A rosa
Esse não é um conto, está mais para um diário em tom de desabafo.
01 de novembro de 2021
Um dia como qualquer outro. O Sol nasceu... Estava mais aflito que o convencional. Um nó na garganta e uma leve falta de ar me mostrava ansioso, mas não sabia ao certo o porquê. Até sabia, mas não sabia que sabia. Fui no floreiro de costume, pedi três rosas: Uma branca, uma amarela e uma vermelha. Ele me disse que não tinha rosas amarelas, apenas uma branca e algumas vermelhas. Tinha uma última rosa cor-de-rosa. Tentou me vender crisântemos, mas por mais belos que sejam, crisântemos nunca terão o significado, a força, a beleza, o mistério e a essência das rosas. Comprei as rosas e saí.
Por mais que só estivesse estado ali uma vez sabia como chegar, e sabia como encontrá-la. Fiquei triste por não ter encontrado a rosa amarela, era sua cor favorita. Faltava uma hora pra completar cinco meses que havia estado naquele lugar. Era a última vez que tinha lhe visto.
Cheguei.
Fiquei de frente pra onde ela estava, e da sacola plástica que havia em minhas mãos tirei a rosa branca. Com todo cuidado, quase em posição de sentido, comecei a abrir a rosa com as pontas dos dedos, mas sem olha-la. Já fiz isso tantas vezes que poderia fazer com as mãos nas costas. “Eu sei que você iria preferir a amarela, mas também sei que iria amar essa.” Falei enquanto continuava abrindo pacientemente aquela bela rosa branca. Então terminei de abrir, tentei sentir o seu cheiro, mas não consegui. Mas também não importava, eu conhecia aquela fragrância de cor. Tomei a rosa na mão direita e olhei bem para aquele lugar. Aquela estrutura alta coberta por lajotas brancas. Caminhei no apertado pra chegar mais perto. Depositei a rosa de forma perpendicular em uma pequena fresta que havia no inicio da pequena edificação. Olhei bem para aquela estrutura e a toquei e acariciei como se tocasse em seu rosto. “A senhora faz tanta falta, vó. Eu jamais vou conseguir expressar o quanto.” Não consegui conter as lagrimas. Estávamos lá, só nós dois e os milharem que também ocupavam as pequenas vielas para toda a eternidade. Deixei estar, me afastei, dei uma última olhada e saí.
Aquilo não tinha nada a ver com a aproximação do dia de finados, era um desejo que eu tinha há muito tempo.
Há seis meses, ao passar pelo floreiro vi algumas rosas vermelhas lindas. Quis comprar duas: Uma pra ela e uma pra sua filha. Elas iriam adorar. “Na volta eu compro.” Pensei. Esqueci. Lembrei no outro dia, e esqueci. A ideia vinha tão rápido quanto ia embora. Aprendi com ela a cultivar rosas, a reproduzi-las. Herdei dela o amor pelas flores.
Um mês depois, já em seu leito, lembro de ficar segurando sua mão até que dormisse. Pensei em comprar a rosa na manhã do dia seguinte quando me permitissem sair do hospital para tomar um banho e comer algo. Não deu tempo. A notícia da transferência me pegou de surpresa e lá fui pra outra viagem. A prometi que a levaria novamente a São Paulo depois que saísse dali. Antes da última troca de plantão eu disse “Vó, eu te amo. Melhore logo. Amanhã estou de volta.” Beijei sua testa. Ela disse “Te amo também, meu negão. Te amo muito.” De uma forma que só ela sabia dizer, mas raramente o fazia. E foi o último beijo.
Hoje, cinco meses depois da sua morte, entreguei sua rosa. Sei que é um ato mais por mim que por ela. Não era vermelha como eu queria, nem a amarela que ela gostava, mas branca. A sua filha, entreguei uma rosa vermelha.
Nunca deixe para a amanhã o que você pode fazer hoje. É clichê, mas é verdadeiro. Amanhã pode ser tarde.
Em um dia como hoje ela partiu. Meu coração se estilhaçou. E jamais voltará a ser o mesmo.
Ame hoje, cuide de quem você ama. As vezes tudo muda em menos de um segundo.