A Chupeta
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04.01.2019
Duas senhorinhas - uma delas bem mais idosa que a outra - estavam sentadas na varanda de uma casa, aflitas. Um carro, na garagem ao seu lado, tinha o seu capô do motor aberto. Aguardavam.
Uma moça subia a rua e percebeu a situação:
-Bom dia, está tudo bem? Estão precisando de ajuda? - pergunta a elas.
-Mais ou menos. A bateria do nosso carro arriou e meu marido foi atrás do mecânico, lá embaixo, na avenida - responde a mais nova das duas.
Eram já cerca de sete horas da manhã, e o comércio praiano local não abrira ainda. O dia se iniciava como os anteriores: calor forte, céu limpo, sol abrasador e o suor tomando conta do corpo. Insuportável!
-Vou falar com o meu , ver se ele pode ajudar vocês - diz a moça subindo para a sua casa, três acima das senhoras, na mesma rua.
Ela encontra o marido e conta o fato. Vão ver o carro das senhorinhas.
-Bom dia. A senhora sabe se o seu marido tem o cabo para fazer a "chupeta"? - pergunta ele para a mais nova, esposa do senhor que fora encontrar o mecânico. Ela olha para a mais velha, provavelmente a sua mãe pela semelhança fisionômica, que lhe retribuiu o olhar inquiridor e sem graça. Ficaram incomodadas, era fato, por sua reação àquela palavra, parecendo-lhes esquisita. Ele percebeu e emendou:
- É para poder fazer a recarga da bateria do seu carro.
- Acho que não!
- Bem, vamos até lá encontrar o seu marido. Qual o nome dele?
- José.
Descem a rua até a avenida, de onde se via, na calçada oposta em frente à oficina fechada, um senhor alto e magro, de cabelos curtos e grisalhos, bigodes ainda com poucos fios negros, aparado, olhando fixo para o chão, desgostoso. Era o marido, o seu José. Ele levanta a cabeça e os encara sério e desanimado:
- Bom dia, tudo bem seu José. Sou seu vizinho de rua; minha esposa viu o seu carro com problemas e sua mulher nos disse que o encontraríamos aqui. O senhor tem o cabo para fazermos a "chupeta"?
- Bom dia, não tenho não! Eu troquei a bateria na semana passada, quando deu esse mesmo problema. Agora de novo! Estou tentando falar com o mecânico dessa mecânica aqui, liguei já algumas vezes, mas não atende! - responde irritado.
-Vamos ver se ali no supermercado vendem o cabo?
Entram na venda e perguntam, não tinha. Mas na loja de ferragens quase na virada da avenida, perto da praia, deveria ter - diz um rapaz do mercado.
- Vou pegar a moto e ir até o depósito onde pode ter o cabo. Eu tinha um e dei para o meu filho, por isso estou precisando novamente. É sempre bom ter - fala o vizinho para o seu José.
Caminham os três de volta para o carro e param na frente da casa. Seu José fala com a sua mulher sobre o que ocorrera. O vizinho sobe para a sua e começa a tirar a capa da moto, quando seu inquilino, morador de casa contigua, aparece e ele lhe pergunta:
-Por acaso você tem o cabo para fazer "chupeta"?
-Tenho! - entra na casa e traz o cabo.
Agradece o empréstimo, desce até o seu carro parado na calçada, de onde se podia olhar a casa das senhorinhas e mostra o cabo ao seu José, que se alegra. Vai com o veiculo até a entrada de acesso ao estacionamento da casa dele. Entra, deixando-os frente a frente. Abre o capô do seu motor, engata os cabos nos polos positivo e negativo das baterias dos dois autos, sem fechar o circuito - não conecta um deles. Liga o motor do seu, e conecta o cabo faltante no outro automóvel . Pede para o seu José ligar o dele. Dá a partida: pega! Acelera forte e deixa a bateria carregando. O vizinho desconecta os cabos, fecha capô e diz:
- Ótimo! Assunto resolvido! Seria bom dar uma volta com ele, seu José.
- Vamos para o centro, estávamos indo para a nossa casa na cidade. Muito obrigado pela sua ajuda e atenção - responde feliz por terem resolvido o seu problema.
A esposa dele, seu José, vem com um enorme saco plástico cheio de acerolas- vermelhas e grandes - e as entrega para a mulher do vizinho, que se ilumina com um largo sorriso de agradecimento:
-Obrigado! Eu adoro essa fruta.
-Nós é que agradecemos a sua atenção e ajuda. E podem entrar aqui no quintal de casa, quando quiserem, para colher as frutas dos nossos pés, que acabam ficando para os passarinhos, já que só voltaremos no verão próximo.
O vizinho volta-se para seu José, alegre agora, e diz brincalhão:
- Já começou o ano dando trabalho, hein seu José?
- Pois é, mas não fosse a sua "chupeta"... - diz replicando a brincadeira, fazendo-os rir todos juntos.
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