UM POUQUINHO DE SEU RUFINO
UM POUQUINHO DE SEU RUFINO
Seu Rufino andava a pé, cavalgava em sua égua castanha, chamada Rosana.
Ganhava carona de jeep ou de caminhonete Williams, mas para ir na carroceria.
Nas cabines desses veículos iam as mulheres.
Um senhor negro, espigado, de cabeça comprida, magro, de sorrisos largos, olhar esperto e desarmado.
Voz mansa e meia irônica, de fácil acesso, amigo de todos os vizinhos, contador de causos...
Sempre com calças cinzas ou azuis, camisas brancas de mangas compridas, dinheiro pouco, mas sempre nos bolsos.
Pai de uma família grande, do segundo casamento, apenas uma filha.
Seu Rufino gostava de uma cajibrina, um vinho de venda de roça, ou um conhaque presidente, um martine, um cinzano, assim por diante, ou o que tivesse, até café frio com gordura.
Só havia um problema, não sabia a hora de parar de ingerir essas bebidas.
Não sabia e não queria aprender.
À medida em que a a bebida ia fazendo efeito, seu Rufino ia ficando alegre, feliz, ria para todo mundo, falava tudo pela metade, contava causos pornográficos meio sem nexos e chamava todos os amigos de companheiros.
Ele chegava a ficar de joelhos à beira do balcão de madeira da venda do seu Orlando, de tanto que bebia.
Nunca deixava nada fiado, mas como chegava a não ter condições de conferir o dinheiro para fazer o pagamento do que tinha sido gasto, ele soltava as cédulas de dinheiro em cima do balcão e pedia ao vendeiro para ver o que ele estava devendo, entregar uns pães, doces para as meninas que tinham ficado em casa e devolver o restante.
Seu Orlando colocava dois pedaços de doces que ficavam numa vitrine de madeira. Eram pés de moleque, suspiros rosas e brancos, geleia, doces de leite, marias moles e doces de abóbora e batata doces. Fazia um pacote com papel de pão, amarrava-os com barbante e cobrava todo o valor.
Seu Rufino colocava os presentinhos no embornal que era amarrado por alguém de seus amigos, na cabeça prateada do arreio.
Depois de tudo pago, pedia a alguns dos amigos que estavam mais próximos para colocá-lo sobre o arreio da égua rosana e como ela conhecia bem o trajeto de três quilômetros da venda de seu Orlando até à sua casa, fazendo sol, frio, chuva, vento, noite escura ou enluarada, passo por passo, Rosana ia parar lá na querência, levando os doces e seu Rufino em seu dorso.
Em casa, só alegria, a meninada fazia a festa. E seu Rufino, esse já estava em sono profundo.
Negro montanhês, pai de família grande, tudo se passou, apenas lembranças ficaram.
É isso aí!
Acácio Nunes