“China”

27/10/2020

290 - SCRGR

Passeava com o meu filho mais velho, com mais de trinta anos, e a sua cadela pelas ruas do bairro de Higienópolis em São Paulo. Não tínhamos tomado o nosso café da manhã ainda. Vieram as lembranças da época em que estudei em colégio ali instalado até hoje na avenida, quando passamos em frente. Fui rememorando alguns casos, contando-lhe. Historias com mais de 50 anos!

Assim, estudei por mais de 13 anos neste estabelecimento, desde o ensino fundamental, primário na época, até o médio, ou cientifico.

Uma das situações inesquecíveis aconteceu no ginásio. Tinha um amigo que morava perto da minha casa e íamos e voltávamos quase sempre juntos de ônibus, que pegávamos na Avenida Angélica, em ponto há quinhentos metros da escola.

Saíamos às 17 horas, final das aulas. Caminhávamos para o ponto de ônibus, muitas vezes com mais amigos, alguns pegavam o mesmo; outros, noutras direções. Uma jornada de alegria e brincadeiras, às vezes algumas colegas se juntavam ao grupo, com aquela "paquera" natural e espontânea entre nós. E comentários surgiam: "ela tá a fim de você, hein, vi como te olhou!".

-Vamos à pastelaria do "China"? Hoje deu vontade de comer aquele pastel bem quentinho de queijo. Topa? - perguntei ao meu amigo aguardando o veículo.

-Sim, vamos sim. "To" com fome também.

Pegamos o ônibus com destino ao Largo de Pinheiros, um Mercedes-Benz antigo, entrada pela porta de trás e descida pela da frente. Percorria toda a Avenida Angélica, entrava na Doutor Arnaldo e depois descia a Teodoro Sampaio até o Largo dos Pinheiros. O trajeto da linha, que fazíamos quase diariamente.

Às vezes, íamos comer "xis salada" ou "tuna fish" no Shopping Center Três na Avenida Paulista. Depois, pegávamos o elétrico que descia a Rua Augusta. Era bom também esse programa, mas naquela tarde estávamos com vontade dos pastéis do "China".

Ficava a pastelaria no Largo dos Pinheiros em uma garagem estreita e cumprida, com toda a sua família trabalhando. Os pastéis eram enormes e com generoso recheio, mas tinham mais massa, claro. Para nós, era o "mata-fome" que interessava, quanto maior melhor. E a garapa com suco de limão, para acompanhar. Delicioso o nosso lanche da tarde.

-Vou comer dois de queijo. E você? - pedi ao "China", sentando-me em um banco do balcão. Não havia mesas.

-Eu vou de carne, dois também! - pediu meu amigo.

-Olha, dizem que a carne é de gato, hein! - brinquei com ele.

O "China" escutou e respondeu de imediato:

-"Non, non gato, de cacholo!" - rindo daquele jeito chinês de rir da sua brincadeira.

-Vem latindo o seu pastel! Vai pegar raiva. - completei a gozação. Rimos os três.

Vieram rapidamente e os devoramos com sofreguidão e gula, pedindo cada um mais um, pois a fome ainda não fora aplacada. Os adolescentes são insaciáveis.

-Caramba pai, vocês comeram três pastéis antes do jantar? - comentou o meu filho espantado.

-Sim! Como você e seu irmão, que comeram mais de vinte pedaços de pizza em rodizio, está lembrado?

-Vinte e sete eu comi! Bati o recorde do restaurante e passei mal.

-Ehehehe... Sempre guloso!

-Pai, me deu fome essa historia, vamos logo tomar o nosso café da manhã na "padoca"!

-Sim, vamos. Vou pedir pastel de queijo tá. Mas pena que não é do "China". Bons tempos aqueles...

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Fernando Ceravolo
Enviado por Fernando Ceravolo em 28/10/2020
Reeditado em 01/11/2020
Código do texto: T7098068
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