TIA ABIGAIL E UM RELACIONAMENTO ABUSIVO

Sempre gostei de ouvir as histórias que as minhas tias me contavam quando criança. Eram histórias de arrepiar.

Depois, de muitos anos longe destas conversas e as tias indo morar lá do outro lado, junto com Deus, sobrou apenas uma: minha doce tia Abigail.

Tia Abigail sempre foi muito doce, falava baixinho, era cheirosa e sempre usava batom.

Quando ela já havia sido vacinada pela COVID 19 ( duas doses) e eu também, resolvi lhe fazer uma visita. Estava com muita saudade.

Ao entrar na sua pequena sala, estava ela sentadinha no sofá, parecendo uma bonequinha, magrinha, cabelos branquinhos, xale nos ombros e um batonzinho rosa na boca.

Cheguei, cumprimentei e vi que ela não me reconheceu.

Eu disse quem eu era e que estava ali para uma visita.

Tia Abigail parecia não entender e começou a dizer que ela precisava contar rápido, antes que Antenor chegasse.

Antenor era o marido dela, mas que havia morrido há mais de 20 anos.

Eu então pedi a ela que segurasse minha mão e que contasse o que acontecia.

Ela me disse que ainda passava e lavava roupa para fora, porque Antenor lhe cobrava até a água que ela bebia.

Disse que ele, ao chegar do trabalho todos os dias, verificava quantos pães ela havia comido, quantos bifes haviam ainda e contava o número de ovos. Ele dizia que ela estava sendo muito cara para ele.

Ela contava e olhava para a porta, como se fosse surpreendida.

A filha, com quem ela morava, me fazia sinal para deixa-la falar, dando a impressão que ela estava inventando histórias.

Tia Abigail começou a falar mais baixinho, para que só eu escutasse e contou que ele, tio Antenor, ao chegar em casa, ia para a cama e a obrigava a fazer coisas que ela não queria, pois ele não tomava banho e tinha um cheiro muito ruim. Disse que ele era um cachorro, cruel e grosseiro e se ela se negasse a algo ele batia nela.

Disse que Tio Antenor, não a deixava ir à missa e muito menos ficar no portão com as vizinhas, à tardinha, pois era coisa de gente faladeira.

Tia Abigail, falava com muita certeza que me fazia acreditar que era verdade. Comecei a ficar preocupada.

De repente, ela apertou minha mão e disse que a dona Edna iria deixar de dar a roupa para lavar, pois estava pensando em comprar uma máquina de lavar. Disse que estava preocupada com a falta que esse dinheiro iria lhe fazer.

Para acalmar o seu coração, eu disse que não se preocupasse, pois isso ainda iria demorar para acontecer, porém ela me olhou nos olhos e disse que se ficasse sem este trabalho, ela não teria como pagar o vestido do natal e a parte dela na ceia .

Senti pena!

Eu disse a ela que não se preocupasse, pois eu daria as minhas roupas para ela cuidar.

Pensei na crueldade que ela poderia ter passado, nas coisas que ela já viveu e no medo que ela deve ter passado, ao se ver diante um marido grosso e controlador, que usou e abusou da mulher e a tratou como empregada, sem nenhum amor.

Os olhinhos dela se encheu de lágrimas, agradeceu e me chamando de doutora, me perguntou se ela já poderia ir para casa pois comida de hospital era horrível...

Que Deus tenha piedade da minha querida titia e que ela esqueça tudo o que passou com o cruel marido.

 

 

PoderRosa
Enviado por PoderRosa em 23/11/2021
Reeditado em 23/11/2021
Código do texto: T7392315
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