JUVENAL, O GATO
Dia de sol, brisa fresca. Preguiça. Tédio. Bocejos. Juvenal me olhou com cara de enfado quando peguei a coleirinha azul e balancei na frente dele.
— Chega de palhaçada, Juve. Vamos passear, você precisa emagrecer.
O olhar do meu gato fez com que eu me sentisse um humano inferior. Não que isto me chocasse. Na verdade, eu já estava bem acostumado com aquele ar de superioridade do Juvenal. Típico.
Coloquei, meio que à força, a coleira no pescoço do meu gato preto e rebelde, e abri a porta de casa. Seria só um passeiozinho. Não entendi porque o Juvenal mordeu minha canela quando eu o coloquei no chão do jardim.
Juvenal sempre foi temperamental.
Começamos nossa lenta caminhada a lugar nenhum. Não havia ninguém na rua ou algum cachorro que pudesse desafiar o Juve. Quer dizer, se algum cachorro ousasse avançar no meu gato, o resultado seriam arranhões e rosnados. Muito corajoso o Juvenal. Eu, nem tanto.
Eis que lá na esquina dobrou ela. A Grazi. A garota mais bonita da rua. A mina que eu era apaixonado platonicamente desde a minha adolescência. Óbvio que a Grazi nunca olhou para a minha cara. Bem, isso nunca me impediu de flertar com minha musa, ainda que o flerte fosse unilateral. De qualquer forma, o sangue correu mais rápido pelas minhas veias quando me deparei com a Grazi vindo pela rua com aquela microssaia jeans e blusinha de alcinha. O cabelo loiro descia ondulado pelas costas e, puxa... Grazi estava linda.
Ela não me viu. Pousou os olhos no felino e soltou uma exclamação de prazer. Um gato! Se havia algum humano por ali, juro que Grazi sequer reparou. Ela se aproximou, quase saltitante, e se agachou praticamente aos meus pés. Soltou um "boa tarde, coisinha mimosa" ainda sem olhar para mim, encantada com o Juvenal.
Meu gato tinha bom gosto. Puxou ao papai. Quando sentiu as mãos macias dela percorrendo o seu pelo negro, se atirou no chão de barriga pra cima e soltou um miado. Morri de inveja do Juve. Eu queria falar alguma coisa mas, simplesmente, não tinha assunto. Mas o Juvenal tinha, miando para Grazi, aparentemente, encantado.
— Quanta carência! - exclamou ela.
— Ah, estou carente mesmo - concluí, feliz por, enfim, conseguir entabular um papo.
Grazi voltou seus lindos olhos verdes para mim.
— Estou falando do gatinho.
Devo ter ficado vermelho.
— Exatamente. Ele é muito carente.
— Ah... - fez Grazi e voltou seus olhos e sua atenção para o Juvenal.
— Você tem gatos? - perguntei, desesperado para falar alguma coisa útil.
— Aham - a resposta saiu solta. O Juvenal era o centro das atenções. Eu era um mero humano sem graça, quase invisível.
— Qual seu nome? - ela perguntou.
Finalmente.
— Eduardo.
Ela olhou de novo para mim e ficou em pé.
— O nome do gato é Eduardo?
Talvez ainda eu estivesse vermelho do mico anterior.
— Você também pode chamá-lo de Dudu.
— Certo. Belo nome.
Ela olhou para baixo, se agachou e fez mais um carinho na cabecinha feliz do... Eduardo.
— Até outra hora, gatinho lindo - Grazi então me olhou, fez um sinal com a cabeça e foi embora.
Eu fiquei no mesmo lugar pensando se deveria chegar em casa e anunciar para minha família que a partir daquele meu momento meu nome passava a ser Juvenal.
Mas podem me chamar de Ju. Fica mais carinhoso.