PEGASUS

(Cléa Magnani)

Juarez morava com sua mãe num pequeno apartamento alugado num bairro do Rio de Janeiro. Filho único, decidiu que não se casaria enquanto sua mãe vivesse. Ela era uma pessoa muito bondosa, mas ele sabia que nora e sogra na mesma casa pode não dar certo. Na Segunda feira ao sair para o trabalho, sua mãe se preparava para entrar no banho. Despediu-se dela e saiu. Ao chegar no escritório onde era o responsável pela contabilidade, recebeu uma ligação do PS do Convênio avisando que sua mãe havia dado entrada pelo resgate. Tinha caído no banheiro. Correu ao hospital, sua mãe passaria por uma cirurgia, e necessitava de uma prótese no quadril que o convênio não cobria, ficaria internada aguardando para ser operada quando ele trouxesse a prótese. E a pobre senhora mesmo medicada e no hospital, sentia muita dor. Juarez passou a semana pesquisando preços, mas havia comprado um carro e pagava as prestações, tinha o aluguel, o convênio de sua mãe, e depois da cirurgia teria os medicamentos, e provavelmente uma cuidadora para ela. Sua cabeça fervia. Estava num círculo, e não tinha como sai dele, e muito menos como comprar a prótese. Naquela noite ele não conseguiu dormir. Rolou, arrumou o travesseiro, puxou a manta e logo a atirou ao chão. Olhou no rádio relógio centenas de vezes e tinha a impressão de que o tempo havia parado. Por fim, não aguentou mais. Se levantou e entrou no chuveiro frio, embora ainda fosse quatro e meia da manhã de domingo. Voltou para o quarto, vestiu-se como se fosse sair imediatamente mas resolveu sentar-se na sala e ligar a TV para se acalmar. Os primeiros noticiários da manhã anunciavam o Grande Prêmio Brasil no Hipódromo da Gávea naquele domingo. Imperdível! Seriam 41 páreos e Homero, treinador do Jockey Club Brasileiro, grande conhecedor de favoritos e azarões, havia dito que o favorito para o páreo do GP, sem a menor dúvida era Pegasus, puro sangue de uma matriz argentina que tinha porte, temperamento e capacidade de sobra para levar o 1º prêmio, que estava por volta de R$500.000,00 graças às polpudas apostas. Ao ouvir a confirmação da corrida no noticiário, Juarez ergueu-se e começou a andar sem rumo por dentro do apartamento. No quarto, abriu uma bolsa onde estavam pacotes de cédulas de R$100,00. Despejou todo o conteúdo sobre a cama e o conferiu mais uma vez. Ali estava o pagamento que ele deveria fazer na segunda-feira, aos funcionários da Empresa onde trabalhava. Um total de R$150.000,00. Calçou os sapatos, pegou a bolsa e se dirigiu ao Hipódromo da Gávea.

(Alberto Vasconcelos)

No sofisticado ambiente do jóquei clube, Juarez era um total desconhecido, e os demais frequentadores sequer se dignaram a olhar aquele ser estranho postado diante das tabelas de apostas. Alguma dúvida meu jovem? Perguntou-lhe um homem minúsculo vestido com uma surrada jaqueta de jóquei e boné característico dos condutores de cavalos. Se você me der 10% do prêmio eu posso lhe garantir quem será o grande vencedor. Juarez, por estar se sentindo como um peixe fora d’água, fingiu dar atenção ao interlocutor. Pois bem, vou lhe contar o segredo. Pegasus não vai ganhar. Tem muita gente graúda envolvida na negociata. O vencedor será Pélago. E apontou para a fotografia do animal que estava no canto inferior da tabela. Um belíssimo puro sangue inglês de pelagem preta azulada que justificava o nome que lhe deram. Havia sinceridade na voz quase sussurrada daquele homem que, ente outras coisas, falou que fora jóquei de páreos memoráveis por mais de trinta anos, mas que com a velhice vieram também o esquecimento e a pobreza por ter esbanjado, em farras homéricas, toda fortuna que fora recebida. Seguindo as orientações do desconhecido, Juarez fez apostas modestas nos páreos intermediários, e dividiu os prêmios conforme o combinado. Os cavalos entraram para a volta de apresentação do último páreo. Pegasus, fogoso, com o pelo brilhante ao sol poente, liderava o desfile. Pélago, entretanto, permaneceu no grupo intermediário, sem chamar a atenção dos frequentadores que vibravam com a desenvoltura do cavalo campeão das apostas. O dinheiro da empresa que Juarez havia usado para as primeiras apostas, já estava completo, mas o que ganhara e que daria para comprar a prótese que a sua mãe necessitava, ele havia apostado em Pélago, conforme a indicação do antigo jóquei. Ao final dos dois mil e quatrocentos metros ou o seu dinheiro estaria multiplicado por 500 ou o sonho de custear todo o tratamento da sua mãe teria sido jogado fora. Pegasus manteve-se na dianteira até a reta final, mas contrário a todas as probabilidades, Pélago assumiu a dianteira nos cem metros finais, apear das intensas chicotadas que o jóquei que dirigia Pegasus aplicou no adversário que iria tomar-lhe a vitória. Pélago venceu por uma cabeça. Juarez cumpriu o prometido e com a fortuna na sacola, tomou um táxi para voltar para casa. Mas um tiroteio entre traficantes e policiais estava impedindo o deslocamento. Uma bala perdida acertou o pescoço do motorista e o ombro de Juarez. O que fazer diante daquela situação desesperadora?

(Aristeu Fatal)

Juarez nem fazia ideia de que atrás do seu táxi vinha um automóvel com três pessoas que estavam no jóquei, e viram quando ele subiu no carro. Tinham até visto quando aquele estranho fazia suas apostas, vibrando sempre que acertava nos cavalos vencedores. Admiraram quando Juarez abençoado pela sorte conseguiu amealhar a fortuna que ele ganhara, com a vitória do Pélago. Quando viram o tiroteio à sua frente, logo desceram do veículo e foram até o táxi. De cara notaram que o taxista estava morto, e que Juarez se contorcia em dores, com muito sangue saindo de seu ombro. Todavia, o ferido estava consciente, conversando normalmente. Conseguiram retirá-lo com alguma dificuldade, e o colocaram em seu veículo. Naquele momento a polícia e os guardas de trânsito conseguiram liberar as pistas e Juarez foi levado para o Miguel Couto, onde ele foi atendido. Os três cavalheiros eram pessoas distintas, empresários, viram que Juarez, homem simples, carregava aquela sacola cheia de dinheiro, ouviram a sua história e tomaram todas as medidas para assegurar que a fortuna estaria em segurança. Quando ele contou sobre a necessidade de no dia seguinte fazer o pagamento aos funcionários da empresa onde era o contador, um dos empresários perguntou-lhe qual era a empresa. Ao citar o nome, outro deles logo exclamou, dizendo conhecer a mesma, sendo até amigo do proprietário e concorrente. Se propôs a, no dia seguinte, levar o dinheiro do pagamento. O terceiro se prontificou a comprar o aparelho que a mãe de Juarez precisava, entregando no hospital onde ela estava internada, que por sinal era o mesmo onde ele se encontrava. Juarez foi operado para retirada da bala, e após dois dias de hospital foi para casa. A mãe foi operada nesse dia, colocando a prótese adequada, mas, necessitava ficar mais umas semanas, pois havia necessidade de ser verificada a adaptação da mesma, inclusive para se notar algum tipo rejeição. Todavia, ainda teria ela de fazer repouso em casa, até a consolidação e solução do problema. Juarez, depois de tudo resolvido, depois de alguns meses passados, combinou com os três empresários, num domingo, para se encontraram no Jóquei Clube do Brasil, onde almoçaram, para depois irem fazer suas apostas. Nesse momento, Juarez confessou aos três que havia feito uma promessa de jamais voltar a se envolver em qualquer que fosse o tipo de jogo, promessa feita numa ida à Aparecida do Norte, durante a santa missa!