Conto das terças-feiras – Dormindo em um motel
Gilberto Carvalho Pereira, Fortaleza, CE, 9 de novembro de 2021
Costumeiramente viajávamos em nossos períodos de férias, e sempre de carro. Era confortável rodar pelas estradas naquela época. Nada de assaltos, pouco movimento, principalmente de caminhões. Veículos iguais ao nosso, nas estradas eram poucos, o que nos dava tranquilidade de parar em qualquer lugar. No estacionamento de um posto de gasolina, enquanto nosso carro era abastecido na bomba, às vezes manual, outras elétricas, sobrando muito pouco tempo para degustar o almoço trazido, preparado pela sogra. Outras vezes fazíamos piquenique à beira da estrada, sob uma árvore frondosa que nos doava até um pouco de sombra para uma curta sesta.
Todas as viagens eram rigorosamente cronometradas, estávamos sempre sozinhos na estrada, conhecíamos a capacidade do nosso veículo desenvolver sua velocidade e a quilometragem a ser percorrida até a próxima parada. Isso nunca falhou. Como a rota era sempre a mesma, todos os anos – de Itabuna, no Sul da Bahia, para Fortaleza, inicialmente. Depois de nossa mudança para o Pará, passou a ser de Belém para Fortaleza, o que nos levava sempre a traçar um novo mapa com as paradas obrigatórias, já que descobríamos novos postos de gasolina, restaurantes com banheiros e paisagens que ainda não conhecíamos: um rio, para tomar bom e fresco banho, um regalo; durante algumas viagens; apreciar uma cultura agrícola implantada naquele ano etc.
Eram viagens maravilhosas, em companhia da esposa e de nossos filhos que aumentavam em número a cada ano, até a chegada do terceiro. Naquele ano foi diferente, saímos de São Paulo rumo à Itabuna. Chegamos ao Rio de Janeiro e nos dirigimos à cidade de Campos, onde paramos em um posto e abastecemos o carro. Ao tentar sair do posto percebemos algo diferente, o carro não pegava. Perguntamos ao frentista o que ele tinha colocado no tanque, recebendo como resposta:
— Álcool, não foi isso que o senhor pediu?
— Não, pedi gasolina, o carro não funciona com álcool. – Disse-lhe um pouco irritado e já descendo do carro.
— Vamos retirar o que está aí dentro, lavar o tanque e colocar gasolina. Respondeu-me, despreocupadamente, se dirigindo ao depósito para apanhar um balde para acondicionar o álcool a ser retirado do tanque do carro.
A operação teve início, já passavam das 18 horas e ainda tínhamos pelo menos mais quatro horas até a parada para dormir. Então resolvemos percorrer mais alguns quilômetros e encontrar um local para acomodarmo-nos para a soneca daquele dia. O frentista informou que a 40 km havia uma pequena cidade, onde tinha um hotel de beira de estrada. Resolvemos ir para lá. Ao chegarmos não era um local de aspecto muito bom, também percebemos que só havia dois carros estacionados. Fiz a reserva, recebemos a chave de um dos quartos e entramos. Não parecia de todo mal. Um olhar mais atento deu para perceber que havia alguns senões: a porta do banheiro era uma cortina de plástico; o ventilador era muito pequeno, não venceria o calor daquela noite; só havia uma cama de casal e duas de solteiro, nós éramos cinco, o casal e três filhos. Juntamos as duas camas de solteiro e fizemos os três dormirem atravessados.
Para resolver o problema do calor infernal, depois do banho molhamos duas toalhas, abrimos a porta da mini geladeira e estendemos as duas toalhas nesse local. Apontamos o único ventilador disponível para a porta do nosso condicionador de ar improvisado e dormimos sossegadamente. Ao amanhecer percebemos que não havia café da manhã. Eu esquecera de perguntar sobre esse detalhe. Colocamos as malas novamente no carro e, ao atravessar a entrada do hotel (?), percebemos, pela placa quase apagada, que ali era um motel. Eu e a minha esposa rimos, a meninada quis saber o porquê daquela atitude, tivemos que inventar uma resposta, não entenderiam, eram apenas crianças.
O restante da viagem foi tranquilo, chegamos em casa muito cansados, mas satisfeitos de termos chegado inteiros, sem nenhum outro incidente. Nos anos que se seguiram demos continuidade às nossas viagens de férias, mas a cada dia mais cautelosos com o trânsito, os buracos e animais nas pistas, alguns boatos de assaltos, até pararmos por completo. Era preferível gastar um pouco mais, viajar de avião, a ter que passar pelos perigos que as estradas escondem. Também sempre chegaríamos bem mais cedo.