Amor por um instante
Numa manhã ensolarada em Manaus, às dez horas, caminhava apressadamente Dalva, no centro da cidade, na suspeita atitude de quem cometera algum delito. Não obstante o traje espalhafatoso e até ridículo, ninguém deu a mínima bola para aquela prostituta, que passou despercebida e incógnita no meio da multidão.
Já em casa, num quarto que alugava ali perto, alguém bate na porta. Depois de alguns minutos ela abre. Era o filho mais novo da dona da pensão. – O que você quer? – Falar contigo. – Sobre o quer? - Quanto custa um programa? – Não sou dessas, me respeita. – Deixa disso, eu te conheço. – Não, você não me conhece e nem nunca me viu – disse fechando a porta.
O rapaz fica ali contrariado e pensativo: - Dalva, Dalva... Quando você vai perceber que eu sim sou o amor de sua vida. Por que és assim? Parece que Dalva acaba ouvindo os seus pensamentos e ela volta abrir a porta do quarto: - Vem, entra coisa chata... – Diga-me o que aconteceu hoje de manhã? – Não aconteceu nada, ora! – Claro que sim, diga-me!
Os dois se abraçaram longamente. Trocaram caricias mútuas. Fizeram amor como um casal que não se via há muito tempo. Quando à noite já se aproximava, ela disse: - Vá, não quero que te vejam aqui comigo. – Por quê? Todos aqui sabem que eu te amo. – Você é muito jovem, o que entende de amor? – O suficiente para querer ficar contigo para sempre.
Ela olhou-o nos olhos do garoto, e percebeu que ele falava a verdade. – Você sabe o que eu faço, não sabe? – Sim, sei. – E mesmo assim quer ficar comigo? – Sim, quero. – E se eu te disser que além de prostituta eu sou assassina? – Nada do que você fez ou faz me importa, o importante é que eu te amo e quero ficar contigo. – Não, você não sabe nada da minha vida. Já te falei.
- Não me importo e nem quero saber o que você fez ou deixou de fazer. – Vá embora que é melhor para você. - Penso que não. O melhor é ficar aqui contigo. Dalva não conhecia aquele garoto para saber que ele era tão determinado. Ela pensou em fazer o mesmo que tinha feito com o seu último cliente. Mas ela estava confusa em seus sentimentos.
- O que foi? Por que você está me olhando desse jeito? - Nada. Deixa para lá. - Você está gozando da minha cara, né? - Não. Só estou falando sério. Só isso. - Sei. - É melhor você ir. E foi o garoto com o coração partido falando para si mesmo: - “O amor é convencer o outro de que você é maduro o suficiente para assumir as responsabilidades e obedecer a lei”.
Quando Dalva se desfez daqueles pensamentos, abriu a porta do quarto e não viu mais o seu amor. Ele tinha ido embora para nunca mais voltar. Com os olhos cheios de lágrimas, enquanto colocava o traje espalhafatoso e até ridículo do seu trabalho no centro de Manaus, ela passou a sua vida a limpo: - “Dalva, Dalva... Eu te avisei... Presta atenção... Era amor de verdade. Foi amor por um instante”.