Erradamente

ERRADAMENTE
Miguel Carqueija

Naquele dia Brasilino Patriota, em função da pandemia, estava em casa. O prefeito esquerdista Eduardo Paes havia decretado confinamento (erradamente chamado de “lockdown”), proibindo grande parte do comércio de trabalhar. Isso não afetava diretamente Brasilino, pois ele estava no sistema de trabalho em casa, pelo computador (chamado erradamente “home office”). Assim ele passou algumas horas na internet, mexendo o ratinho (chamado erradamente “mouse”), até que sentiu fome. Morava sozinho e a comida havia acabado. Interrompeu o trabalho e deu uma rápida olhada no seu correio eletrônico (chamado erradamente “e-mail”), respondeu algumas mensagens e em seguida espiou algumas páginas (chamadas erradamente “sites”) que costumava acompanhar.
Então, desligou o computador e telefonou para um restaurante, encomendando um almoço pelo sistema de entrega a domicílio (chamado erradamente “delivery”). Claro que preferia ir num restaurante de auto-serviço (chamado erradamente “self-service”) e servir-se à vontade, mas isso estava temporariamente vedado pela ignorância de Eduardo Paes.
A quentinha felizmente chegou logo trazida pelo entregador (chamado erradamente de “motoboy”). Brasilino deu uma pequena gorjeta (pequena, que ninguém é de ferro desde que Fernando Henrique Cardoso arruinou o país com o Plano Real) e tratou de almoçar, sem muito gosto porque não lhe agradava comer desse jeito.
Retornou ao trabalho e de noitinha conseguiu terminar todas as planilhas do dia, e achou que poderia descansar. Mas então, o inesperado aconteceu: faltou luz. Ultimamente isso vinha acontecendo com alguma frequência. Felizmente Brasilino já atualizara seus assuntos, senão teria provavelmente de ir numa loja de internet (chamada erradamente “lan-house”) se não houvesse sido atingida pelo apagão (chamado erradamente “black-out”). Afortunadamente ele tinha umas velas. Pensou em como algumas ações não eram muito viáveis no celular de multi-uso (chamado erradamente “smartphone”) mas somente no computador mesmo, que inclusive tinha a vantagem da tela grande.
Mas quando ia acender as velas, a luz voltou. Mesmo assim ele deixou, velas, fósforos e castiçais ao alcance, na mesa da sala.
Fez um lanche rápido, deu uns dois telefonemas e assistiu alguns devedês. Tomou uma taça de vinho e achou que poderia se recolher mais cedo. “Afinal, pensou, está tudo OK!” (único estrangeirismo que ele aceitava).

Rio de Janeiro, 2 de junho de 2021


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Miguel Carqueija
Enviado por Miguel Carqueija em 02/06/2021
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