O noivado
Combinaram que ele pediria a sua mão em casamento na noite seguinte. Era o ano de 1952. Haviam se conhecido numa festa de amigos em comum. Ele a viu entre dezenas de outras beldades. Ela era a mais linda de todas. Pediu a um amigo para que os apresentassem. A partir daí passaram muito tempo conversando. Ele ficou surpreso ao saber que moravam bem próximos, e nunca terem se visto, ou quem sabe ele nunca prestara atenção nela. Mas sentiu que conhecera sua outra metade.
Ao longo de onze meses namoraram. E finalmente haviam se decidido que contrairiam núpcias.
Ele recebera uma promoção no emprego. Ela estava com o enxoval praticamente pronto. Alugariam uma bela casa de alpendre no mesmo bairro em que moravam.
A moça avisou aos pais que ficaria noiva na noite seguinte, ele pediria sua mão em casamento. Os pais a felicitaram e fizeram questão de servir um caprichado jantar.
No dia seguinte ela passou o tempo entre a cozinha, ajudando a mãe nos preparativos, e na janela de onde espreitava o movimento na esperança de vê-lo passar para o almoço. Nesse dia ele não fora almoçar em casa. Ela imaginou que algo importante o prendera no serviço. Depois do almoço ela foi ao salão de beleza. Queria ficar linda para o pedido de casamento. O vestido novo estava esticado sobre a cama para não amarrotar. Uma hora antes do combinado já estava pronta para o jantar. A todo momento ia a janela da sala. O pai pediu que ela tivesse calma, o noivo não fugiria.
Finalmente e pontualmente o noivo chegou. Foi recebido com deferência pelos pais da moça. Tomaram um bom licor. Logo depois o jantar foi servido. E o rapaz não economizou nos elogios.
Foram para a sala de visitas onde tomariam o café.
Não podemos nos descuidar da descrição do vestuário do noivo. Vestira um terno azul-escuro de tweed. As calças um pouco mais curtas deixavam a mostra as meias que tinha uma estampa geométrica, mas bem discreta que combinavam com o tom da calça. A gravata de um nó mais fino do que a década anterior fora presa com uma presilha que a deixava impecavelmente no lugar. O chápeu de feltro, novo por sinal, descansava no porta-chapéu rente a porta de entrada.
O rapaz está sentado ao lado da amada que espera ansiosa pelo pedido. Os pais da moça também já demonstravam uma certa inquietação. Mas o noivo era o mais desassossegado de todos. Tomado de nervosismo, a todo momento ajeitava o nó da gravata, e incontáveis vezes puxava a meia para cima. E o pedido não saia. Foi quando ele a pretexto de tomar um ar chegou a janela. Parou alguns instantes e observou curioso para fora esquecendo-se de que os donos da casa o esperavam para oficializar o pedido.
O que viu do lado de fora era mais interessante do que via do lado de dentro. Viu uma linda moça chegando em um carro maravilhoso. Ela estacionou o carro de frente a casa vizinha e num estalo ele virou-se para os anfitriões e disse que teria que ir, voltaria na noite seguinte, um compromisso de trabalho que havia se lembrado, era algo inadiável. A moça sentiu cravado os olhos dos pais em si, e com a saída desse ela explicou que não entendera nada. Mas que ele prometera voltar na noite seguinte para pedi-la em casamento.
Mas ele não voltou e vivia dizendo que qualquer noite iria a casa dela. Numa noite enluarada em que a moça estava a janela suspirando e admirando a lua, ela o viu, quando surgiu na esquina com um lindo ramalhete de rosas. Ficou feliz e gritou os pais para que se aprumassem porquê o rapaz chegava finalmente para pedi-la em casamento. A mãe reclamou que ele não avisara nada e estava em desalinho. O pai disse que eram conveniências e que era melhor aceitar o pedido logo. A moça estava tão feliz que acenou para ele. E ele acenou de volta. Mas não trazia nenhum sorriso no rosto. Foi quando ela viu que ele entrou na casa ao lado.
Sem entender a situação, a moça saiu até a calçada para ter certeza que vira direito o moço entrando na casa ao lado. Verificou que a casa estava toda iluminada. Perguntou então a uma outra vizinha se era dia de festa. E ela contou que sim era o noivado da bela moça com o rapaz que acabara de entrar com o ramalhete de flores.
O desaforo foi grande, ela passou muito tempo de rosto virado para ambos. Foi convidada para o casamento, a princípio achou uma afronta mas depois resolveu ir o mais bela possível. Acompanhada de uma amiga fez questão de se sentar no banco da frente. E durante a cerimônia ela não derramou nenhuma lágrima. Ao saírem, os noivos receberam uma chuva de arroz. E entraram no carro, o mesmo que o noivo admirara naquela noite da janela da casa dela. Enfim, uma chuva torrencial caiu e ela e sua amiga precisavam de um carro de aluguel. Mas não viram nenhum em vista. Até que um homem elegantemente vestido ofereceu o guarda-chuva para que elas pudessem ir até a praça onde pegariam um carro de aluguel. Sem nenhuma opção, aceitaram e pediu que ele fosse a sua casa no dia seguinte buscar o guarda-chuva. Ele foi naquele dia, e também em outros dias, até que se descobriram apaixonados. Ficaram noivos e se casaram com toda pompa. O antigo noivo e a esposa foram convidados, mas não compareceram. Enviaram um telegrama.