Joe Galochas
10/10/2020
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Aguardava a moça me entregar os pães que pedi, quando chega uma criança com a sua mãe ao balcão em que eu estava. Estavam de máscaras e mantiveram o distanciamento social.
Chovia muito naquele dia e o pequeno, de quatro ou cinco anos, no máximo, usava um casaco impermeável azul claro, calça de moletom azul escuro e botas de borracha transparentes que mostravam suas meias azuis de pontas brancas. Tinha cabelo comprido e seus cachos, castanho claros, saiam do capuz. Seus olhos eram castanhos grandes e expressivos. Puxei conversa com ele:
- Bacana as suas botas transparentes, dá para ver as meias. Ele me olha, mas não responde. Continuo:
- Você sabe qual é o nome que se dá as suas botas?
- Sei - responde.
- Ah, e qual é?
- Galocha!
- Não acredito! Faz muito tempo que não escuto alguém, ainda mais tão pequeno, falar esse nome. Quem te ensinou?
A criança aponta para a sua mãe atrás dele, que sorri.
- Incrível uma criança hoje saber esse nome. É muito antigo - falo para ela.
- Pois é! É como se chama essa bota no Rio Grande do Sul - responde.
Volto-me à criança e pergunto:
- E qual o seu nome?
- Joe.
- Muito prazer Joe. Quantos anos você tem?
- Quatro - responde mostrando 4 dedinhos.
- Foi muito legal te conhecer Joe. Adorei as suas galochas transparentes. Tchau e bom domingo!
-Tchau - me responde.
Despeço-me deles, seguindo no mercado com as demais compras, mas pensando na resposta inusitada do garoto.
Pego outras coisas e vou ao caixa, colocando-as na bancada, quando também ele chega com sua mãe. Joe me olha amigavelmente.
Falo então para o rapaz do caixa, de 17 a 18 anos de idade:
- Você sabe o que são galochas?
- Galochas? Não sei.
Olhei para o Joe e disse:
- Joe, mostra para ele o que são galochas.
O garoto levanta a sua perna direita e apoia a bota na lateral da bancada do caixa, dizendo para o rapaz:
- Olha aqui a minha galocha - colocando a sua mão nela.
O rapaz olhou e deu risada do garoto. Espantado, me respondeu:
- Nunca soube que o nome de bota de borracha é galocha.
- Pois é, muitos não sabem.
Pago, pego as sacolas e olho para Joe, que vem ao meu encontro faceiro, mostrando-me um chiclete que a mãe lhe dera:
- Olha o que eu ganhei da mamãe!
- Opa, que legal Joe! Foi muito bom te conhecer. Bom domingo! Tive vontade de lhe dar um abraço gostoso, mas a pandemia impedia. Tocamos nossos cotovelos apenas, como cumprimento de despedida. É querido o Joe.
-Tchau, bom domingo também - despede-se ele.
Vou em direção ao meu carro estacionado em frente ao mercadinho, observando Joe e a sua mãe saindo a pé, acenando-lhe do veículo.
Chego a minha casa e curioso pesquiso a origem do nome galocha na internet: " Deriva do Francês galoche, parece que vindo do Latim gallicula solea, "sandália da Gália", um calçado de sola alta de madeira para os dias de chuva. "
É uma graça, o Joe Galochas.
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