Queijo Ralado
25.04.2021
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Domingo era o dia de se comer macarronada no almoço na minha casa, uma tradição italiana, e virava uma festa.
Frequentemente vinha o irmão mais novo do meu pai com a sua família, seu amigo inseparável, e a irmã caçula deles, minha tia solteirona. O molho de tomates era preparado pela minha mãe no dia anterior, com “brachola” - um bife enrolado com pedaços de toicinho, cenoura e salsinha, em uma panela enorme e cozido durante quase todo o dia. Concluído, era denso, de um vermelho vivo e forte, com um aroma maravilhoso. Eu adorava enfiar o pão velho nele e depois no queijo parmesão ralado, “Faixa Azul”, deliciando-me com esse aperitivo antes de almoçarmos - uma iguaria inesquecível. Minha mãe ralhava comigo para parar de deixar migalhas de pão ao enfiá-lo no molho. Meu pai conversava com o meu tio, enquanto passava um grande pedaço de queijo parmesão no ralador sobre um prato fundo, criando um enorme monte de fiapos amarelos reluzentes, emanando aquele cheiro inebriante e convidativo. Os dois bebericavam uma dose de uísque, comentando assuntos animados e alegres. Riam muito, eram grandes e inseparáveis amigos.
A conversa na cozinha entre os adultos era alta e alegre, e nós, os pequenos, brincávamos em volta com grande algazarra, como uma perfeita cena de película italiana: uma balbúrdia de sons, risadas, ruídos e cheiros intensos. A alegria imperava. Boas lembranças da minha infância pura e ingênua, fora a “pastasciutta da mama”, maravilhosa e inigualável.
Esses momentos felizes vieram a minha mente, enquanto absorto, ralava também um pedaço de parmesão como fazia o meu pai.
O ferver da água para cozer o macarrão começou a borbulhar fortemente na panela, fazendo com que a tampa pulasse, voltando das minhas lembranças daqueles tempos felizes em família ao ouvir esse som metálico.
Faria o “macarrão de pobre”, com alho frito no azeite, pão velho ralado, parmesão e salsinha, pois não poderia deixar de manter a tradição familiar, sendo domingo. Essa receita era da minha tia solteirona, a irmã caçula do meu pai. Dizia ela que era de pobre, porque na Calábria, região da Itália e local da origem da nossa família, muito atrasada e paupérrima, aproveitava-se tudo o que sobrava das refeições. Ela morava em uma quitinete em prédio à Rua das Palmeiras em São Paulo, onde o meu pai também tinha uma no mesmo andar, com as portas de entrada frente a frente. Morei na do meu pai quase todo o período em que fiz a faculdade de engenharia, nos anos setenta, época dos meus vinte anos felizes. Convivemos bastante e gostava muito dela. Muito querida e alegre, e ótima cozinheira, sua língua de boi ao molho de tomates era famosa na família.
Coloquei o espaguete fino na água fervente, e ao mesmo tempo, comecei a fazer o molho aquecendo o azeite na frigideira, fritando o alho sem queimar. Macarrão no ponto, escorrido e juntado ao molho, salpiquei o farelo de pão, o parmesão ralado e a salsinha. Pronto para comer.
Sentei-me sozinho para essa refeição de domingo (minha mulher fora para o sul ver a netinha), mantendo a tradição italiana. Não fosse pelo queijo que ralei, não me lembraria daqueles deliciosos e inesquecíveis momentos que tive em família aos domingos. Saudades!
Ah, o “macarrão de pobre” é simples e saboroso, mas nada comparado a inigualável macarronada da “mama”, claro. Saudades, muitas, de um tempo que não volta mais.
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