Contos Sertanejos - Amigos

Na comunidade em que meu avô morava, ele possuía muitos parentes e amigos, na verdade tudo mundo ali era amigo apesar de algumas exceções, por exemplo, havia algumas pessoas intrigadas, estas pessoas assim como meu avô guardavam em seu íntimo discussões e ódio de brigas de outrora. Mas, isso era resultado da época conflituosa em que viviam, algo que hoje existe muito brigas e rixa entre comunidades.

Havia uma enorme rixa entre as comunidades de Subaúma Mirim com a da Conceição, ambas as comunidades era repleta de “valentões” que andavam armados com armas ou facões, a segunda opção era o que mais havia, já que armas de fogo eram caras.

Meu avô “Bagaceira”, apelido que faz rir, mas que guarda uma enorme história por trás dele, sempre ia na casa de seu irmão mais velho – Loio – de preferência no pôr do sol.

Em uma destas visitas a casa de seu irmão, fui com ele. Loio tinha certas manias que meu avô as possuía também, por exemplo, ficava deitado no banco e dormia. Entretanto, no fim da tarde em que fomos, Loio estava sentando com seu barrigão que mais parecia de uma mulher grávida, ali você poderia dizer que havia pelo menos quatro crianças com mais ou menos umas quatrocentos gramas cada uma!

Quando chegamos, o chamamos do portão, pois o cachorro que ele tinha era muito bravo e estava solto, assim que nos viu, Loio cuidou de prender o cachorro na corrente em baixo da jaqueira.

Daí, abrimos o portão e entramos, Loio nos encontrou no meio do caminho e o saudamos:

- Boa tarde!

- Boa tarde! – respondeu Loio devagar e fadigando, pois o seu barrigão deixava-o cansado facilmente resultado de sua má alimentação.

Andamos até o banco e nos sentamos nele. Meu avô sentou junto de seu irmão no banco da esquerda, eu sentei sozinho no banco da direita.

Loio estava sozinho, sua mulher e suas filhas haviam saído mais cedo.

Dei uma saída dali e deixei-os conversando no banco, fui andando e andando quando me dei conta estava próximo de sua antiga casa que estava abandonada, continuei andando agora pela sua roça que era muito bonita, olhando aquelas paisagens, além do mais de seu sítio dava para ver boa parte da região.

Em um dado momento meu avô mim chamou.

- Ricardo?

- Oi!

- Venha cá.

- Já estou indo.

Assim que cheguei, ele perguntou.

- Quer café?

- Sim, quero.

Ali era outro vício que meu avô e seu irmão possuíam e que acabará de adquirir também. Como a garrafa térmica e os copos estavam na janela, mim servi e sentei no banco, fiquei degustando aquele cafezinho que por sinal estava ótimo.

Neste momento o sol dava seu adeus e seus últimos raios sumiam no horizonte. Percebi que Loio e meu avô estavam contando os causos deles do passado fiquei interessado nas histórias por eles relatadas. Aproximei deles para escutar melhor os causos, um desses me chamou a atenção, principalmente por ser cômico e surreal, mas o mais importante verídico.

O causo em que eles contavam eram lembranças de um passado marcado por intensas brigas na região. A fama dos valentões e seus facões.

Tal fama chegou aos ouvidos da polícia que daquele momento por diante passou a fazer ronda frequentemente na região.

Loio contava que um amigo dele, Bernardino havia dito que um policial valentão iria no domingo na região, e ainda que iria recolher todas as facas e facões. Todos os homens que andavam armados ficaram todos com medo.

Entretanto, meu avô não deu importância, sendo que Loio tinha dito a ele que se fosse sair no domingo que saísse sem faca.

Quando chegou o bendito domingo na venda de Matias na Conceição, não se tratava de outra coisa. Será que o policial vem hoje mesmo? Muitos estavam lá apenas por curiosidade, outros nem saíram de casa e os que saíram tiveram que sair desarmados, pois o medo de ser preso tomou conta de todos.

Contudo, quando o relógio na parede da casa do pai de meu avô tocou quatro horas, na época meu avô ainda era solteiro, tratou de se arrumar e desceu pela estrada a pé. Loio que já era casado foi visitar seu pai, ao chegar perguntou:

- Pai, cadê Neco?

- Ele desceu.

- Eu disse a ele que não saísse, pois a polícia vem hoje.

- E qual o problema, seu irmão fez algo errado?

- Não.

- Então!?

- Apenas disse a ele se caso fosse sair que saísse desarmado.

- Hum!

Meu avô chegou na venda, olhou para o pessoal e notou um certo medo. Aproximou do balcão pediu uma dose de Milone – bebida feita a base de ervas silvestre e cachaça – tomou num só gole e pediu agora uma garrafa Saborosa e continuou ali.

Lá fora se via um borrão no horizonte na tremedeira do calor era o policial montado em seu cavalo cinzento. Quando muitos o viram trataram de sair de fininho, outros ficaram para ver a atitude do policial.

Porém, meu avô continuou no recinto bebendo, tranquilamente. O policial vinha ainda lá longe disparado, já que o calor era demais, quando foi se aproximando tratou de diminuir o passo. Ao chegar na venda foi primeiramente no rio para seu cavalo beber água, logo em seguida retornou a venda, desceu de seu cavalo e o amarrou no cajueiro.

Depois disso, caminhou até a porta da venda e ficou um tempo ali parado observando o ambiente, todos ali presente olharam para ele apavorados.

Mas, fisicamente o policial se mostrara um rapaz de uns trinta e quatro anos, forte e simpático. Além disso, mostrou se bastante educado. Após aquele tempo parado na porta, tratou de entrar e cumprimentou a todos.

- Boa tarde, senhores!

- Boa tarde, todos responderam em coro.

Aquela aparência gentil do policial, agradou a todos inclusive ao meu avô. O policial se apresentou a todos:

- Meu nome é Sargento Castro e qualquer coisa que houver de errado pode procurar por mim que eu resolvo.

Chiquinho que estava de curioso na janela, logo respondeu ironicamente:

- Muito bom, agora não teremos mais brigas aqui.

- Com certeza, retrucou o Sargento Castro.

Meu avô escutará tudo em silêncio. O Sargento Castro aproximou de meu avô e perguntou o que ele estava bebendo, imediatamente meu avô respondeu com outra pergunta:

- O Sargento toma uma?

- Sim, mas só bebo catuaba – respondeu o sargento alegremente

- Matias traz uma dose para o sargento.

- Certo. Aqui sua dose sargento.

Naquele momento meu avô teve uma ideia daquelas, ficou no balcão com o sargento bebendo e conversando e o povo só olhando disfarçadamente, sendo que seu plano já estava em curso.

Depois de horas ali bebendo e conversando, o sargento apresentava-se completamente embriagado este era o plano de meu avô. Conversa vai e conversa vem o sargento dissera ao meu avô o real motivo de sua visita na região.

- Vim hoje aqui recolher os facões e as facas dos brigadores – disse o sargento eufórico.

Meu avô sarcasticamente retrucou:

- Rapaz, e não é que tenho aqui comigo uma faca.

Todos na venda ficaram espantados, principalmente quando meu avô retirou da bainha a faca e o amostrou. Mas, o mais impressionante foi quando meu avô disse:

- Tenho uma faca aqui comigo, mas você não vai levá-la.

O sargento risonho simplesmente, disse:

- Rapaz, guarde essa faca, você a usa como proteção?

- Sim, sargento.

- Então, está tudo certo.

A reação do sargento não foi à esperada pelas pessoas presentes na venda. Certamente, a reação do sargento foi decorrente da bebida.

Com o fim do dia, o policial despediu de todos e agradeceu ao meu avô pela bebida.

Montou em seu cavalo e retomou seu caminho de vinda. O pessoal chamou meu avô de maluco pela atitude dele, mas outros o acharam corajoso. Às nove horas da noite meu avô pagou sua bebida e a que tinha oferecido ao sargento e subiu para casa.

No dia seguinte, os boatos corriam na comunidade, quando Loio soube ficou espantado e foi falar com meu avô.

- Rapaz, você não é brincadeira.

- Por quê?

- Você embebedou o sargento e depois o provocou.

- Risos. Apenas ofereci uma bebida quis ser hospitaleiro.

- Hospitaleiro. Sei!

O sargento sempre retornava a comunidade para realizar seu trabalho. Mas, dali por diante ele e meu avô se tornaram amigos. Entretanto, as brigas sempre aconteciam principalmente, na festas ou nas vendas.

RicOliveira
Enviado por RicOliveira em 23/12/2020
Código do texto: T7142392
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