ATÉ QUANDO?
 
Naquela tarde, ela saiu como se fosse um pássaro que está preso numa gaiola e alguém lhe abre a portinhola, deixando-o voar, voar. A princípio, o voo meio desconexo, mas depois recobrando o equilíbrio. Dirigir novamente um automóvel, percorrer a rota que fazia parte de seu cotidiano, parecia um prêmio, depois de quase um ano de isolamento. De inúmeras privações, até de muitas coisas que lhe eram essenciais. Embora, essa saída tenha sido para cumprir compromissos em tempo mínimo, e, com tantos cuidados que ainda eram necessários devido a pandemia, todavia, teria que cumprir essa agenda pré-determinada e logo retornar à casa.

Mesmo assim, cada rua ou avenida percorrida, ia descobrindo que estavam bem melhores que antes, que até a surpreendeu.  As pavimentações refeitas, faixas bem demarcadas, e o trânsito bom. Experimentou uma sensação tão boa – de liberdade, de vida normal.  Mas sabia que não era verdadeiro, apenas era o que aparentava. Bastava olhar àquelas pessoas em cada ambiente que adentrou, com máscaras, distanciadas, desconhecidas. Ah que falta sentiu... uma troca de sorriso, um abraço, um café ... Com certeza, um longo tempo ainda teria que esperar.   

No retorno, adentrando as muralhas, sob os severos protocolos protetivos, viu-se no turbilhão da prisão imposta pelo vírus, e cumprida rigorosamente por uma mente dominada pelo pânico.

Em seu íntimo, um grito ecoou: até quandooooo?

 
Imagem: O Grito (1893) Edvard Munch
Cellyme
Enviado por Cellyme em 20/01/2021
Reeditado em 20/01/2021
Código do texto: T7164562
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