A Audiência
Bandeira todo perfilado, após a continência e o ritual de retirar a cobertura da cabeça, identificar – se e dizer estar pronto para responder à audiência; tudo conforme a orientação do sargenteante. O aluno, vestido com o uniforme de aula, conhecido como Cascatinha, escolhera um caxangá novinho em folha; a camisa branca de mangas curtas com o seu nome pintado de azul estava limpa e muito bem passada; a bermuda mescla vincada dava também a aparência de pouco uso; o sinto espelhando brilhava e fazia conjunto com o borzeguim bem engraxado e as meias pretas.
O comandante fitou o aprendiz de cima a baixo como costuma fazer com todos os praças que vem a si, não só para responder por alguma falta assinada no livro de castigo; mas também para ouvir, mas raramente, a pedidos, nos quais as praças solicitavam sua permissão ou influência para resolver assuntos particulares dos mais diversos.
- O senhor me parece ter sido o responsável pelo que aconteceu na Parquelândia, não é mesmo? – indagou olhando firmemente nos olhos do aprendiz, que impassível respondeu negativamente de pronto. A pressão psicológica era enorme, mas Bandeira, desde pequeno, acostumado às batidas policiais, aprendera a manter – se impassível, mesmo perante a uma autoridade como o Comandante da Escola de Aprendizes.
- A minha carteira foi roubada num ônibus, quando eu estava na Aldeota, voltando para bordo – disse Bandeira, ao ser indagado posteriormente pelo Comandante sobre o porquê de sua identidade aparecera na cena do crime.
Imbuído do poder de julgar o caso, o Comandante tinha um álibe, embora duvidoso, convincente. Resolveu, como é prerrogativa do cargo em que está, admoestou o aprendiz e deu o caso por encerrado, mesmo sabendo que enfrentaria um inferno por parte dos políticos e superiores do 3° Distrito Naval.
E assim o tempo passou e somente cinco após o acontecido o homem de vinte e poucos anos – já quase com trinta – saiu da cama e recuperou – se com sequelas da pisa que tomou, ficando tetraplégico e com problemas irreversíveis de fala e de memória; enquanto o trio, Bandeira, Ventura e Amorim já se preparavam para a primeira tentativa de admissão a Escola de Sargentos como cabos e a menina responsável por tudo se formou em pedagogia e continuou morando em Fortaleza.