Tia Lola e o piquenique

Tia Lola é daquelas mulheres super vaidosas. Adora uma maquiagem. Vive no salto alto. E as sobrancelhas são pinçadas com esmero pela designer que tornou-se uma amiga. Mas tia Lola é incrível, tem um bom coração e é amada pela família. Está sempre pronta a ajudar a quem precisa. Mas a danada da vaidade tem deixado ela em situações delicadas.

Um dia teve a ideia de fazer um piquenique em família. Todo mundo se animou. Ao todo eram doze pessoas. O marido se prontificou a levar todo mundo no seu veículo tamanho família. E quem pensa que ela se contentou com uma cesta de vime está enganado. Ela gosta de fartura. Ficou dois dias envolvida com os preparativos do piquenique. Como boa mineira não se esqueceu da farta bacia de pão-de-queijo. Lembrou também do queijo com doce de leite. Pensou e concluiu que só um queijo seria pouco, levaria três. E mais o bolo de chocolate que o marido amava, a broa de fubá que a sobrinha Maria Flor adorava e o doce de abóbora cristalizado que o filho Quinzinho apreciava como ninguém. E assim foi fazendo um prato da preferência de cada um dos doze. E ainda aceitou os pratos que cada uma das quatro irmãs levariam. E olha que todos eram farturentas como tia Lola.

No dia do piquenique apareceu todo mundo na casa dela. Vestiam-se com praticidade, para um dia no campo, próximo a cachoeira. No entanto, a filha não se conteve no comentário quando viu a mãe pronta para partir para o piquenique.

– Mãe, você vai assim?

– Assim como Maria Eduarda?

– Nesses trajes. Vamos para um piquenique e não para uma festa de casamento.

Mas tia Lola arqueou uma sobrancelha, que era sinal de que não queria ser contrariada. E todo mundo sabia desse seu hábito. Aí não se falava mais nada. No entanto, entrou pela porta a sobrinha Maria Flor. Ao se deparar com tia Lola se espantou e olhou a de cima abaixo. E exclamou:

– Tia Lola, mas a sinhora ainda não tá pronta.

– Você também vem palpitar na minha vestimenta.

– Ora, uai, eu nunca vi arguém ir a um piquenique de sarto arto.

– Pois está vendo agora.

– Mas está chique por demais para o piquenique.

– Ora, vamos indo, seu tio já está buzinando.

Lá fora o espanto foi geral. Mas ninguém mais deu uma palavra. Partiram e a alegria era geral.

Durante o primeiro terço do caminho tudo foi muito bem, até que o carro parou.

– Parou porquê Alcebíades ?

– Eu acho que o carro enguiçou!

– Não é possível. Eu não acredito. Faça alguma coisa Alcebíades.

Nisso, todo mundo foi saindo do carro. Os homens foram ver o que ocorreu.. E logo constataram que era a bateria.

– E agora ? Perguntou tia Lola apavorada.

– Por aqui não passa quase ninguém. – Comentou o compadre Chico Zangão.

– O jeito é subir a serra a pé. – Conclui o primo Eustáquio.

– A pé? Falou num tom estridente tia Lola.

Nesse momento todo mundo deu com os olhos nos pés de tia Lola. Mas essa que não dava o braço a torcer, disse que faria o caminho tranquilamente.

Cada um foi retirando do veículo o que levariam para o piquenique. Tia Lola foi poupada, levava apenas sua bolsa com seus apetrechos. Foi andando, sorrindo, elogiando a beleza da natureza, e aos poucos foi sentindo a dificuldade da caminhada. De vez em quando o salto teimava em engastalhar em uma pedra, ou buraco no caminho, mas ela mantinha sua altivez. Com o tempo todo mundo ia lá na frente e ela já ia ficando bem atrás. Até que gritou Alcebíades e pediu um pouco de água.

O marido perguntou a Chico Zangão, que perguntou a primo Eustáquio, que indagou Tônico que negou que tinha pego o galão de água. Mais essa agora, teria que prosseguir sem água.

Não andou nem cem metros e parou para se sentar. Ficara para trás, mas nem ligava. Sabia o caminho e se demorasse mais um pouco não tinha importância.

Mas lá se foram todos. Depois de descansar tia Lola resolveu continuar, mas sem os sapatos, é claro, não havia ninguém para vê-la descalça. É certo que os pedregulhos machucavam seus sensíveis pés, mas era muito melhor do que andar de salto.

Andou, olhou ao redor e não reconheceu o lugar. Qual trilha seguir ? Não sabia. Era tudo tão parecido. Enfim escolheu uma trilha e foi caminhando. A mata foi ficando fechada e feixes de árvores foram arranhando seus braços e pernas. Voltou. Olhou para o chão na esperança de ver pegadas. Que nada. Como fizeram isso com ela. A deixaram para trás. Ah Alcebíades, quando o visse lhe diria poucas e boas.

Talvez fosse melhor voltar para o carro e esperar. Mas onde o carro ficara mesmo? Não se lembrava. Notou que o tempo estava mudando. Pra Chuva. E agora? Ficou nervosa. Se encharcasse perderia o penteado que fizera no salão no dia anterior. Sentiu uns respingos na testa. Olhou para o céu e constatou que viria muita chuva. Será que encontraria um abrigo, pelo menos. Gostaria que fosse como nos filmes de aventura. Encontrar uma gruta onde pudesse se esconder. Mas sem nenhuma surpresa desagradável, é claro, como por exemplo um animal feroz.

E assim foi, a chuva caiu torrencialmente, e ela ali toda encharcada. Começou a descer de um barraco, escorregou, tentou se agarrar a um galho de árvore, mas em vão, foi ao chão caindo em cheio na lama. Levantou-se e sentiu que estava bem, até notar que a unha de porcelana havia se quebrado, aí não teve jeito chorou copiosamente lamentando a unha quebrada.

Finalmente, uma hora depois a família a encontrou. A princípio não a reconheceram. Mas depois quando ela pronunciou o nome de Alcebíades todo mundo ficou feliz por tê-la encontrado. E o melhor, a chuva passou e um lindo sol surgiu. Mas o piquenique, ela não quis mais saber, pelo menos naquele dia. Quis ir pra casa e se embelezar toda.