A birra de Tavinho

Tavinho era um menino birrento. No auge dos seus cinco anos e meio, não deixava barato e quando queria alguma coisa, fazia manha, bico, jogava objetos no ar ou no chão, era comum , a mãe de Tavinho, Vanda, pegar objetos jogados a torto e a direito. Um dia, quando fez birra porque sua mães não lhe deu leite com chocolate, pois era quase hora do almoço, Tavinho pegou a caneca e tascou na direção da irmãzinha que estava no caldeirão, esperando a papinha. Por pouco não a feriu, sorte foi que a mira do guri estava descalibrada.

Quando queria algo e não tinha como obter, ele se jogava no chão, chorava, berrava e Vanda se descabelava para apaziguar os ânimos do menino. Arrastava o filho pela mão e tentava com sua paciência de Jó, fazer o garoto entender o por quê do não; quase sempre fracassava.

Um certo dia ,Vanda teve que ir levar umas roupas para lavanderia, eram cobertores e cortinas, e pôs tudo no carro. Ajeitou a cadeirinha da caçula, e o banco com assento levantado de Tavinho. Tudo pronto, lá se dirigiram para a lavanderia. Numa rua movimentada, fez uma curva após o semáforo abrir, e ao tomar uma alameda a frente viu um cachorrinho no meio fio. Parecia machucado. Ela parou o carro um pouco a frente e, disse para Tavinho, olhar a irmãzinha. Chegou próximo ao cãozinho e viu que o mesmo gania de dor, havia sido atropelado, e tinha duas patinhas feridas, não parecia ossos expostos, mas havia sido um atropelamento com certeza. Comovida com o cãozinho granindo, ela voltou correndo até carro, pegou o celular, e fez uma ligação. Tinha uma conhecida que sabia como lidar com casos assim, ela não teria como colocar o pobre cachorro, com as crianças no carro.

Depois de explicar a situação e dar a localização, tentou amenizar a dor do cachorrinho. Abaixou-se, tentou fazer carinho, e conversou com ele, como se fosse gente. Ele, claro, assustado, gania e se contorcia. O socorro logo chegaria, dizia ela a ele, como se o mesmo compreendesse.

Voltou ao carro e disse para Tavinho o que se passava, sobre o cãozinho machucado, ele mostrou interesse e quis ver. Olhou para a filha que adormecia na cadeirinha. Desatou o cinto de Tavinho e mostrou a ele o cachorro deitado ali próximo ao carro, e explicou que estava ferido. Tavinho não quis olhar muito e se encostou na mãe, deixando a atenção flutuar para outros cantos, ela fez com que o mesmo a acompanhasse na sentinela ali na calçada. Passavam algumas pessoas e olhavam o cachorro ferido, uns perguntaram se ela tinha chamado alguém, outros faziam cara de dó, e seguiam. Teve uma senhora que achou que ela tinha atropelado o animalzinho, mas depois das explicações, foi logo se desculpando e seguiu a calçada. Tavinho nem mais olhava, sua atenção era agora para coisas em movimento.

Nisto, do outro lado, passa um carro de festas com alguns balões coloridos em cima, que eram a propaganda da empresa. Tavinho arregalou os olhos, e fez menção de correr. A mãe o segurou.

Ele começou a choramingar, e pedir para a mãe um balão. A mãe o segurou com mais força e disse para esperar, depois que voltasse da lavanderia, passaria no Shopping e lá tentaria encontrar um balão. Tentava domar os ímpetos do filho, sempre oferecendo algo, como compensação. Ele não sossegou. Começou a se contorcer para se livrar da mão que o segurava, como não tinha força, esperneou. A mãe suportou.

Enquanto isso, o cãozinho gania. Vanda olhava o cãozinho e se irritava com Tavinho.

Fez cara de choro, e chorou. Quem passava pela calçada olhava e tentava não interferir na cena, mas os olhares dizia tudo. O menino chorando e se contorcendo, e a mãe explicando de tentando não ser alvo de chacotas e julgamentos. Tavinho não desistiu, queria o balão e chorava, depois, virou-se para a mãe e tentou morder sua mão, ela rapidamente se desvencilhou, e foi levando o guri mais para um gramado junto a calcada, sempre de olho no carro e na filha. O menino, se jogou na grama. Esperneou e chorava e berrava. A mãe, se envergonhava.

Passado alguns instantes, chegou um carro da amiga, com um rapaz esbelto vestindo macacão azul, que se mostrava muito solicito. Todos foram para perto prestar os cuidados ao cachorrinho.

- Maêẽẽêêê --- berrou o guri.

A amiga e o rapaz se assustaram e, foi ela quem perguntou o que tinha acontecido. Soube do caso, e viu que Wanda tentava ser boa mãe, sem castigar ou ralhar com o menino. Voltou sua atenção para o animal no meio fio.

O rapaz, de macacão azul, sabia bem o que fazia, pegou a patinha dia dianteira do animal com cuidado, observou. Depois a outra, e também o abdômen, com cuidado, não fazia movimentos bruscos para não assustar o animal e também para evitar provocar alguma laceração na pele ou musculoso do cãozinho. A amiga olhava e falava baixinho como que tentando encorajar o animalzinho a ser forte. Wanda, se pegou também observando e abaixou para ver o que faziam. Tavinho na grama sentado, emburrado, choramingava e falava com aquela voz infantil.

- Mãêẽẽ… buá, buá. - Esperneava e chorava.

A amiga já sabia das birras do guri e olhou para Vanda que disse que estava atenta, mas não ligasse, ele estava cansando, e eu também, pensou com seus botões.

Com jeito o rapaz de macacão azul pegou o pequeno cachorrinho, depois de envolver seu corpo numa toalha, e se levantou para levá-lo ao carro, de onde seria levado a uma clinica para Raio X, curativos e se houvesse necessidade urgente, uma cirurgia, mas ao que tudo indicava, poderiam resolver com talas e alguns apetrechos clínicos.

- Maêẽêê…. Berrava Tavinho.

Algumas pessoas passavam e se solidarizavam com a situação do cachorrinho, e olhavam de esguelha para o menino birrento na grama.

- Maêêêê… Gritava Tavinho, chamando atenção de quem passava e até assustando o cãozinho.

Os três, Vanda , a amiga e o rapaz de macacão azul, chegaram junto ao veiculo e puseram o cachorro, com cuidado ma parte de trás, onde havia uma proteção para o mesmo. Despis de algumas palavras trocadas, um rápido diálogo, Vanda se despediu alegando ter roupas para levar a lavanderia e apontava o carro na frente onde a caçula dormia.

O carro conduzindo o cãozinho machucado foi embora, rua acima.

Vanda retornou ao carro, e se deparou com a imagem do Tavinho, sentado na grama, cabisbaixo.

O chamou, de pronto.

- Vamos, Tavinho, a mãe tá atrasada.

Ele levantou a cabeça, o corpo da grama, andou em direção ao carro de forma pesada como que marcando passo. Rosto de quem está contrariado. Passou pela mãe, ela alisou sua cabeça.

Entrou no carro.

- Tudo bem? -perguntou a mãe, já esperando outro escândalo.

Não respondeu. Apenas mexeu a cabeça como que dizendo não.

Silenciou

- Vamos então. Deixa de ser manhoso.

Seguindo o caminho, foi até a lavanderia, deixou as roupas, fez o caminho de volta, pois tinha que fazer almoço. A menina acordou e ficava olhando ao redor, com um mordedor como distração.

No caminho, quis saber do cãozinho atropelado , parou o carro, fez uma ligação para a amiga que informou que estava sob controle. O animal já havia recebido os cuidados clínicos e não precisaria de cirurgia, mas teria que usar talas e receber cuidados por um tempo. Tinha até encontrado voluntários para a adoção. Vanda ficou contente. Tinha ficado comovida com a situação do cachorrinho.

Ao se virar para olhar para o banco de trás e falar com Tavinho, viu que ele adormecera, e aí, ela se deu conta de que se esquecera de fazer a vontade do filho. Não passou no shopping, não comprou balão, o caso do cachorrinho desviou sua atenção. Sentia-se melhor assim. Tavinho precisava aprender que tudo tem seu tempo e lugar. Ligou o carro e voltou para casa.

Fim.

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Lia Fátima
Enviado por Lia Fátima em 13/10/2020
Reeditado em 23/12/2020
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