Papa Filas

25/11/2020

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A viagem seria de aproximadamente doze horas. Voltaria para a sua casa na praia em Santa Catarina, onde agora morava, cerca de oitocentos quilômetros distantes. Por causa da pandemia, preferiu ir de ônibus, mais barato e com menos gente, e de dia, pois não conseguia dormir nos bancos do veículo à noite. Curtiria a paisagem, leria o livro que lhe tomava a atenção, enfim, um longo passeio, pois pararia em cinco cidades antes do seu destino, motivo de tanto tempo para lá chegar. Um grande exercício de paciência.

Chegou cedo à rodoviária. Partiria perto das oito horas da manhã daquele dia ensolarado e quente. Poucas pessoas, não mais de dez, sentaram em seus devidos lugares, mesmo tendo mais de quarenta livres. Ele foi ao seu, geralmente nos fundos do veículo, onde normalmente poucas pessoas sentam. Acomodou as suas coisas na poltrona escolhida e sentou-se em banco na fileira ao lado da sua. Havia espaço de sobra.

No horário, partiu o carro com todos mudos. O som do ar condicionado ligado e do motor era o que se ouvia. Todos se preparavam para enfrentar as próximas horas com os seus pensamentos. Ele também.

Já na estrada observando a paisagem, que quando viajava de carro ou de moto pouco percebia, ia se descortinando através da ampla janela, lhe acalmando e voltando no tempo às suas recordações.

Lembrou-se menino de cinco, seis anos, indo de ônibus para o centro da cidade de São Paulo com a sua mãe, e estático ao ver parar no ponto um "Papa Filas", com o cavalo mecânico puxando o carro de passageiros separado, imponente e enorme aos seus pequenos e curiosos olhos, perguntando a ela:

-Mãe, por que esse nome de "Papa Filas"? Como ele é grande?

-Porque ele acaba com as filas das pessoas esperando nos pontos de ônibus!

-Ah, então ele engole as pessoas, por isso o nome "Papa".

-Sim, querido. Esse que parou não vai para o nosso destino. Vamos ter que esperar outro que não é "Papa Filas".

-Que pena, queria ser engolido por ele.

-Quem sabe na volta pegamos um.

-Ah, mãe seria bem legal!

Foi o que aconteceu para a sua alegria. Voltaram de "Papa Filas", ele maravilhado com o espaço e como o motorista conseguia conduzir aquela cobra enorme, virando a sua cabeça à frente do seu corpo reto nas curvas da cidade, ele acompanhando tudo o que ocorria atônito e alegre. Fora engolido pelo "Papa Filas" como queria!

Foi uma aventura inesquecível , que agora voltava à sua mente naquela viagem no tempo.

Depois, em casa, procurou saber mais sobre a sua recordação do "Papa Filas" na Wikipedia:

Originalmente, os primeiros papa-filas surgiram nos Estados Unidos durante a Segunda Guerra Mundial. Inicialmente transportava funcionários da General Motors (GM) e, mais tarde, até tropas.

Chegou ao Brasil na segunda metade da década de 1950 para servir como alternativa ao transporte coletivo nas grandes cidades, já que os ônibus não conseguiam suprir a alta demanda de passageiros. Em algumas linhas, os ônibus disponíveis não eram suficientes devido à dimensão reduzida, fazendo com que buscassem por veículos maiores e mais pesados. Além disso, a ideia era também substituir os defasados bondes, meio de transporte ainda usado até então. São considerados os "avôs" dos ônibus articulados.

A empresa paulista Companhia Municipal de Transportes Coletivos (CMTC), que costumava inovar e apostava em soluções para o transporte, adquiriu cerca de 50 unidades para circular na capital paulista. Cerca de mais algumas dezenas de unidades foram adquiridas por empresas do Rio de Janeiro e Porto Alegre, entre outras cidades.

Ao longo dos poucos anos que esteve operando, os papa-filas mostraram suas dificuldades dentro das cidades, não funcionando como esperado. Eram absurdamente lentos, pesados, desconfortáveis e barulhentos. Foram tirados de circulação ainda na década de 1960, porém, em algumas cidades circularam até a década de 1970.

Bons tempos do "Papa Filas"!

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Fernando Ceravolo
Enviado por Fernando Ceravolo em 25/11/2020
Reeditado em 30/01/2021
Código do texto: T7120486
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