O quadro

As palavras não saiam da boca. Enquanto os lábios estremeciam simultaneamente variando com repuxamentos sobre as laterais faciais, criando rugas nos olhares, destacando de vez a angústia sentida.

Talvez fosse o fluxo das pessoas aglomeradas por volta da urna, de onde estivera o amigo. Amigo que até nas últimas horas estiveram juntos, curtindo o som alto, acompanhado de bebidas ao trajeto da última curtição de suas amizades. Fruto conquistado em tempo de colégio.

Mas o fim chegou! Chegou sem avisar! Avisar de algo que era pra ser mais uma noite de folia.

Com certeza de tudo o que juntos passaram, naquele instante, fluía à sua memória. Afinal, desde ao momento em que chegou ao velório não se apartou da urna. Talvez fosse aquilo o único consolo da qual pudesse tranquilizá-lo da perda do grande amigo.

As palavras não saiam da boca. Só quem visse a angústia destacada ao semblante, percebia o rio de lágrimas mareado no coração.

Por a cidade ser pequena, o cortejo era o único caminho da qual levaria qualquer finado à nova moradia.

O amigo órfão procurou ser forte, ousou encontrar em si forças sob a uma das alças da urna, sepultando o finado. Atitude em vão. A perca do grande amigo foi mais forte, deixando-o no chão. O cortejo deve que prosseguir. A necessidade de encarar a realidade deve que engolir. Afinal, a morte chega apenas para levar e nunca para avisar.