Engano

A matriarca da casa era a mãe da qual nunca desejou a ser, mas necessitou. Pois aos quinze anos de casada, a vida a surpreendeu. O homem cujo jurou ser o seu companheiro até a hora da morte, voltou para trás. Descumpriu as palavras, sem qualquer comentário da cruel decisão a deixando sozinha com os quatro filhos menores pelo o mundo a fora.

Ela e os filhos, assim como o mundo a fora, exceto o covarde e os seus péssimos próximos amigos, foram os últimos a saberem da cruel vida ofertada.

De início, Zoraide quis chorar. Sentiu o mundo lhe desabafar de uma maneira da qual jamais ousaria um dia sentir na pele. Teve que encarar com a realidade. Não tinha mais mãe ou o pai para lhe amparar, como nos velhos tempos de solteira ou de vida dos saudosos pais.

Seus heróis já não estariam mais ali para lhe socorrer. Suas missões já teriam cumpridos. Agora era Zoraide e os quatro filhos sozinhos, sem o apoio do homem cujo acreditara ser o seu amparo enquanto houvesse fôlego de vida.

Nos seus momentos frágeis, viu os quatro filhos menores perguntarem pelo pai que do nada sumiu e paradeiro não os deixou.

De início, Zoraide respondia que estava de viagem e que algum dia haveria de tão breve surgir pela porta. Esse era o seu sonho também, afinal, ela o amava ainda e tinha a certeza viva do porquê terem casados.

Com o passar do tempo descobriu que a mentira não colava mais, nem para os filhos, assim como para o próprio coração da mulher guerreira da qual a vida cobrava.

A mulher ferida, golpeada pelo covarde maridão, teve que a partir daquele momento, se tornar o pai e a mãe da casa.

Suas quatro joias ainda restante eram todos menores. Pedro, o primogênito, doze anos. Emha, a primogênita, dez anos. Já os caçulas: Elmano, oito e Moabe, seis.

Em momento algum Zoraide via na veia o momento certo ou oportunidade de cobrar dos primogênitos alguma porcentagem da parte do covarde pai que sumiu de vez pelo mundo a fora, sem deixar qualquer rasto.

Sentia em cada uma de suas joias, a falta constante do pai que ainda eles não compreendiam a razão de tudo aquilo.

Zoraide precisou ser pai e mãe, dupla personalidade numa tensa casa que ficou somente na sua responsabilidade.

Teve que guardar por muitas e muitas vezes, o seu momento de choro e o medo de não conseguir dar conta da casa e família. Afinal, a vida não dava trégua, a despesa financeira da casa dobrou.

Precisou por muitas vezes ser rude com os filhos e fazê-los de alguma forma os auxiliar naquilo que já não contava com as forças dos seus braços.

Dos estudos, nunca os deixou na última opção. Não queira para eles aquilo que a vida não a ofertou.

Os estudos em primeiro lugar. Nada foi fácil, pois diante a sua persistência, muitas vezes algum dos inocentes filhos, encontravam nela alguma fraqueza e a tornava a mãe rude do qual necessitou.

Muitas vezes não tinha força de se olhar no espelho e encarar os longos anos que haveria de ver pela frente.

O tempo passou. Sem perceber, suas joia cresceram, progrediram e se tornaram moças e rapazes.

Por algumas vezes se via na pele querendo viver pelos filhos aquilo que deveriam eles viverem.

De filhos crescidos, pensou em alguma vez imaginar que alguma brecha ou descanso haveria de conquistar, dentro de algum dia na vida poder viver de tudo aquilo que necessitou deixar de viver pelo bendito casamento mal feito. Que nada! Filhos crescidos ou vivos, jamais deveriam de lhe dar paz, afinal, filhos depois que nascem serão sempre preocupação de um mãe.

Uma mãe nunca aprende que os filhos nasceram para um dia serem criados por suas próprias asas. Uma mãe sempre quer defendê-los e principalmente evitá-los de viver naquilo que elas acreditam ser bons de poupá-los a sofrer.

A vida pode ser cruel, mas as suas consequências ninguém pode evita-los de passar por aquilo que necessitam passar para amadurecer. É com as consequências da vida que o homem amadurece e vive o ciclo da vida e do destino sujeito a passarmos.

A casa dos vinte anos, chegou para os filhos. Zoraide não via casamento e progresso na sua geração. Algo que lhe causava decepção. Aja coração! Para piorar, eram as profissões de seus filhos, sua maior preocupação.

Nunca imaginou isso na vida de ninguém, mas na sua criação, era filho primogênito, passeador de cães, uma carpideira e outra barraqueira. Nenhum de carteira fichada, mas todos com o salário garantido, exceto o filho caçula. Esse era mistério.

A sofrível matriarca da casa, até se preocupava para o mistério desmistificar. Vai que a resposta era de arrepiar!

Muitas vezes se flagrava na ideia de o mistério acabar. Enfim, o medo a vencia. E a curiosidade sempre ficava para um outro dia.

Defensora da cria, desejava e muito que em outras profissões, todos, a um dia partiam. Enfim, quem é que pode interferir numa vida que não está na sua veia?

Zoraide, mediante a angustiante e exaustante correria do dia, tinha algo que a descontraia. Era um programa romântico, numa emissora de rádio famosa de São José dos Campos, chamado “Te quero porque te amo”.

O vozeirão do locutor do programa noturno lhe fazia viajar. Via nele os momentos de glória cujo a vida não lhe deu. Era sempre compromissada com a programação.

De repente, num certo dia, teve uma grande abalo ao coração. Descobriu que a misteriosa profissão do filho caçula, tinha uma forte ligação com o cara da locução. Aja coração.