“Ombrelone”

30/10/2020

291 - SCRGR

Fui com a minha esposa ao fisioterapeuta em uma manhã, para cuidar de problema no seu pulso. Estávamos em Porto Alegre visitando a sua filha e neta, aproveitando ela para fazer esse tratamento em dez sessões.

O local era em um prédio moderno junto a um casarão bonito, antigo, restaurado e tombado, no mesmo terreno.

Aguardei sentado em um banco na entrada do prédio, com o casarão atrás. Um segurança orientava às pessoas ao entrarem no edifício, das medidas de higiene a serem feitas, pela persistência pandêmica que enfrentamos, e que agora recrudescia.

Moreno alto, falante como todo gaúcho, cumprimentava a todos. Simpático e alegre, chamando minha atenção também.

Levantei e fui ver mais de perto a casa restaurada e tombada, pois foi preservada pela incorporação do prédio no terreno. Seu estilo era do inicio do século passado, com seus arabescos, capitéis e colunatas bem trabalhadas, janelões e portas em madeira entalhada, trabalhos que hoje seriam difíceis de fazer, pela mão de obra especializada e requintada exigida. Foram executados, na sua maioria, por mestres portugueses, espanhóis e italianos, que vieram para construir essas belas casas e suas decorações em nosso país, para os ricos naquela época.

Voltei ao banco e perguntei ao segurança:

-Bom dia, tudo bem? Sabe quantos anos tem o casarão?

-"Bah, deve ter muitos anos tchê!" - respondeu com seu sotaque gaúcho característico. Seguiu falando:

-Foi construída por uma família de fazendeiros ricos da campanha, das bandas de Bagé, né. Sou de lá também, e meu apelido é Bagé por isso, né.

-Interessante.

-Mas meu nome é Asdrúbal, né! Sabia que é grega a sua origem? - continuou a conversa, entre um bom dia senhor, ou até logo senhora, para as pessoas que iam e vinham ao prédio.

-Ah, não sabia não! Grego é? Curioso, procurei depois a origem do seu nome, mas é cartaginês, e o nome do filho do lendário general Aníbal de Cartago.

Seguimos o nosso falatório alegre e interessante, ele me contando seus casos, problemas, sempre com bom humor e simpatia. Estávamos de mascaras, impedindo de ver nossos sorrisos e expressões. Uma pena.

Em dado momento, perguntou:

-O vento parou, né? Não chove hoje então.

-Caíram uns pingos há pouco. - respondo.

Ele entrou no prédio, e minutos depois, veio com um "ombrelone" - aquele guarda sol grande e bacana, instalando ao meu lado, demonstrando muita atenção e gentileza.

-Ah, um ombrelone! - digo.

-"Pois é tchê. Mas que "palavrita" foram dar para esse guarda sol besta, né. Barbaridade".

-Sim, coisa de bacana, não é? - completo.

-"Tchê, um dia estava embaixo dele e minha supervisora me viu pela câmera ali e perguntou pelo rádio: o pessoal esta gostando do ombrelone? Me quebrou as patas, tchê, o que era ombrelone? Não perdi a pose e respondi: Tudo tranquilo, né!".

Comecei a rir, imaginando a cena que iria ser engraçada. Ele continuou com a historia:

-"Bueno, como não sou grosso, né, fui ali escondido da câmera de segurança para ela não me ver, né, e vi no celular pelo Google o que era ombrelone. Achei e voltei embaixo dele, né"

Ria eu francamente, ele não parava de falar animado pelo meu sorriso:

-"Pois é tchê! Respondi então para a guria com vontade, né: Estão gostando sim do guarda sol aqui, abrigando do sol e da chuva! Se não fosse a tecnologia, estaria frito, né tchê. Santo Google, mas bah!"

Gargalhei gostosamente da sua interpretação, com seus jeitos e trejeitos e claro, pela entonação e sotaque gaúcho, realçando ainda mais o acontecido.

Ficamos amigos e prometi lhe enviar o texto. O cotidiano nos mostrando seu lado inusitado e interessante. Mas bah tchê, né!

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Fernando Ceravolo
Enviado por Fernando Ceravolo em 30/10/2020
Reeditado em 30/10/2020
Código do texto: T7099890
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