Comboio de corda
Toda vez que leio Fernando Pessoa fico pensando por horas o quão mágico é o processo criativo de uma poesia. Eu não escrevo poesia. Mas o Fernando escrevia. Me lembro que em 2005 ou 2006, fiz um desses trabalhos do ensino fundamental em que cada grupo recebia um poema dele, e deveria montar uma apresentação para explicar aquele poema. Meu grupo recebeu a célebre: autopsicografia. E me recordo com detalhes daquela ótima produção latinoamericana que consistia basicamente em um quarteto: duas meninas ficavam sentadas lendo o poema em voz alta, um menino em pé andando em volta de uma cadeira com as mãos para trás. E eu sentado nessa cadeira, com a cabeça baixa, tentando parecer que estava sentindo dor, enquanto fingia estar escrevendo. Essa foi a primeira vez que eu li algo do Fernando. Eu nunca mais esqueci.
Ali naquela ocasião, enjaulado, no distante 2005, não me ocorreram muitos questionamentos quanto a obra dele. Me ocorreu a admiração. Virou adjetivo. Nos anos que se passaram, quando queria falar que alguém escrevia bem, logo dizia: esse daí escreve como o Fernando.
O tempo foi passando e à medida que fui entendendo um pouco mais de literatura, passei a criar dois grupos: todos os outros gêneros e a poesia. O que afinal de contas é a poesia? Talvez seja essa a pergunta que me faço desde 2005, e que até hoje não encontrei a resposta certa.
Aliás, nunca encontrei em nenhuma frase do Fernando uma definição do que seja a poesia. Mas também não precisa. O Fernando te leva ao sublime, e no verso seguinte te joga ao chão. Ele faz você se afundar nas suas banalidades, e depois explica, como que para uma criança, como é belo o sentir.
Meu chute é que a poesia seja mais ou menos isso: um sentimento, ou vários sentimentos juntos. Todo mundo que lê algo do Fernando, sente. E talvez um dos motivos por ele ter ficado famoso, seja justamente por ter conseguido expressar com extrema cumplicidade e naturalidade, esse sentir, através de palavras.
Hoje, passados mais de dezesseis anos do longínquo 2005, o que me ocorre é o agradecimento. Claro, agradeço ao Fernando, e em como ele moldou vários pensamentos dos que carrego hoje. Mas ele já recebeu e recebe muito agradecimento por aí. Hoje eu quero agradecer a professora Marlene, de língua portuguesa. Ela fez uma diferença a beça na minha vida. Obrigado.