Conto das terças-feiras – Férias atrapalhadas
Gilberto Carvalho Pereira, Fortaleza, CE, 16 de novembro de 2021
Todos os anos, nos meses de julho, janeiro e fevereiro uma multidão de fortalezenses se deslocam para passar férias nas regiões de praia ou nas serras. Junto a cada família vão agregadas duas ou três outras. Às vezes somam mais de 50 pessoas. Dormem em camas, os mais velhos de cada família, os outros em redes e até no chão, em colchões que levam de suas próprias casas. Os proprietários geralmente não ficam sabendo dessa invasão, pois o contrato de aluguel é realizado entre o locatário e um corretor da imobiliária que, sabedor dessa prática nunca se opõe para não perder clientes, isto é, não fiscalizam. As cidades preferidas ficam superlotadas, as praias idem.
Nas férias do ano de 2019, em janeiro a família Barroso alugou uma casa de seis quartos, em uma cidade na região de praias. As chaves da casa foram entregues na própria imobiliária, em Fortaleza. O Sr. Barroso as recebeu, junto com o contrato e as recomendações com as cláusulas de uso e respectivas multas pelo mau uso do imóvel. Com as ditas chaves em mãos, rumou para casa para preparar a viagem. Aproveitou para ligar para os familiares que dividiriam com ele as despesas do aluguel, a relação dos mantimentos a serem levados, a quantidade de colchões necessários e roupas de cama e banheiro. Ficou acertado que sairiam às oito horas do dia seguinte, cada qual de sua residência, seriam três horas de viagem, pretendiam chegar antes do almoço, que já deveria ser levado pronto, cada família com a sua preferência de comida.
A saída foi tranquila e pontual, era um sábado e a estrada, àquela hora, estava com pouco movimento, o que permitiu ao senhor Barbosa desenvolver velocidade constante e dentro do permitido por Lei, 80 km. Depois de uma hora de estrada, caminhões e outros carros começaram a chegar, embananando o trânsito, provocando lentidão. O carro do senhor Barbosa, não conseguia avistar os outros, passando a ficar preocupado, pois não havia repassado o endereço aos demais. Por esquecimento do Barbosinha, como era chamado pelos outros familiares, o celular descarregou por completo, impedindo a comunicação entre eles. Um pouco mais à frente percebeu que entrara em outra rodovia, começou a diminuir a velocidade de seu carro, notando isso 50 km adiante, tendo que fazer o retorno, percorrendo mais 50 km, até chegar à rodovia que os levaria à cidade de destino. Pensou em parar um pouco, para esperar os outros carros. Desistiu, pois imaginou que já teriam seguido em frente.
Logo chegou à cidade escolhida para as suas férias, ligou o celular, obtendo sinal de imediato. Tentou falar com os parentes e não obteve resposta. Encontrou o endereço do imóvel alugado, desceu do carro e usou a chave para abrir porta. Desceu tudo que havia trazido com a ajuda da mulher e dos três filhos. Escolheram o quarto e dentro colocaram seus pertences. Só restava esperar pelos demais para o almoço, o meio-dia se aproximava e eles estavam com fome. Novamente tentou contato via celular e não obteve resposta. A impaciência aumentou, e os demais parentes continuavam mudos, sem dar notícias.
Às cinco horas da tarde recebeu a primeira ligação, uma voz perguntava onde eles estavam. Senhor Barroso respondeu que já havia chegado há mais de cinco horas. Do outro lado da linha veio a pergunta:
— Onde você está, em qual cidade?
— Em Canoa Quebrada, respondeu ele.
— Mas, homem, o combinado não era Jericoacoara?
— Estamos no litoral leste e vocês no oeste, são mais de 450 km de distância.
Foi aí que o senhor Barbosa, todo zeloso, percebera que fizera a troca de cidade, pois a casa de Jericoacoara já fora alugada. O pior, não comunicara aos outros familiares e agora teria que desfazer esse equívoco. Então falou para eles:
— Ficamos assim: consigam um hotel e fiquem até amanhã. Pela manhã venham para cá. Eu pago todas as despesas de vocês aí no hotel. Amanhã conversaremos e acertaremos tudo. Daí para cá são mais de 450 km, vocês devem estar muito cansados. Desculpem-me de verdade, estou acabrunhado.
Como todos eram, além de familiares, muito amigos, concordaram. Afinal o irmão Barroso era o mais aquinhoado da família e poderia arcar com essa despesa extra. No outro dia estavam todos reunidos e felizes, a casa alugada ficava de frente para a praia, uns quinhentos metros de distância, passariam 30 dias de férias naquele lugar paradisíaco