“Só se vive uma vez!”
13/10/2020
276 - SCRGR.
Viajaram para o sul do país em um fusca, no verão dos anos 70. Eram quatro adolescentes e universitários, sendo um casal de namorados e dois amigos. O carro era de um dos amigos. Iriam acampando, principalmente nas praias. Uma grande aventura a eles se apresentava.
Pegaram a estrada em pista única e perigosa, apelidada na época de "Estrada da Morte", pois ocorriam muitos acidentes fatais. Tinha ela uma característica singular: uma pista central em alguns trechos, como uma terceira faixa, para fazer as ultrapassagens nos dois sentidos, o que aumentava enormemente o risco de acidentes e que aconteciam, pois os caminhões dominavam soberanos essa pista. Mas, jovens e sem qualquer preocupação que não fosse a diversão e aproveitarem os novos lugares a conhecer, seguiram despreocupados e alegres no frágil carrinho lotado.
O casal tinha uma quantia única para os dois, que montava talvez o da de um dos amigos. Ou seja, o dinheiro era pouco. Fizeram logo no inicio da viagem, um "caixinha" estimando um valor para toda ela para os custos comuns, como combustível, entre outros, dando cada qual a parcela que lhes cabia do numero previsto ao dono do fusca, ficando a gestão sob a sua responsabilidade, o que deixava o casal mais tranquilo e despreocupado.
Acamparam em locais interessantíssimos e novos, não conheciam a região, em terrenos junto às casas, em praias de dunas, junto ao mar e vários outros pontos incríveis e inesperados.
Os moradores que encontravam eram muito hospitaleiros e conversadores, os ajudando de varias formas, como lhes dando agua e até o uso do banheiro e banhos em chuveiros externos às suas casas.
A região ainda não era desenvolvida, mas muito tranquila e bucólica, com suas casinhas de madeira junto à areia das praias e ruas de chão batido. Lugares lindos e ainda selvagens.
Durante todo o trajeto, sofreram com o calor daquele verão tórrido, pois o fusca não tinha ar condicionado claro. E, extremamente apertado para eles, ainda mais no banco traseiro aonde ia o casal, junto de sacos de dormir, mochilas e outros trecos amontoados na caixa atrás do banco. Mas, tudo era festa. Para o casal, que a cada dia se "empobrecia", a viagem seguia sem qualquer preocupação. Quando se é jovem, nada é problema, vive-se o dia a dia... A beleza inconsequente da adolescência!
Foram até o Rio Grande do Sul e acamparam em um camping em Caxias do Sul. Era em um lugar alto, com vista das montanhas e com um lago rodeado de araucárias - lindo e tranquilo o local.
Conheceram lá a churrascaria, onde dizem, surgiu o espeto corrido ou rodízio de carnes. Comeram a se fartarem; e barato, para a alegria maior do casal pobretão.
Durante a refeição, comentou o dono do carro:
-Esta na hora de voltarmos, não? Faz quase trinta dias que estamos viajando e nossas aulas devem começar daqui a uma semana, certo!
-Pois é, está na hora mesmo. Voltar para a nossa casa, para a nossa cama, o nosso banho. Já deu para mim! - completou o outro amigo.
O casal sorriu concordando. Tinham tomado uma caipirinha durante a refeição e se entreolharam alegres pelo álcool ingerido.
-Então, fechado? Amanhã começamos a nossa volta? - reafirmou o dono do fusca.
-Fechado! - assentiu o outro amigo.
O casal demora um pouco e a namorada respondeu:
-Sim, claro vamos sim, pois o nosso dinheiro acaba hoje! - completou de chofre.
-Como, já acabou a sua grana? -perguntou o dono do fusca.
-Vamos então tomar a ultima caipirinha em comemoração a nossa viagem com o resto do dinheiro que temos, certo? - ela olhando e sorrindo para o namorado, que lhe retribuiu consentindo e completando:
-O caixinha tem dinheiro suficiente para voltarmos, não é? Então, vamos comemorar a nossa viagem!
Os dois amigos ficaram sérios, não gostando do que o casal iria fazer. O dono do carro ponderou:
-Acho que deveriam guardar essa grana para o resto da viagem!
-Guardar? O dinheiro só dá para a caipirinha e nada mais, acabou! E ferrado e meio, ferrado inteiro! - respondeu o namorado enfático e direto.
-Melhor tomar a ultima caipirinha agora. Só se vive uma vez! - completou efusiva.
O namorado chamou o garçom, pedindo-lhe a ultima caipirinha para comemorarem o fim da viagem, que degustaram gole a gole como se fosse a ultima das suas vidas, com os dois amigos observando-os inconformados.
Só se vive uma vez, é fato. Adoro os jovens adolescentes!
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