Desencontro Casual
Uma onda de choque percorreu sua espinha quando seus olhares se cruzaram. Estava em um restaurante movimentado, o som das conversas ecoava no ambiente amplo. Seu melhor amigo, sentado à sua frente, estava ocupado respondendo alguém no celular. Digitava despreocupadamente com uma mão enquanto a outra, segurando o garfo, pairava a meio caminho entre o prato e sua boa. Ele sorriu, sentindo afeto pelo amigo distraído, em seguida deixou seu olhar percorrer as mesas onde diferentes pessoas estavam absortas em suas próprias conversas. Naquele momento uma pessoa entrou pela porta e seu olhar foi atraído nessa direção, caindo sobre uma figura familiar. Poderia ser...? A pessoa caminhou vagarosamente, virando o rosto de um lado para o outro em busca de um lugar vago para sentar-se. Deveria parar de observá-lo? Mas não adiantava, mesmo que pudesse se decidir por ignorar que um antigo amor havia aparecido de repente da sua frente depois de tantos anos. Não conseguia desviar o olhar. Sentiu um aperto no peito e as mãos repentinamente frias. Então percebeu que seus olhares tinham se cruzado e uma onda de choque percorreu seu corpo. Isso teve o efeito de lhe trazer de volta a realidade. Envergonhado, baixou o olhar e desejou nunca ter olhado para além da própria mesa. Lembranças dolorosas ameaçaram vir à tona, ele sentiu seus olhos querendo lacrimejar, mas rapidamente afastou as lembranças. A situação ficaria muito mais vergonhosa se esse alguém percebesse o quanto sua presença o afetava.
- Não vai mais comer? - A voz conhecida de seu amigo chegou em seus ouvidos como uma boia salva vidas caindo ao alcance de um náufrago.
- Ah, eu fiquei distraído observando as pessoas...
Se serviu de uma porção de comida do seu prato para disfarçar, enquanto seu cérebro continuava funcionando em alta velocidade. O melhor seria seguir ignorando e fingir que não se importava. Estava decidido, ainda que passasse do seu lado, faria questão de não cumprimentar. Também poderia ser que nem tenha sido reconhecido. Esse pensamento trouxe um certo alívio, ele soltou um suspiro e percebeu o quanto seu corpo tinha estado tenso.
- Que pessoas são essas que te fizeram suspirar? - Brincou o amigo, olhando para cima do ombro na direção que ele estivera olhando.
- Não olhe! - Esbravejou - Você não conhece, e assim o ser vai achar que eu pedi para você olhar.
- O ser? - Perguntou rindo e se virando de volta para olhar o amigo – Quem é?
- Só alguém que não vejo a muito tempo e prefiro... – Sua voz estremeceu, por mais que tentasse fazer parecer que não era algo importante, sua emoção transpareceu – na verdade, está mais para um fantasma do passado que apareceu para me assombrar... desculpe, mas, será que podemos ir embora?
- Tão ruim assim? Bom, se me pede dessa forma, claro, podemos ir – Vendo que o amigo não se movia, acrescentou em tom de brincadeira – Contanto que me pague uma cerveja e me conte essa história.
- Tudo com você é desculpa para beber – Disse rindo. A risada lhe deu coragem, respirou fundo e caminhou com seu amigo para fora daquele lugar sem olhar para trás.