“MORREU?”

11.04.2018

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Veio ela com seu jeito desengonçado e pesado subindo a escada de acesso ao andar superior do restaurante. Parou no último patamar ou piso do andar e ficou olhando em qual local iria sentar-se. Era uma mulher grande, muito!

Ele a viu. Estava sentado de frente para ela em mesa distante alguns metros da escada e ficou preocupado, pois ela olhava fixamente em sua direção - "Vai sentar bem atrás de mim!"- pensou ele.

Sua esposa, sentada bem à sua frente e de costas para a mulher grande, contava animada e alegre uma história. Ele a ouvia, mas com atenção desviada em virtude da possível situação que imaginava pudesse vir a acontecer. Observava atento a "big senhora" ali ao pé da escada, esperava seus próximos movimentos. A vigiava.

Estavam em local tradicional na cidade, de comida típica italiana, tendo como especialidade o Polpetone, espécie de filé à parmegiana recheado com mozarela. Muito bom! As mesas e cadeiras eram muito juntas no salão, de madeira muito pesada, tornavam o espaço bem apertado.

-... então a moça o convidou para dar um passeio a cavalo, estavam em hotel fazenda, se conhecendo, se paquerando... - seguia ela.

- Ahã-ahã - respondia ele focado na senhora em sua frente.

Então ela movimentou-se, lenta e "mastodonticamente", começando a caminhar pelo corredor de mesas em sua direção, sorrindo por já ter definido o local no qual sentaria. Ele gelou. "Ela vai vir e sentar bem atrás de mim, certeza!", pensava consigo sem tirar os olhos dela.

Vinha enorme e balouçante como se estivesse em um navio, de um lado para outro, encostando-se às mesas, roliça e em camadas definidas de gordura que se pronunciavam pelos vínculos grudados no vestido. Viu atrás dela o marido, presumia , muito magro e conformado, caminhando no mesmo ritmo dela, de cabeça baixa.

Sua esposa seguia contando a história, ele perplexo e agoniado aguardando a determinação do lugar em que sentaria a mulher enorme. Ela caminhando devagar e sorrindo: era a cena que se desenrolava ali. Cômica!

Chega a grande senhora ao seu lado, sorri em cumprimento, assim como seu marido e segue em frente indo sentar-se em mesa aos fundos da sala e não atrás dele como imaginava. Suspirou aliviado.

"Ótimo, que bom que ela foi sentar-se longe" - exultou para si.

Então escutou: "-... ele caiu do cavalo e MORREU!" - a voz da esposa crescendo em seus ouvidos.

"- Quem MORREU?" - perguntou ele espantado e de chofre para a esposa.

A esposa desata a rir muito pela cara de surpresa que fez, pois dissera-lhe isso para que voltasse a se interessar pela sua história.

Ele ficou bem sem graça, pedindo desculpas. E explicou o porquê de sua saída do ar: culpa da senhora roliça, ou melhor, muito grande que tinha passado pela mesa deles e lhe tirado a atenção até aquele momento.

Chega o Polpetone fumegante e cheiroso e começam o jantar.

Ele agora muito tranquilo e relaxado seria todo "olhos e ouvidos" para a esposa!

Desde essa data, quando alguém fica desconcentrado durante alguma conversa sua, ele fala : "........e MORREU!", para trazer o interlocutor de volta ao diálogo. Funciona muito bem!

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Fernando Ceravolo
Enviado por Fernando Ceravolo em 05/11/2020
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