Dona Aurora, a precavida. (Reeditado)
Dona Aurora é uma mulher incrível. Casada há vinte anos com seu Tião, ambos se conhecem como nenhum outro casal. Até que naquela manhã do mês de março seu Tião não teve tanta certeza se conhecia tão bem a esposa.
Tudo por causa de um cartão que ela guardara na bolsa. Dias antes, numa conversa com um amigo, seu Tião recebeu uma indicação de um dentista. Então pediu a esposa que o guardasse na bolsa dela.
Uma semana depois, o marido queria marcar uma consulta. A esposa se prontificou a ligar . Depois de tudo combinado com a secretária o cartão voltou para a bolsa de dona Aurora.
No dia da consulta perguntou a esposa onde ficava o consultório. Ela disse que no caminho pegaria o cartão na bolsa. Partiram.
A esposa foi tagarelando e vasculhando dentro da bolsa. E a cada quarteirão o marido perguntava o endereço. Até que ele parou o carro e perguntou:
– E então Aurora, esse cartão tá ou não tá na sua bolsa?
– Mas é claro que está! Só um momento que eu já encontro.
Passaram-se quase cinco minutos e nada. O marido já indignado disse que chegariam atrasados. Foi quando Dona Aurora resolveu despejar todo o conteúdo da bolsa no banco detrás do carro.
Nesse instante, seu Tião não pode acreditar no que seus olhos viam. Havia uma enorme quantidade de coisas despejadas no banco de trás, nunca imaginou o quanto uma bolsa cabia tantos objetos. Ficou realmente surpreso. A esposa começou então a vasculhar tudo em cima do banco. Pediu a seu Tião que a ajudasse. Ele foi logo examinando tudo e sentiu uma picada fina no dedo que o fez levar o dedo a boca. Pensou ter sido picado por um animal peçonhento, mas dona Aurora mostrou a agulha atravessada no retrós de linha.
– Mas por cargas d´água você carrega uma agulha na bolsa?
– Ora Tião, a gente nunca sabe quando um botão vai se soltar da roupa, ou mesmo um rasgão no tecido.
O marido continua a remexer no amontoado de coisas e encontra um ventilador de mão.
– Aurora você tem um ventilador de mão?
– Claro querido, você não imagina o quanto eu sou claustrofóbica. Quando vou ao apartamento de minha irmã fico imaginando que, se eu ficar presa no elevador terei o ventilador a mão.
– E o cartão Aurora?
– Calma Tião, já, já o encontro.
Mas a indignação do marido não parou por aí. Lá estava uma dúzia de lixas de unha. Duas pinças de sobrancelha. Um vidro de esmalte ressecado. Um saco de batata frita fechado por um prendedor de roupas. Um chumaço de algodão. Três botões de cores e tamanhos variados.
– Esses botões, porque você não usou a agulha e a linha que carrega?
– Eu não encontrei a agulha e a linha nesse dia. Achei que tivesse deixado em casa. – O marido sacudiu a cabeça em tom de reprovação.
Continuaram a busca e encontrou uma embalagem fechada de pilhas.
– Mas para quê pilhas?
– Ora Tião, são para o ventilador portátil. Vai que as pilhas acabem bem na hora que eu estiver presa no elevador. E depois tem a lanterna também, veja, não é lindinha. O marido arregala os olhos e pergunta:
– E para quê você quer a lanterna?
– Para o caso das luzes do elevador se apagarem!
– Entendo!
– E esse celular?
– Ah, aqui está ele. Pensei que tivesse perdido, tive que comprar outro do ano passado. Foi bom porquê tem muito mais memória. Será que o do ano passado está aqui também?
– Eu não posso acreditar que você carregue tanta coisa inútil na bolsa.
– Ora querido, sou precavida.
– Sei!
Voltaram para casa, o dentista ficaria para outro dia quando encontrassem o cartão, ou ele pedisse o endereço novamente ao amigo.
Um mês depois do ocorrido, dona Aurora aniversariou. O marido chegou com um embrulho de presente. Entregou a esposa todo feliz.
Ao abrir, a esposa se surpreendeu.
– Uma bolsa?
– Sim meu amor, gostou?
– Bem, eu...achei um pouco pequena.
– Sim, por isso eu comprei. Agora você pode encontrar mais facilmente o que precisa. E depois, ela é muito bonita, assim como você.
Dona Aurora sorriu e assentiu, abraçou o marido e ficou de olho na bolsa antiga.