Vício
65
- Moto é pior que cachaça! Um vício danado! - diz-lhe um colega motoqueiro, em posto de combustível no qual parara com a sua para completar o tanque, naquele domingo de sol. Estava indo visitar sua mãe e irmã no interior do estado, de moto.
Sim, um vício "danado de bom" que ele tinha há mais de 50 anos!
Iniciou a viagem e a rememorar seus tempos de começo de motoqueiro, entre seus 14 a 15 anos de idade na época de escola.
- Vamos alugar uma 125 e andar a tarde toda? Você sabe andar de moto, né? - perguntara o amigo de classe da escola.
- Sim sei, claro! - mentira, ele! Nunca pilotara uma moto.
Pensou consigo que seria igual a andar de bicicleta, mas com motor, e como já dirigia carro, seria fácil pilotar a moto.
Não considerou que estaria com o amigo na garupa, mas foi assim mesmo a um novo desfio.
Pegaram a moto na locadora, o amigo pilotando, ele na garupa olhando tudo o que o outro fazia: acelerava com a mão direita - a do acelerador, apertava a alavanca com a esquerda - a da embreagem, trocava as marchas com o pé esquerdo e assim por diante.
Chega a sua hora: o amigo desce, ele monta, o amigo sobe na garupa.
Ele, nervoso e preocupado. Sentiu que com o peso do colega não seria fácil de controlar a direção.
- Vai, toca! - pressiona o garupa.
- Calma, deixa eu me acostumar com ela, nunca andei de 125, só "cinquentinha" e sem garupa! - já preparando desculpa caso ocorresse alguma "rata" no pilotar.
Sai aos trancos, anda, para, balançando a moto de um lado para o outro. Foi aumentando a velocidade e se equilibrando até ficarem sem fazer pêndulo com ela, estabilizando-a.
Soltou o ar pela boca, aliviado. Relaxou um pouco.
- Caramba, não sabia que você não tinha pilotado 125, podíamos ter alugado duas "cinquentinhas", seria até mais barato! - fala o amigo.
- Queria ver como era andar nela! - responde todo animado pelo desafio que estava vencendo, como o medo.
Naquela época não se usava capacete, nem era obrigatório . Não havia roupas, equipamentos de segurança, nada. Era na "raça" e risco.
Ia tudo muito bem na reta, até que uma curva apareceu em sua frente, e veio o medo. Começou a abrir muito a curva com a moto - a sorte que naquela avenida pouco trânsito havia, quase deserta.
Quase batendo na guia do lado oposto, pela insegurança e falta de domínio da "magrela" ainda, e com o peso morto atrás, pior!
- Olha, vamos bater na guia! - berra o da garupa em sua orelha.
Ele consegue controlar, acelera e sai da batida certa!
- Tava brincando, dando um susto pra você para de gritar na minha orelha!- responde ele rindo de nervoso, disfarçando sua barbeiragem.
O amigo ri também e seguem o passeio, ele pilotando melhor, com mais segurança e domínio, com a velocidade, com o estar livre, com o perigo, com o desafio. Apaixonou e ficou viciado em motos.
Alugava, toda semana, uma motocicleta com outro amigo que estudava de manhã na sua escola. O colega ficava com a moto pela manhã e ele à tarde. Era gêmeo de irmão que estudava com ele na mesma classe, à tarde. Soube depois por esse colega de classe, que o irmão motoqueiro morrera há poucos anos. Uma pena! Foi seu grande companheiro de início de motociclismo.
Chegava em casa à noite depois dos "passeios", olhos cheios de fuligem, pretos. Sua mãe o via e perguntava:
- O que é esse preto em seus olhos?
- ...tava jogando bola, mãe!
Um dia, estava com a moto subindo uma avenida principal e para no sinal de trânsito, à frente de todos os carros. Do outro lado, seu pai, mãe e irmã no carro, também na frente - exatamente em lados opostos, frente à frente. Seus pais e ele não se viram. A irmã, sim.
Veio ela depois lhe dizer sobre esse fato e se não achava perigoso andar de moto.
- Semana que vem venho aqui e vamos dar uma volta para você ver como é gostoso - disse para a irmã.
Então, como prometera, na semana seguinte enquanto vinha subindo a rua de sua casa - a irmã parada na entrada, do lado de fora, esperando-o. Então, vira da rua de cima, um "fusca: o da sua mãe. Ele a vê e acelera, a moto engasga e quase morre, mas consegue mantê-la andando e vira na rua da qual a mãe veio. Vai em disparada, fugindo dela. A irmã entra rapidamente dentro de casa, a mãe desconfia e não para o carro, faz meia volta e segue atrás dele. Queria confirmar, mas não o alcança.
Volta, entra em casa e fala com a filha:
- Era o seu irmão na moto, não era? Tenho certeza! Agora já sei por que chega da escola, alguns dias à noite, com os olhos sujos! Jogando bola é? É a moto! Sem vergonha! Está matando aula, andando sem carta e o perigo de acidente então! Vou falar com seu pai!
Acabou tendo que contar o que fazia, não dava mais para enganá-los.
Teve que ficar uns tempos sem alugar, até se habilitar, para voltar a andar de motocicleta.
Foi assim que aprendeu a pilotar e se viciou em motocicleta.
Concordou plenamente com o colega do posto: uma "cachaça" mesmo, que bebe até hoje e não vai largar não!
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