ARMAZÉM DO PAPAI
Agosto de 1965. Dona Helô estava no sétimo mês de gravidez, primeiro filho, precisou de uma ajudante. Tia Aurora indicou Zilda uma moça de uma cidade vizinha que há muito procurava emprego numa casa de família. Completara vinte e um anos e pretendia trabalhar e pagar os estudos. A casa em que se empregaria ficava bem próxima a escola e quando dona Aurora a levou até lá, houve uma mútua simpatia entre dona Helô e Zilda.
Como o marido de dona Helô viajava muito a serviço da empresa em que trabalhava, ela se sentia solitária e logo nasceu entre as duas uma grande amizade. Zilda não deixava que a gestante andasse sozinha pelo quintal, temia que tropeçasse e viesse ao chão. E ao sinal de qualquer desejo da simpática dona da casa, Zilda ia para o fogão preparar o prato almejado.
Houve um dia que dona Helô pediu a Zilda que fosse buscar um queijo para preparar o pão de queijo que há dois dias ela pensava em degustar. Salivava a todo instante pensando na quitanda quentinha saída do forno.
– Zilda, por favor vá a rua de cima no Armazém do papai e traga um queijo meia cura. Vamos fazer um lanche especial essa tarde.
– Dona Helô, eu aposto que é pão de queijo, não é mesmo?
– Isso mesmo! Então escolha um belo queijo meia cura.
– Pode deixar.
Zilda foi feliz e no caminho viu o quanto as pessoas daquela cidade eram simpáticas. Todo mundo se cumprimentava com tanta cordialidade que ela sentiu que escolhera a cidade certa para viver.
Chegou ao armazém, e à porta ficou abismada com o sortimento do comércio. Viu de tudo um pouco. Vassouras, baldes, buchas vegetais e muita variedade. Quando entrou sentiu o cheiro de café torrado na hora. Deu um pequeno tropeção no saco de arroz e andando em zigue-zague foi desviando das mercadorias até chegar ao balcão.
Foi logo atendida por um senhor de sorriso amistoso.
– O que deseja a senhorita ?
– Bom dia, a filha do senhor pediu que eu buscasse um queijo meia cura.
– O seu Tião, olhou para Zilda, passou a mão pela testa, desviou os olhos para o chão, olhou novamente para Zilda como se não houvesse entendido o que a moça falava. Então perguntou :
– O que foi mesmo que a senhorita disse?
– Eu disse que a dona Helô, sua filha, pediu que eu buscasse um queijo mei…
– Mas eu não tenho filha, só tenho filhos homens.
– Nossa, mas a dona Helô me disse que eu buscasse um queijo aqui. Tem outro armazém por aqui perto.
– Não, só esse mesmo!
– Então é melhor eu voltar lá e perguntar o que foi mesmo que ela me mandou comprar, vai ver me mandou ir até a farmácia e eu me enganei.
– Isso, tira a dúvida com ela. E qualquer coisa estamos aqui para atendê-los.
Zilda voltou à casa sem entender nada. Como dona Helô diria que o senhor era seu pai e ele não a reconhecia como filha. Estranho.
Abriu o portão desanimada. E logo a senhora veio ao seu encontro.
– Então Zilda, cadê o queijo ?
– Bem, sabe o que é ? O pai da senhora disse que não tem nenhuma filha, só filhos.
– Meu pai? O que você está dizendo?
– Fui lá no armazém do pai da senhora e ele me disse que…
– Armazém do meu pai...como assim...meu pai não tem armazém.
Nesse instante dona Helô não se conteve, caiu na gargalhada. E Zilda arregalou os olhos pensando que dona Helô talvez não estivesse bem do juízo.
Assim que conseguiu parar de gargalhar dona Helô explicou.
– Me desculpe Zilda por não ter explicado bem, é o hábito entende, na verdade o nome do Armazém é…ARMAZÉM DO PAPAI.
Dessa vez quem não se conteve foi Zilda. Lembrou se de todo embaraço do dono do Armazém e caiu na gargalhada.