Insatisfação e Infidelidade
Acordei e o dia estava clareando. De tanto acordar neste horário nem precisava mais do despertador. Eu sempre acordava antes dele tocar. Olhei para o lado e minha esposa ainda dormia. Estava sempre cansada.
Levantei, me preparei para ir ao trabalho. Fiz café e preparei a mesa para o desjejum.
Acordei as crianças para se prepararem para ir à escola. Depois acordei minha esposa, que é professora no mesmo colégio que nossos filhos estudam.
Era a mesma rotina todos os dias. A mesma rotina enfadonha.
Na mesma hora de todos os dias nós saímos. Eu deixei minha esposa e filhos na escola e fui para o escritório.
Neste dia eu estava um tanto enfastiado daquela rotina.
Na minha juventude eu sonhei tantas coisas pra minha vida. Eu sonhava alto.
Um dia disse pra um amigo que aos quarenta anos eu seria um milionário.
Aos vinte e dois anos eu me casei por causa de uma gravidez não planejada, fruto da irresponsabilidade minha e dela.
Hoje estou com trinta e seis anos e o que tenho? Um carro, um apartamento pequeno e financiado e um emprego de gerente de contabilidade que mal dá para a sobrevivência de minha família e ainda por cima, volta e meia, tenho que engolir sapos.
Cheguei ao escritório e tudo sempre igual. Estava desanimado e aéreo pensando em minha vida. Definitivamente não era aquela vida que sonhei pra mim.
A manhã estava pesada. Só problemas. Chegou o horário de almoço. Saí apressado, estava atrasado para pegar minha turma no colégio. Fomos para casa. Terminamos o almoço que começamos na noite anterior. Almocei apressado e voltei para o trabalho.
No caminho pensava: Que vida é esta? A vida está passando e eu não estou vivendo.
Cheguei ao escritório e mais problemas.
Finalmente o dia chegou ao fim.
Eu estava casado há quatorze anos. Minha relação com minha esposa esfriou faz tempo. Ela não era nem a sombra da mulher com que eu me casei. Não tinha mais vaidade, nem olhava pra mim, sempre tinha várias atividades ou me aborrecia queixando-se de falta de dinheiro. Eu me ressentia de atenção e carinho. Por vezes pensava que eu também não fazia minha parte e me perguntava se eu também não era responsável pelo nosso fracasso, já que minha insatisfação diante da vida me deixava sempre de baixo astral. Nossa relação amorosa estava quase mecânica, tipo obrigação do faz, vira pro lado e dorme.
No outro dia a rotina continuava. Cheguei no escritório, estava distraído com alguns papéis. Nem percebi uma mulher chegar. Quando levantei a cabeça eu me assustei:
-Pois não. Sente-se, por favor.
Ela se sentou. Era uma mulher linda e elegante, cabelos impecáveis, um batom vermelho na medida certa e um perfume delicioso. Devia ter uns quarenta e poucos anos.
-Você é o Pedro Paulo?
-Sim.
-É um prazer conhecê-lo. Sou Adriana. Estou pensando em contratar alguns serviços deste escritório para a minha empresa.
Eu não conseguia tirar os olhos dela. Mal ouvia o que ela falava. Ela notou e se exibiu mais, debruçando sobre a mesa e mostrando seu decote generoso que deixava ver muito mais do que devia. Eu me recuperei e disse:
-É um prazer conhecê-la, senhora Adriana.
-Começamos mal. Jamais me chame de senhora.
-Desculpe. É o respeito.
-Este tipo de respeito eu dispenso.
-Claro.
-Você é um homem lindo. Estava lhe observando enquanto falava com o senhor ali.
Eu todo sem jeito disse:
-Obrigado!
Não consegui dizer mais nada.
-Bem, eu vou lhe explicar o que eu preciso.
Começou a falar.
Aquela mulher foi embora mas deixou seu perfume ali e sua imagem em minha retina.
No dia seguinte, a mesma rotina entediante. No meio da tarde meu chefe me chamou e disse que precisava que eu levasse alguns papéis em uma empresa.
-Mas eu não sou boy. Justamente pra isto temos um boy.
-Mas eu quero que você vá.
-Mas eu quero entender o porquê.
-É que a dona da empresa pediu pra você ir. Ela precisa que você explique algumas coisas pra ela. Ela conversou com você ontem.
Eu me lembrei da madame e sorri.
E lá fui eu.
Chegando lá ela me recebeu em sua sala. Eu estava pra lá de constrangido. Ela com seu decotão se insinuava e se mostrava pra mim. E eu não conseguia tirar os olhos daquela exuberância.
-Você me trouxe os papéis?
-Sim. Eu trouxe. A senhora, quer dizer, você quer tirar algumas dúvidas, não é?
-Quero. Mas venha tomar um café comigo.
E fomos tomar o café ali mesmo na sala dela. Nós dois sozinhos e aquele monumento de mulher se mostrando cada vez mais pra mim. Sentou-se e cruzou as lindas pernas. E eu me fingindo de morto, mas devorando-a com os olhos.
Quando eu saí dali eu estava meio tonto.
A noite, em casa, aquela mulher não me saia da cabeça. Ri sozinho e minha mulher perguntou porque. Quando nos deitamos minha mulher se insinuou pra mim e me lembrei da Adriana e a noite pegou fogo. Ela estranhou e disse:
-O que deu em você hoje?
-Não estava bom?
-Sim. Mas ultimamente você anda tão desanimado.
Eu só sorri pra ela, virei pro lado e dormi como um anjo.
Dias depois a Adriana me chamou novamente em sua empresa. E eu pensei que esta história não ia acabar bem.
Cheguei lá e ela me recebeu toda simpática.
-Bom dia, Pedro Paulo!
-Bom dia, Adriana! Meu chefe me disse que você quer esclarecer mais alguns pontos.
-Na verdade eu lhe chamei pra fazer uma proposta.
-Uma proposta?
-Sim. Eu quero que você venha trabalhar comigo.
-Como? Mas…
-Não gostaria de vir trabalhar comigo?
Eu fiquei desconfiado.
-Em que eu trabalharia?
-Como meu assessor.
Com ironia eu perguntei:
-E o que faz seu assessor?
-O que você acha?
-Não faço a mínima idéia.
-Você é um homem lindo e atraente. Meu marido passa a semana toda fora.
-Como?
-Sim, eu fico a semana toda sozinha e carente.
Eu ri. Não conseguia acreditar naquilo.
-Quer um assessor para assuntos sexuais. É isto?
-Não precisa ser tão prático e direto assim.
-Eu sou casado. Tenho mulher e dois filhos. Acho que você escolheu a pessoa errada.
-Claro que não. Podemos passar algumas horas no apartamento que tenho e você pode chegar em casa dentro do seu horário.
-Eu não sou um garoto de programa.
-Eu não disse isto.
-Se vai me pagar pra satisfazer suas necessidades sexuais, está me tratando como um garoto de programa.
-Não, você trabalharia aqui e me acompanharia em minhas reuniões fora da empresa.
-Eu não posso fazer isto com minha esposa.
-Eu pago bem pra você ser meu assessor.
Eu não estava acreditando no que estava ouvindo. Jamais poderia imaginar tal coisa.
Saí dali dizendo que não aceitava a proposta dela.
Nos próximos dias eu não parava de pensar nela e um tesão louco se apossava de mim.
E na próxima investida dela, eu sucumbi. Acabamos no tal apartamento e nos entregamos com paixão e loucura.
Com o tempo eu acabei aceitando aquela proposta. Como resultado disto eu fiquei ainda mais distante de minha esposa. E ela sempre reclamando, sempre chata e eu me lembrando daquela mulher espetacular que me enlouquecia de prazer.
Comecei a chegar em casa cada vez mais tarde e já não me importava se minha esposa soubesse do meu caso com Adriana. O que acabou acontecendo.
Numa noite eu cheguei e ela estava furiosa. Despejou toda sua raiva em cima de mim e me agrediu fisicamente diante de nossos filhos. Eu me defendi de suas unhadas e bofetadas mas tive o equilíbrio de não encostar um dedo nela. Nossos filhos não mereciam assistir este espetáculo grotesco. Por fim ela me expulsou de casa.
Peguei algumas coisas e fui para um hotel.
No dia seguinte, contei para Adriana o que aconteceu, mesmo porque meus braços e mãos estavam machucados. Ela me disse que eu poderia morar no apartamento mas que ela nunca iria se separar do seu marido.
Começamos a viver assim. Trabalhávamos juntos e ela me visitava com freqüência.
Semanas depois minha esposa me procurou pedindo pra conversarmos e tentando uma reconciliação. Mas eu disse a ela que não tinha volta e que queria o divórcio.
Nunca me divorciei pois minha mulher nunca aceitou e eu não estava disposto a enfrentar um processo litigioso.
O marido dela nunca soube do nosso caso ou sabia e como não conseguia satisfazer a mulher maravilhosa, voluptuosa e sensacional que tinha, preferia fechar os olhos aos deslizes dela.
Ela passava os fins de semana com o marido e eu com meus filhos pois eu sempre estive presente na vida deles e fiz de tudo para que eles trilhassem o bom caminho, para que estudassem e fossem bem sucedidos e não cometessem os erros que eu cometi.
Há quinze anos eu vivo esta situação com Adriana.
Sei que todos me julgam e me condenam, mas eu não me importo com os juízes do mundo e com donos da verdade. Ninguém viveu a minha vida, ninguém sonhou meus sonhos, ninguém viveu as frustrações e insatisfações que eu vivi. E acredito que as pessoas podem e devem ser felizes. Eu ousei jogar tudo pro alto e viver intensamente a minha vida, ser feliz. Minha vida não é convencional, mas quem disse é preciso sempre seguir as convenções e normas sociais? Eu não fui feliz vivendo uma vida convencional e certinha. Cada um sabe de si e de suas necessidades.
E eu não me arrependo de nada…