Carlitos, o surfista
04/01/2021
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Vieram caminhando na praia passando por nós. Iam se instalar junto ao inicio da duna de areia, como estávamos eu e minha mulher. Andaram mais vinte, trinta metros no máximo e pararam. Seria ali o seu acampamento.
Casal interessante: ele, pequeno, não mais de metro e cinquenta, andar rápido, pés dez para as duas, com certo balanço, ou claudicante, parecendo ter algum problema de locomoção. Estava sem camisa, bermudas longas, com o dorso e torso tatuados, e pele bem queimada pelo sol. Carregava uma prancha de surf muito pequena, proporcional ao seu tamanho. Via-se que era “elétrico”, agitado, pois seus movimentos e ações eram rápidos; irrequieto.
Ela, bem mais alta e forte, talvez com um metro e setenta para mais, cabelos pretos e pele bronzeada, morena, de andar pacato e devagar, carregando uma bolsa de praia e o guarda sol. Chamou-me à atenção o casal peculiar, e curioso, comecei a observá-los.
Montou ele o guarda sol quase rente à areia, ela estendeu a sua “canga” na areia e deitou-se; ele tirou a prancha da “camisinha”, colocou-a com cuidado na areia, como se fosse de porcelana – sempre noto que todos eles, surfistas, tratam-nas como bibelôs delicados.
Devidamente posicionados, ele saiu rapidinho no seu passo curto e veloz, parecendo Carlitos, catando plásticos pela areia, pois havia tido forte ressaca à noite, trazendo muita sujeira à orla; fazia sua parte com a natureza.
Fiquei com calor e fui mergulhar no mar, deixando minha mulher deitada ao sol. Caminhei até à água fresca e de ondas fortes, reflexo do dia anterior; mergulhei duas, três vezes refrescando-me. Saí da água e o vi carregando varias coisas até à lixeira de concreto, que ficava exatamente entre os nossos guarda-sóis. Era engraçado vê-lo caminhando, como os seus gestos, trejeitos, lembrando-me muito de Chaplin.
Voltei à minha sombra debaixo do guarda sol, a esposa ainda lagarteando. Sentei-me na cadeira acompanhando o baixinho surfista, o que ele faria, ver como surfava, se bem, se habilidoso. Fiz analogia ao eterno vagabundo, falando para minha esposa:
-Querida, estou olhando o casal que está ao nosso lado, e o rapaz tem o jeito do Carlitos, seu andar, trejeitos. Ele vai surfar, e quero ver.
- Ah, é?
-Sim, está indo agora para o mar, vamos ver como surfa, o Carlitos?
Correu para o mar com a sua pranchinha, como todos fazem – não entendo tanta correria, pois as ondas não irão embora, mas, são coisas de surfistas. Usava roupa de borracha agora, acentuando ainda mais sua semelhança com o personagem do cinema mudo, seu andar de pato, hilário, o balançar da cabeça; impressionante a similaridade!
Deitou-se sobre sua prancha na água e começou a remar com seus braços arcados em direção às ondas, que aumentavam, pois a arrebentação estava forte: seus estrondos abafados impressionavam.
Segui Carlitos, o apelidei assim, furando as ondas intrépido e destemido, como nos filmes, mas a situação não era cômica. Vi quando passou por onde as ondas quebravam, a arrebentação, no ponto de poder escolher qual delas desceria. Ele, um pequeno ponto negro na imensidão azul.
Aguardei-o descer uma onda. Ela veio enorme e gorda, perfeita e Carlitos a dominou com pericia e habilidade, mas seu estilo era bem peculiar, diferente, especial como o personagem que ele se assemelhava.
Acompanhei suas manobras, e Carlitos, o surfista, era muito bom. Valeu o espetáculo!
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