Margarido, o colecionador de arcaísmos

Margarido poderia ser definido como um sujeito bonachão. Passava horas em tranquila conversação e nunca se entediava com qualquer interlocutor, nem mesmo se o assunto fosse dos mais entediantes. O irmão destoava completamente do seu temperamento, não tinha a pachorra para assuntos desinteressantes.

Margarido era conhecido por todos da cidade. Não havia quem não o estimasse. Contudo tinha um jeito peculiar. Trazia sempre a conversação palavras arcaicas. Esse seu modo excêntrico já lhe trouxera alguns dissabores. Mas nem por isso deixou de lado o emprego de tais palavras. Tinha consciência do espanto que provocava nas pessoas e gostava de tais reações. No entanto, já perdera até um amor.

Um dia, resolveu se declarar a moça mais bonita da cidade, e entre uma palavra e outra a chamou de donairosa, a moça sem entender sentiu que era uma ofensa e deixou o rapaz a ver navios. E numa última tentativa gritou:

– Mariana, pedir-te-ei que ouças a voz do meu coração!

Contudo, todos já se acostumaram a serem chamados por ele de vosmecê, um pronome de tratamento bem antiquado e muitos da cidade até passaram a usar o pronome arcaico à moda de Margarido.

O problema maior era quando algum recém-chegado a cidade cruzava o caminho de Margarido e lhe pedia alguma informação. Muitas vezes o interlocutor ia embora sem entender o que queria dizer o bom homem.

Era amigo do boticário da botica da esquina. Fazia questão de tratá-lo assim mesmo. E o amigo achava graça da forma como era tratado.

Engana-se quem pensa que os arcaísmos de Margarido não tenha nenhuma utilidade. Numa gincana ,foi solicitado o maior colecionador da cidade. Um dos rapazes convenceu Margarido a se apresentar ao comitê organizador e dizer a sua coleção de Arcaísmos o que prontamente desempatou as equipes. Venceu-se a equipe por ajuda de Margarido.