Bi Volt

05.02.22

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O verão deste ano está sendo tórrido em todo o nosso País. Acho que nunca passei igual a esse aqui em Florianópolis, com temperaturas altíssimas, provocando sensação de abafamento e angustia insuportáveis. Um inferno literalmente.

Saímos do nosso chalé na praia do Santinho, com a sua vista maravilhosa das dunas e do mar azul, para a casa da minha mulher na capital catarinense. Térrea, em bairro totalmente residencial e plano, perto do centro da cidade e de avenida que está se transformando em uma espécie de via gastronômica, como a Vila Madalena em São Paulo. Enfim, voltamos à civilização.

No chalé, vivíamos como que acampados, com nossas coisas entulhadas, sem espaço e conforto principalmente. Também, a escada de acesso ao nosso quarto no mezanino, íngreme como a de um navio, ficando difícil de enfrentá-la. O corpo padecendo, irreversivelmente.

Outro problema: a distância ao centro da capital de cerca de quarenta quilômetros de estrada. Todos os dias há o "rush" de saída das pessoas pela manhã para o trabalho no centro e volta no início da noite com grandes engarrafamentos, parecendo as marginais de São Paulo em dias de chuva. Se tivermos algum problema emergencial de saúde ou qualquer outra necessidade imediata, conforme o horário demorará cerca de uma hora, ou até uma hora e meia para chegar. Inviável essa situação.

Também, é a alta temporada nesta época do ano na ilha, com afluxo de turistas de todos os cantos do país e do exterior, os portenhos principalmente, que lotam a cidade causando grandes filas nas entradas e saídas das praias. É um caos o ir e vir para o Santinho e demais praias . Um inferno de todos os modos e tipos, a escolher. Que Dante não nos ouça!

Mudamos no início do ano, e do verão, e uma situação que não contávamos nos surpreendeu: o calor no imóvel - é uma estufa literalmente. Na praia, estávamos instalados no alto da duna, com brisa frequente minimizando essa sensação. E está há cerca de trinta quilômetros do continente e mar adentro, fazendo com que o clima mude constantemente em função dos ventos. Lá é bem mais fresco.

As primeiras noites na nova morada pareciam que dormíamos em um forno. O ar, o chão, as paredes emanavam um calor sufocante, fazendo-nos transpirar às bicas, obrigando-nos a tomar duchas frias ao longo do dia e da noite. E muitos copos de água gelada bebíamos também. Chuva, fazia quase quinze dias que não caía uma gota para nos refrescar. Cruel estava sendo o inicio da nossa vida ali. Infernal, melhor dizendo.

-Acho que vamos voltar para o Santinho, hein? – comentei deitado com a minha mulher na cama debaixo do fluxo de ar morno do ventilador.

-Até o ar do ventilador está quente. E eu com os calorões da menopausa então, pior!

Então, fui visitar os meus filhos e irmã em São Paulo e fiquei hospedado na casa do meu mais velho, que me deu o seu aparelho portátil de ar condicionado sem uso. Mas fui de moto e não tinha como levá-lo na volta. Resolvi despachá-lo. Encontrei um site que oferece várias empresas de transporte, e escolhida uma, fiz o pacote e o enviei, feliz por ter logo resolvido o inferno da nossa casa. Chegaria ao final da semana. Avisei a minha mulher, e entusiasmada como eu, aguardou ansiosa a chegada da solução da casa-caldeira. Voltei animado para por o aparelho em funcionamento.

Detalhe: o meu filho me disse que era Bi Volt!

Cheguei e vi o pacote no canto da sala da casa:

-Vamos por ele para funcionar agora! – disse sob as palminhas de felicidade dela.

Desfiz o pacote e posicionei o aparelho perto de uma janela para a troca de ar. Liguei. Ele deu um bip, acendeu suas luzes indicativas e começou a funcionar: 16 era a temperatura no visor.

-Que beleza querida, acabou o nosso calor! – sentando feliz ao seu lado no sofá, admirando a refrigeração do ar envolvendo-nos refrescantemente.

-Que delícia! – disse faceira.

Minutos depois parou!

-Caramba, o que aconteceu? – levantei e fui até ele apagado.

-Será que queimou? – perguntou-me.

Desliguei, religuei e nada. Fui até a geladeira que trouxe de São Paulo e usa um transformador, aqui é 220v, e o instalei no aparelho como ultima tentativa. Nada!

-Acho que queimou? Mas meu filho disse que era Bi Volt? Vou ver as especificações .

Abaixei-me e vi a etiqueta : 110 volts!

Fiquei fulo da vida, pois deveria antes de ligar, visto a sua voltagem e estaria funcionando. Confiei no meu filho.

-Não acredito! Não é Bi Volt! E se eu disser que queimou o aparelho por acreditar nele, vai dizer: Você devia antes de ligar visto as especificações, né Pai! - resmunguei alto para ela, que atônita, me olhava tentando entender o que acontecia.

-Voltamos então para a nossa caldeira querido? - questionou frustrada.

Consegui a muito custo encontrar uma pessoa para avaliar se tem conserto o aparelho, ou não, e se compensará fazê-lo.

Escrevendo agora este texto, desencadeou um temporal de verão com os seus altos trovões e grossos pingos de água . Corremos os dois para um banho de chuva delicioso na área externa da casa, igual aos da nossa época de criança. Foi refrescante. Mas, passada a chuva, o calor tórrido continuou com um lindo entardecer luminoso, típico do verão.

Seguimos sob a ventania quente dos ventiladores que rugem freneticamente dia e noite, esperando o conserto do aparelho.

Bi Volt! Francamente Fernandinho, devia ter visto antes as especificações, não é mesmo?

Fernando Ceravolo
Enviado por Fernando Ceravolo em 05/02/2022
Reeditado em 06/02/2022
Código do texto: T7445611
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