Peixes em Metro!

Por: Egídio Garcia Coelho

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Peixes em Metro!

Recordando nosso saudoso pai José Coelho, meu conto volta ao meado dos anos 60, quando mudamos de Guaramirim para Joinville – SC, chegando numa fazenda que foi adquirida em parceria com meu finado tio Alaor Coelho que morava em Guarujá – SP.

Foram anos de lutas e dificuldades com enchentes e grandes perdas na lavoura com safras inteiras tomadas pelas águas que teimavam em cobrir tudo até que nada ou quase nada, pudesse ser recuperado.

Meu pai gostava de mega safra e assim, nunca media esforços para plantar grandes roças e na época estava em alta o cultivo do arroz.

Já que perdeu tudo plantando em antigas pastagens sujeitas a enchentes, porém de mais fácil cultivo, resolveu partir para as montanhas da fazenda, plantando em coivaras, ou seja, floresta nativa derrubada pela primeira vez.

Tudo estava indo dentro do planejado, até que uma temporada de chuvas, fez com que fosse perdido o tempo certo da queimada, atrasando a plantação que, mesmo assim, veio com muito vigor, prometendo uma produção recorde.

No entanto, com o atraso na plantação, houve no outono uma onda de vendavais que atingiu os belíssimos cachos de arroz, ainda na floração, ou seja, com grãos abertos para polinização que, fatalmente fez com que tudo fosse reduzido em menos de 30% da produção prevista.

Mais uma vez teria que recomeçar do zero, mas diante de uma família numerosa, foi forçado a trabalhar na construção civil para garantir o sustento e a sobrevivência de todos e a história vai longe...

Vale ressaltar, no entanto, que meu papai, mesmo diante de tantas turbulências, sempre tomava algumas iniciativas para garantir nosso sustento e entre elas, a pescaria era uma das últimas, já que detestava pegar em minhocas.

Lembro que numa pescaria, ele percebendo que seria também uma oportunidade para integração com seu primogênito pré-adolescente (eu), foi logo fazendo uma proposta que de imediato, concordei (nossa conversa vai ficar pra outro conto).

Vamos pescar juntos lá na lagoinha (uma curva desativada do Rio Piraí que havia tido alteração no antigo traçado para conter enchentes)?

-Opa! Sim papai...

Só que como tu sabes, eu não gosto de pegar em minhocas e se fores junto, será tua tarefa...

- Eu faço papai... posso levar anzol também?

Claro! Vamos pescar juntos, mas sem bateira (barco de madeira). Hoje tem muito sol e lá está dando muito peixe, mesmo pescando do barranco!

E lá fomos nós... Caminhamos por mais de 30 (trinta minutos) até a lagoinha, passando por uma pequena elevação dentro do mato, numa trilha de carroças e depois atravessamos um pasto úmido cheio de tiriricas que cortavam a pele. Beirando a lagoinha tinha uma linda pastagem com longa extensão no comprimento e a largura em trono de 80 a 100 metros, proporcionando uma paisagem exuberante.

Enfim, nas margens da lagoinha, escolhemos uma curva onde haviam caído do barranco, algumas árvores sobre as águas cristalinas que, formaram um excelente pesqueiro de boa profundidade que chegava escurecer, dificultando avistar o fundo, no entanto, os peixes ficavam expostos e alguns deles, faziam manobras que proporcionavam brilhos, tipo relâmpago prateado, refletindo o sol formando um espetáculo sem igual.

Tudo pronto e após colocar a isca de minhoca no anzol do papai, pensei em fazer o mesmo com meu anzol, mas fui interrompido, já que um peixe foi puxado e com isso, minha tarefa se iniciou...

Papai bem folgado e sorrindo disse: já que tu vais colocar a minhoca, aproveite e tire o peixe antes!

Como não tínhamos levado sacola/bolsa para recolher os peixes, optamos por fazer uma fieira, ou seja, uma vara de planta nova com um ganho que ficava na guelra do primeiro peixe, sendo os demais apoiados na sequência.

Em poucos minutos uma varinha de uns 50 centímetros estava cheia de peixes numa sequência muito rápida, sem chance pra que eu colocasse minhoca em meu anzol...

Na pressa, escolhi um baraço com pouco mais de um metro de erva de bicho que tinha nas margens da lagoinha e fiz a segunda fieira que encheu no mesmo ritmo, precisando repedir com outra (fieira) do mesmo tamanho que também ficou cheia de forma acelerada.

Predominava entre os peixes um acará mais escuro que, às vezes, chegava a pular e pegar a isca antes de chegar à água. Tinham piavas, mandis, jundiás (bagrinhos), badejos, saicangas, acarás de dois tipos entre outros peixes e todos de porte pequeno.

Com o sol a pino e muito calor, chamei a atenção do papai que se mantinha empolgado no embalo de ferrar os peixinhos sem precisar sujar as mãos...

- Papai eu estou com muita sede e também com vontade de pescar, já que até agora não deu pra parar!

Meus Deus, já temos mais de dois metros e meio de peixes e eu nem percebi, me desculpe!

Pode beber água e pescar um pouco, mas precisamos levar os peixes pro almoço.

Papai saiu na direção de um capão de mato pelas margens da lagoinha, talvez para atender alguma necessidade fisiológica que confesso, não ter dado nenhuma importância, pois eu queria mesmo era pescar um pouco!

Em menos de dez minutos ele voltou todo animado e dizendo que deveríamos aproveitar aquela abundância de água para limpar alguns peixes, pois demoraríamos um pouco pra chegar em casa e ficaria tarde pro almoço da turma que esperava por comida...

Eu tinha pego mais alguns centímetros de peixes e estava também com vontade de voltar pra casa...

Bem próximo do pesqueiro havia uma grossa árvore caída e parte do barranco deslocado pela corrosão, formava um canto apropriado para limparmos os peixes.

Com o fação, papai tirava as escamas, cortava as barbatanas e deixava a barriga aberta para que eu terminasse o trabalho. Pediu que eu deixasse as cabeças dos peixes para podermos leva-los pra casa na fieira, já que não tínhamos um vasilhame apropriado.

Limpamos um metro de peixinhos escolhidos com escamas e deixamos os lisos, que somados formaram em torno de meio metro, para limpar em casa com limão.

Assim, tínhamos um metro de peixinhos limpos. Outro metro que estava intacto na primeira fieira feita de erva de bicho e mais duas fieiras de uns 50 centímetros pra levar...

Meu pai era mais alto e podia levar as fieiras maiores (em torno de um metro cada) sem arrastarem no chão e no corpo.

Eu me encarreguei das fieiras menores e falei que seria complicado passar as tiriricas carregando peixes e varas com anzóis.

Então papai resolveu esconder os caniços (varas) no capão de mato perto da lagoinha para buscarmos em outra pescaria...

Resta muito mais a dizer até nossa chegada em casa, mas ficou marcado em minha memória que, quando chegamos, papai chamou por minha mãe (Nilsa) e minha avó (Maria Inês), dizendo: Nilza! Mamãe! Venham ver quantos metros de peixes conseguimos pescar lá na lagoinha. O Gidinho (euzinho) ficou o tempo todo, tirando peixes do meu anzol e colocando as minhocas, quase nem pescou, não dava tempo mesmo, era um peixe atrás do outro como nunca vi na vida...

E assim, fecho o meu conto pra não ficar muito extenso!

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