PEQUENOS CONTOS DO SUL
UM DOMINGO DE MISSA
Ps.O sobrenome citado no texto é fictício e a foto é meramente ilustrativa.
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O Suiriri gorjeava no pé de chorão e ela abria a janela para aquele dia.
Aprendera com a mãe que os Suiriris cantam pela primeira vez as 6 horas da manhã.
Olhou para o relógio despertador e constatou os ensinamentos que a saudosa mãe lhe deixara.
Era , de fato, 6 horas da matina.
Tomou o rumo da estrebaria e as duas vaquinhas já estavam à sua espera para a ordenha matinal.
A manhã rompia-se embrulhada numa fina camada de neblina. As montanhas quase azuladas de distância e a alvorada de gansos e marrecos davam o tom àquele domingo com missa no povoado.
Apressou-se.
Sem demora a casa incensou-se ao cheiro de café e pouco a pouco , ainda sonolentos, foram surgindo os outros membros da familia Stantrovinski.
A mesa, rodeada de olhares de safira, era dirigida pela senhora Stantrovinska que ordenava para que se apresassem.
O primeiro a sair da mesa foi Yujo. Ainda mastigando a broa com mel, correu para o terreiro atrelar os cavalos à carroça.
Tudo impecável,preparado à véspera, com arreamos encerados e pelegos escovados sobre os assentos.
Da janela da cozinha a Sra.Stantrovinska recomendou-lhe para não esquecer os guizos recentemente adquiridos.
Obediente, o neto mais velho pendurou nos pescoços dos animais, uma penca de pequenas sinetas presas a laçarotes vermelhos.
Diante do espelho a velha senhora ajeitava-se, prendia os cabelos, atava o inseparável lencinho branco à cabeça.
A face lisinha,apesar dos mais de 80 anos, recebia alguns afagos de esponja e o cheiro adocicado de pó de arroz invadia o compartimento.
As duas netas, cheias de laçarotes e roupas coloridas já esperavam ao redor da carroça.
Nos dias de hoje, a família Stantrovinski certamente embarcaria num automóvel ou camionete muito confortável, mas em meados dos anos 60, a carroça era tudo de que dispunham.
Uma pequena bolsa quadradinha na mão, véu e rosário e a matriarca estava a postos para seguir o seu rumo.
Domingo é dia de celebrar a vida ! Agradecer o pão de cada dia, orar a Deus por saúde e fartura. Proferia em alto e bom tom.
Esse sempre foi o lema da famiíia.
Yujo incitara os animais e a carroça vermelha e verde foi abrindo espaços entre um carreiro e outro.
O tilintar dos guizos dava um tom festivo e o sol já tomava consistência na manhã de domingo.
Novembro agigantava-se em todo seu esplendor e os olhos da velhinha delineavam o vigor das leiras, o verde escuro e robusto do milharal, a plantação de feijão, as abóboras...
A passarada amiudava-se entre o feno à beira da estrada.
Trinados confundiam-se ao tilintar dos guizos e um vento fresco trazia recados de mundos distantes.
Trepadeiras silvestres esbanjavam-se em cores e flores ao longo do caminho.
Calada a velhinha sorvia o sagrado licor da manhã e o coração pulsava forte e feliz antevendo o celeiro repleto que o Criador lhe prometia.
A carroça deslisava pela estradinha de chão e garbosos os cavalos adentravam agora ao povoado.
Algumas casas com chaminés louvando aos céus em espirais azuladas, bodegueiros bocejantes acenando à comitiva , cheiro de assados pelo ar, um leiteiro apressado em sua charrete e lá no alto, a igrejinha.
Soavam os sinos em segundo sinal clamando pelos fiéis.
Yujo pára a carroça à sombra dos plátanos e a família desembarca com ares festivos.
As meninas carregam uma certa timidez em seus olhares.
A idosa, apoiada em uma bengalinha, singra o pequeno trecho que a separa da capela.
De fronte à igrejinha um pequeno grupo de fiéis, a espreitam, com olhares de ternura.
Ela pisa a relva ligeiramente orvalhada e as sempre vivas dobram-se em reverência aos seus passos.
Soam uma vez mais os sinos e aquela velhinha em passos lentos e cansados, que a todos enternece, na manhã azulada de domingo tem um jeito de prece.