As cinco razões

Aos vinte e oito anos eu finalmente compreendi... Não, com quase vinte e oito; eu nasci entre as oito horas e a meia noite. Com vinte e sete anos eu compreendi o porquê de uma amizade. Falta-me um amigo, penso agora, ausência que não lamento. Lacuna que apenas constato.

O que esse amigo me diria se eu lhe falasse de ti?

Parabéns pelo presente inesperado, L. Ano passado foi uma camiseta, este uma descoberta. Descoberta que veio acompanhada de outra... Aprende-se somente com a experiência direta. Sei disso agora porque a minha conclusão é das mais claras e sabidas e, no entanto, aqui estou, admirado por finalmente reconhecer o valor de uma amizade que nunca cultivei ou procurei cultivar, satisfeito que sempre fui de minha própria companhia.

Chove. Através do vidro fustigado de água e contra um céu nublado penso ver uma grande aranha na estrada, vindo em minha direção. Percebo, meia fração de segundo depois, tratar-se de uma carroça. Uma carroça! Uma aranha! Como se por um instante o mundo possuísse um Francisco José de Goya y Lucientes impressionista. Seria um horror. Livramo-nos disso. Sim, digo-te o nome inteiro. Sabe como sou. Faço isto apenas com quem gosto. Exibir certa cultura, conhecimento, certa malícia; sem nada possuir em mim exceto a vontade de agradar com um desvio inesperado.

Por que preciso de um amigo? Não, eu não preciso. Quero dizer, precisaria de um agora, para este momento. Ele ao meu lado, eu lhe falaria de ti: seguiria seu conselho? Provavelmente, não. Suas palavras deveriam ser ferozes e me fazer sentido, ME fazer sentido mais do que fazer sentido, compreende? Assim como não deve um médico se diagnosticar, realizar uma auto anamnese, porque sua confiança, suas experiências, seus medos e seus sentidos o enganarão, o mesmo vale para mim em relação a ti.

Não posso me consultar sobre mim.

Na minha lista musical uma reunião de canções que vão do rock dos Stones até o pop de Imbruglia e nada me anima. A chuva se mantém, nem forte nem fraca. O céu nublado.

Eu poderia me imaginar como esse amigo, esse alter ego. Teria apenas de me imaginar como alguém que não te ama. Aí está o nó. A questão, minha menina, é que, se um dia eu conseguir isso, não me será mais necessário um conselho ou essa amizade. Não fará mais sentido, não será mais necessária, compreende? Sendo assim, pensei em cinco razões – uma mão cheia, fechada, convicta – cinco razões para não mais pensar em ti. Que razões? Não tas direi. Acredito que elas te feririam, exceto, quem sabe, a razão Praia, que talvez te fizesse rir.