O “manézinho experto"
05/01/2021
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Fui à dentista cuidar de dente que me incomodou bastante durante as festas de fim de ano. Consegui, até certo ponto, atravessar esses dias de forma tranquila: doía uns, outros não; fui levando à base de paracetamol. Preocupava-me, pois poderia ser o canal inflamado.
Depois do dentista, iria ao “sacolão” fazer compras, um mercado só de frutas, verduras e legumes perto dali, aproveitando o estacionamento do consultório, pois nessa época de temporada é difícil de achar vaga para o carro, fora o seu grande volume nas estreitas ruas da vila, ou centrinho.
Cheguei à dentista antes do meu horário às quinze horas e trinta minutos; entrei as quinze no prédio do consultório. Atendeu-me em seguida, fez o curativo e a obturação do dente, pois a carie não atingira o canal, ainda bem!
Segui, então, para o “sacolão”. Fui a pé, em caminhada de cerca de trezentos metros. Chegando lá, peguei um carrinho de compras, desinfetei as mãos com álcool gel e a barra do carrinho, e empurrando-o, entrei no mercado.
Enchi um grande saco de laranja lima, que adoro - eu e minha mulher temos um ritual de chupá-las ao entardecer, sentados na nossa varanda vendo o nascer da noite. Depois, duas pencas de banana: um mais verde, outro mais maduro; um mamão Formosa; meia dúzia de limões; duas mangas; pêssegos – estavam verdes ainda e duas alfaces americanas orgânicas, ao custo de cinco reais cada uma – um roubo!
Com tudo escolhido fui ao caixa pagar, havia dois funcionando. Fiquei na fila do que era para atendimento preferencial. Percebi um homem de seus quarenta e tantos anos de cabelos raspados, “manézinho da ilha”, ou “manézinho” – apelido dado aos moradores da ilha descendentes dos açorianos, vindo do outro lado de uma bancada de frutas à direita, posicionando-se um pouco à minha frente para o mesmo caixa. As frutas nos separavam. O outro caixa ao lado, a atendente saíra fazia alguns minutos, concentrando-nos então no preferencial, ou seja, no que aguardávamos eu e o careca.
Pensei comigo: “Esse “manézinho experto” vai querer dar uma de Gerson e furar a fila do sacolão, justo comigo!”.
O homem ficou aguardando, estava com poucas coisas. Enquanto a pessoa pagava, a caixa do preferencial disse-lhe:
-Senhor, a fila é onde esta o senhor de carrinho ali! - apontando para mim.
Então, para o meu espanto, ele se moveu até à minha frente na fila, sem sequer me olhar ou perguntar se estava nela, pois era obvio que sim!
-Que cara de pau desse “manézinho”! - pensei.
Observava-o, quando a atendente do outro caixa, ao lado do preferencial, voltou reabrindo-o, me olhou e disse para passar por ele.
Embiquei o carrinho rapidamente, pois o descarado poderia querer ir com ela. Comecei a colocar as frutas para pesar e pagar. O espertalhão aguardava, pois a pessoa à sua frente estava com problemas com o cartão de pagamento!
Peguei uma caixa vazia, colocando as compras dentro e saí feliz por ter o malandrão recebido a sua recompensa por tentar dar uma de Gerson: levar sempre vantagem!
- Quem ri por ultimo, ri melhor! – disse rindo baixinho, vendo de relance, o “manézinho experto” que ainda aguardava à sua vez.
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