas as suas sinas pelos sinais de seus DNAs?

A partir do modelo de doma escolhido pelo seu senhor, o animal estaria fadado a responder pelo que lhe fora proposto. Ao cavalo, poderíamos certamente ter a expectativa de um animal manso, porém ao Cão que só deveria obediência àquele que lhe mantém vivo, como o que se pode esperar daquele que não conheceu um instante de luz.

O cão quando solto, fora de sua jaula, distante daquele cubículo, era uma ameaça inconteste. Caso algum ser distraído se aproximasse do seu catre, nada restaria ao ousado.

No caso de qualquer incidente, a quem caberia a responsabilidade da atitude daquele irracional?

No episódio daquela mãe, enquanto ela teve a paciência necessária para domar a inquietude do seu rebento, eu como expectador estabelecia os meus chicotes que aprendi a responder pela vida. O pitbull nosso de cada dia, ainda rosna cotidianamente dentro de mim, quando imponho ao outro o meu ataque com as minhas certezas tão incertas.

O que esperar daqueles que clamam por paz, apresentando os seus canhões?

Quando teremos a sabedoria de exigir de nós mesmos a paciência para domar as nossas inquietudes?

Quanto tempo se leva para domar um animal? Um cachorro 4 meses, um cavalo 90 dias, após a doma do cavalo coloca-se um cabresto.

Qual o cabresto que nos guia? Do medo ou do entendimento?

As guerras nascem através dos mais pequenos nadas, onde poderosos, intitulados senhores de suas terras, tentam através da demonstração de força se impor diante daqueles que se subjugaram.

A paz mundial ela é possível, mas sua bandeirada de partida só se dará quando pelo menos uma das partes tentarem ceder as injurias do outro que ainda se mostra tão infantil, tão rude e tão selvagem.

Um dia, tivemos o anúncio da boa nova trazido por um Homem de bem que era o mais sábio porque sabia ouvir, era o mais poderoso de todos, porque se mostrava servil. Quando vieram lhe prender, um dos seus, ao demonstrar a fera que trazia dentro de si, decepa a orelha do soldado distraído. Ele simplesmente diz, embainha tua espada, e repõe o malfeito.

Um outro homem de bem, sozinho conseguiu libertar seu povo da escravidão opressora, através do seu exemplo de não reação a violência.

Ainda um outro libertou o povo Hebreu do Egito, sem erguer uma única espada.

As guerras nascem dos pequenos nadas, porém toda ação profilática se dá através do autoconhecimento e também da sapiência em lidar com outro.

PEDRO FERREIRA SANTOS ( PETRUS)

07/03/21