Só Falta Eu

22.07.2021

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Há mais de vinte e tantos anos, ia às seis horas manhã com uma bola de basquete para a quadra coberta do clube, encontrar com um amigo da época do primário para jogarmos partidas de “21”. Era uma ótima atividade, corríamos e suávamos bastante, meu companheiro era lutador e difícil de vencer.

Esse jogo, basicamente uma disputa em meia quadra de uma partida de basquete com a contagem até vinte e um pontos. Jogavam-se dois contra dois, até quatro contra quatro no máximo.

Fazíamos, ou melhor, eu fazia uma enorme algazarra, gritaria e brincadeiras durante as partidas, chamando a atenção das pessoas que passavam por fora da quadra indo em direção à sala de musculação, divertindo-se com as minhas macaquices.

Um dia, ia um sócio desconhecido saindo da sala, me olhou batendo bola sozinho. Chamei-o:

- Não quer jogar? - Ele topou, gostou da brincadeira e se agregou ao grupo. Hoje somos grandes amigos, quase irmãos.

Assim, foram se juntando novos jogadores, e a mais pitoresca e engraçada dessas adesões de novos “basqueteiros”, ocorreu em um dia em que estávamos em partida de duplas, quando entra em quadra um senhor de camiseta e calção um pouco antigos, meias soquetes e tênis brancos, de óculos, com uma bola toda coloria, vindo em nossa direção como um astro americano do basquete. Paramos de jogar vendo aquela figura pitoresca que chegava de sorriso no rosto e nos disse:

-Bom dia pessoal. Posso me juntar ao grupo?

-Sim, claro. Mas vai jogar de óculos? – perguntei, pois seria um risco.

-Só para perto. De longe eu não preciso dos óculos.

Ele jogava muito bem e tinha uma característica peculiar e cômica: ao fazer o seu arremesso para a cesta, levantava a coxa direita em ângulo reto e eu colocava a minha mão nela, desequilibrando-o. Ele errava a sexta e ficava muito bravo. Riamos, desconcertando-o. Foram bons tempos aqueles e que resultou em novas e duradouras amizades.

Hoje, não jogamos mais, somos quase todos sessentões para mais, mas continuamos amigos. Alguns do grupo tiveram mudanças significativas em suas vidas, a começar pelo colega de escola primária imbatível: sofreu um sério acidente automobilístico e ficou paralítico, uma tremenda fatalidade, deixando-o cadeirante. Mas, como é um lutador, vai à piscina do clube nadar com frequência. Quando venho a São Paulo, sempre vamos comer uma pizza. É um exemplo de luta e perseverança. Admiro-o.

Outro, nosso querido “hermano” argentino, que chamamos de “Gardelon”, fez operação de catarata em um dos olhos e sofreu um derrame, tendo a visão da vista operada reduzida significativamente e prejuízo dos movimentos de um lado do corpo.

O nosso astro do basquete americano, hoje com noventa anos, tem problemas nos joelhos e dificuldades para caminhar, frequentemente nos chama para irmos vê-lo, e o encontro nas minha vindas para a capital paulista, junto com alguns do nosso grupo.

Na última visita que fizemos, estávamos eu e o meu quase irmão em sua casa, em animado “happy hour” relembrando os nossos tempos de racha de basquete, quando ele me pediu para que pegasse um álbum de fotografias grande, que estava em cima de uma mesa ao meu lado, para nos mostrar as fases da sua vida longeva.

Começou a folhear as páginas, onde apareciam as imagens de sua adolescência, da sua maturidade, do seu casamento e dos seus tempos de atleta e jogador de basquete em um time de cidade do interior paulista. Em uma foto, onde aparecia toda a equipe, foi apontando com o dedo para os jogadores:

-Esse morreu, esse também, também - e assim foi até que só sobrou ele, vivo.

Parou um segundo, talvez percebendo naquele momento que é esse o nosso fim irreversível, disse-nos:

-Só falta eu!

- Falta nós também - respondi, dando-lhe uma palmada camarada nas suas costas.

- Por isso, temos que aproveitar esses nossos bons momentos de amigos, não é mesmo - disse ele sorrindo, fechando o álbum da sua vida, passada.

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Fernando Ceravolo
Enviado por Fernando Ceravolo em 22/07/2021
Reeditado em 22/07/2021
Código do texto: T7305198
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