Sexta feira, Dia de Maldade!
15.12.21
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Tenho o costume de ir nadar logo cedo pela manhã em praia próxima a nossa. É mais tranquila, de poucas ondas, e em certas ocasiões, uma piscina. Pego o meu “brinquedinho” – como chama a minha mulher a moto que troquei há pouco tempo - uma beleza alemã, e vou até lá em poucos minutos. Saio preparado: de sunga, camisa de lycra com mangas longas para proteger do sol e tênis, geralmente o mais velho e surrado que tenho. Ou o pior deles, quase o de um maltrapilho.
Foi assim naquele dia quente de inicio de verão. Cheguei à viela, ou beco, que desemboca na praia e onde estaciono a motocicleta bem junto ao muro de uma casa. Travei o guidão, tirei o tênis e o coloquei sobre o pneu traseiro, escondido pela carenagem. É difícil de vê-lo. Só se você parar junto a ela e observar com cuidado e atenção consegue divisá-lo. Sempre fiz assim, desde a época da outra “magrela” trocada nesta. Desci caminhando tranquilo para a praia e fui nadar despreocupado.
Nadei e me exercitei, fiz alongamentos e ginastica para a coluna e lombar por meia hora. O dia estava lindo, com o céu azul e o sol não tão quente, uma delicia. Demorei-me um pouco mais que o usual. Voltei então à moto.
Ao chegar, o meu espanto:
- Cadê o meu tênis? – questionei achando que o colocara em outro lugar. Ledo engano. Tinham roubado o velho companheiro de praia.
- Caramba, conseguiram roubar o meu tênis velho, que coisa? Molecagem na certa – pensei inconformado pelo fato.
Sem alternativa, e atônito, destravei a moto e me preparei para voltar para casa, descalço. Não gosto de pilotar assim, mesmo em trecho curto, posso cair e arrebentar os pés, os primeiros a machucar.
Veio caminhando da praia um senhor e lhe disse ao passar por mim:
-Acredita que me roubaram um tênis velho e desbotado!
-Foi agora?
-Não sei, fui nadar e voltei e vi que roubaram.
-Ainda bem que não levaram a moto!
-Pois é...
Montei no brinquedinho e fui sem eles. Não eram ainda sete e meia da manhã e estava faminto, pois fora sem tomar o desjejum. Minha mulher ficou de fazê-lo.
Em casa, digo a ela junto ao fogão passando o café, exalando aquele aroma delicioso:
- Acredita que roubaram aquele meu tênis velho e desbotado que só uso para ir à praia?
-É mesmo?
-Coisa de moleque!
-Você agora com esse seu brinquedinho novo, vistoso, chama muita a atenção. E tem outro detalhe.
-Qual?
-Hoje é sexta feita não é?
-É.
-Então é o dia de maldade, como aquele vídeo do bandido dizendo o que ele faz neste dia, como roubar bolsa de mulher no ponto de ônibus indo trabalhar e outras barbaridades.
-Será?
- Acho que sim! Com a outra, que não chamava tanta atenção, isso não acontecia. Agora, com a poderosa, fizeram essa maldade contigo – fala ela rindo.
Sua observação tinha lá a sua logica e coerência, mas roubarem um tênis velho, surrado e desbotado, grande, pois calço 43, tamanho não usual, quem iria usá-lo? E sem qualquer valor monetário significativo. Molecagem mesmo, ou maldade como ela disse.
Agora, depois deste inesquecível “dia de maldade”, não paro mais no beco. Deixo a moto em estacionamento de mercadinho na mesma rua, um pouco mais longe da praia e passo a corrente pela roda dianteira junto com o capacete. Vou com outro tênis mais velho ainda, furado nos lados. Desço para a praia com ele, não o largo mais como antes a mercê das maldades dos moleques, pois cachorro mordido por cobra tem medo de salsicha, não é mesmo?