O Recolher da Lua
22.08.2021
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O dia amanhece calmo e quieto. Vou à sacada e vejo uma enorme e magnífica lua cheia despedindo-se da noite. Acompanho embevecido o seu recolher prateado. Pensamentos surgem. São tristes.
Triste, pelos amigos recolhendo-se em sono eterno. Perdas irreparáveis.
Triste, por saber que não há mais tempo a recuperar. Nossa história está escrita irreversivelmente. Agora somente nosso epílogo a ser escrito no tempo que nos resta.
Triste, por ver minha mãe a espera do seu recolher final, nada podendo fazer para que sua realidade mude, a não ser aguardar, incapaz, o seu último sono.
Triste, por ver que o nosso corpo, outrora forte e possante, agora definha, impedindo-nos de fazer coisas, que moços, esperávamos realizar antes de nos recolhermos definitivamente.
Triste, por perceber que a nossa mente falha, impedindo-nos de relembrar momentos e fatos de nossa rica história.
Triste, por não ter tirado fotos desses fatos, pois a memória não os recupera mais.
Triste e arrependido, por não ter tido mais tempo com os filhos.
Triste e com remorso, por não ter convivido mais com meu pai e minha mãe.
Tristes perdas.
Mas, apesar da inexorável realidade que a vida nos impõe, despertada pela lua descendo calmamente no horizonte, sinto que houve e há momentos felizes também, pois o sol, símbolo de vida, se levantou com sua luz dourada e quente, nos estimulando. E por isso estou feliz com o nascimento de netos. Uma dádiva!
Feliz, por amar e ser amado por meus filhos.
Feliz, por ter uma irmã querida e amada.
Feliz, por perceber que tenho companheira que me cobrirá quando me recolher finalmente.
Feliz, pelos amigos.
Feliz pela família.
Feliz por estar vivo e poder comtemplar as belezas que a natureza nos mostra todos os dias, como o recolher da lua e o nascer do sol. Muitas dádivas!
Saio da sacada com o sol fulgurante subindo ao céu e volto para o meu dia a iniciar.
A vida é um sopro que se esvai rapidamente.
Viva, não exista, ainda que falte pouco tempo! Vale a pena!