(Ele se sentou comigo num banco de praça...)
 
Poucas semanas antes, fazia frio, havia uma tempestade, muita chuva mesmo, quando cheguei ao trabalho deixei o guarda chuva próximo a entrada e segui em direção a mesa que ocupo.
Pompeu, ao me avistar pediu a um auxiliar que me avisasse de uma reunião com ele, poucos minutos antes do almoço. Sinceramente, estranhei... Pompeu sempre marca comigo à tardinha, quando normalmente, saíamos para tomar uns chopps no happy hour. 
Sou um cara deveras persistente, tenho 62 anos, mas insisto em trabalhar. Toda minha vida fui vendedor:  Automóveis, imóveis, seguros e por fim, mercado financeiro, onde estão os lobos... Mas, agora me tornei um mero dinossauro. Não tenho a ligeireza em pegar um carro importado e fechar um contrato num almoço com um investidor a 140 km de distância, saindo apenas duas horas antes.  Chegaria por certo, no meio da tarde. Já os meninos, recém-formados e impetuosos, não. Vão sorrindo e ainda chegam alguns minutos antes. Quanto a Pompeu, por certo também não conseguiria. Bem apessoado e falante, acabou por se casar com a filha única do dono da companhia. Mas, tudo bem, o mérito é dele.  Dissimulado como ele só, acabou conseguindo um meio mais fácil de subir, não tendo que ralar diariamente atrás de clientes, nem sempre fáceis de convencer.
Finalmente, adentro a sala de Pompeu. Sem muita cerimônia me diz:
- Heitor, você sabe porque está aqui, não sabe?
- Não, sinceramente não.
- Tenho que demiti-lo. Ordem do velho, 92 anos, mas é quem ainda manda na companhia. Passe no Departamento Pessoal, há uma boa grana te esperando e tome mais esse bônus aqui pelos bons tempos que atravessamos juntos.
Pude notar que era uma maleta tipo viajante repleta de dólares. Há muito já desconfiava dos atitudes ilílicitas dentro da empresa, daquele que um dia, pra mim foi exemplo.
- Pompeu, não necessito desse tipo de reconhecimento, obrigado. Estou indo ao DP pegar minhas contas por direito.
- Heitor, Heitor, espera aí rapaz...
Ninguém dá uma quantia de presente assim, se ele está roubando, problema dele, eu não fecho com esse modo de agir. Prefiro sair levando somente o que me cabe.
Duas semanas depois o telefone toca, é Pompeu.
- Porra Heitor, estava em algum retiro? O velho morreu, sou o dono de tudo, estou te readmitindo.
- Obrigado, Pompeu. Mas, não vou voltar.
- Porra Heitor, tá magoado comigo? Precisamos de você!
- Acho que não.
Após falar, bate o telefone.
 À tarde Heitor senta-se num banco próximo a sua casa, observa senhores jogando algum tipo de carteado, numa mesa próxima. Quando um deles levanta-se e anda em sua direção.
- Boa noite, Heitor!
- Você não me é estranho, mas creio que não o conheço. Como sabe meu nome?
- Bem, isso agora não é o mais importante. Acho que deveria ir à casa de seu amigo, alguém pode precisar de você, apresse-se uma densa chuva ameaça cair.
Ao ouvir aquelas palavras entrei numa espécie de transe e segui com meu carro em direção à residência de Pompeu. Ao chegar ouvi gritos, pareciam de Marisa, sua esposa. Ele a sufocava com um travesseiro na sala de estar. Saí do carro e gritei para que parasse, ele apontou uma arma e atirou ferindo-me no abdômen, cai no chão molhado de sua varanda. Entretanto, com o som alto do disparo, Marisa consegue se desvencilhar dos braços de Pompeu, agarra um abajur de bronze e bate com o mesmo em sua cabeça, fazendo com que ele desfaleça. Alguns dias depois, num dia ensolarado, recebo no hospital a visita de Marisa. Ela traz flores, fala bem pouco e rapidamente se retira. Dentre as flores, um cartão com os seguintes dizeres: Pompeu deixou a Companhia e encontra-se preso. Seja bem-vindo em seu retorno ao trabalho, caro presidente.

Niterói, 14.10.20
Revisão: JABS