"A Espera"

20/10/2019

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Caminhávamos pela praia em um sábado quente com uma fresca e leve brisa. Dia agradável! Nós, minha mulher e eu, íamos pela praia junto ao mar que lambia nossas pernas com sua água gelada. Na arrebentação ao fundo, surfistas aproveitavam as ondas com suas manobras de bailarinos aquáticos, deixando jorros de água como auréolas prateadas em seus rastros. Uma bela visão aquela; um belo dia aquele!

No meio da praia, um cachorro de pelo negro e denso se mantinha dentro da água, sem se importar com as marolas que lhe batiam no corpo. Observava atento e fixamente o horizonte, parecendo um guardião. Inicialmente pensei que fosse um desses cães sem dono que perambulam pela praia atrás de qualquer um que lhe dê atenção, como eu. Mas não, continuava fixo, indo de encontro às ondas, até. Aguardava seu dono surfando, deduzi.

- Olha ali aquele cachorro sentado na água, que graça! Deve esperar seu dono, não para de olhar para o mar - comento com ela.

- Fernandinho, deve ser um cão de praia. Vais mexer com ele?

-Mas ele não vai com ninguém! Tem dono. Veja, fica estático olhando para onde estão surfando aqueles dois ali. Olhe!

Aproximo-me dele caminhando pela água que me olha virando seu focinho:

-Vem bonitão, vem! - levanta-se e corre para mim, mas ao chegar perto, sente que não sou seu dono. Para então sua corrida, ressabiado. Abaixa a cabeça em busca de odores familiares.

-Eheheh, bonitão, não sou seu dono, né? Vem, vem me mostrar onde está ele.

Vem até nós, sabendo sermos desconhecidos. Passo a mão em seu pelo grosso, curto e limpo. Era baixo, forte em suas pernas curtas, mas um pouco gordo - "Acho que é castrado, tá gordinho! ".

Então, sai um surfista do mar, ele corre em disparada achando que é aquele o seu dono. Observamos a cena. Chegando próximo ao rapaz para frustrado a sua correria: não é quem tanto aguarda. Senta novamente na água com os olhos firmes nas ondas ao fundo, orelhas e nariz atentos aos movimentos e cheiros, à espera. Uma graça a fidelidade daquele animal!

Continuamos, e no retorno, cerca de vinte minutos depois, o encontramos ainda esperando. Onde será que está o seu dono? - pergunto olhando para o mar.

Fomos até uma duna para montar acampamento e entrar na água. Eu o observava curioso para ver como seria ele, como se tratariam, sua amizade, relação, pois pela forma como o aguardava, deveria ser profunda! Entramos no mar gelado.

Pessoas passavam por ele e mexiam, falavam e tentavam fazer-lhe carinho, tocá-lo, mas nada, continuava sentado estático. Voltamos para o nosso ponto na areia. Minha mulher deitou-se para se aquecer ao sol e eu me sentei, ainda a observá-lo. Minutos depois, levantei-me e fui até ele. Preocupava-me, pois poderia estar perdido, longe de onde seu dono entrara no mar.

-Vem, vem cá bonitão, vem. - chamei-o, agachando-me e estendendo-lhe o braço direito. Olhou-me e veio rápido, mas parou desconfiado, sentando na água. Comecei a correr, chamando-o.

-Vem, vamos ver se achamos o seu dono! Levantou-se, correu alguns metros comigo, mas estacou, fazendo círculos, de cabeça baixa sentindo os cheiros que não eram os que fossem. Estava se familiarizando comigo. Deixei-o novamente sentado junto à água

-Então como foi? Tá difícil conquistá-lo, hein, Fernandinho! Você e os cachorros, não? Sempre tem um vira-lata pulguento que te atrai ou você a ele.

-Ele não é vira-lata, tem dono, você viu que não vai com ninguém.

Ficamos ao sol por alguns minutos. Em dado momento, estava próximo a nós, chamei-o assobiando. Ele levantou as orelhas, virou-se para mim e veio correndo em nossa direção - acho que fiz o mesmo tipo de assobio do dono. Chegou, cheirou e começou a querer se deitar sobre mim. Já éramos amigos! Comecei a lhe acariciar o pelo muito grosso e negro, cor de petróleo como seus olhos. Um belo e querido cachorro!

-Eheheh bonitão! Pena que tem dono, senão te levava pra casa! - digo passando a mão sobre o corpo rijo e cabeça firme; ele agradecia aos carinhos fechando um pouco seus olhos.

-Se levasse todos os cachorros que encontra, teríamos um canil em casa, né Fernandinho?

-Ehehe, pois é! Eu os atraio.

Ficou deitado conosco certo tempo. Viu a saída de alguém do mar, levantou a cabeça, orelhas atentas, saiu em disparada na esperança que fosse seu dono. Nada. Sentou-se na água e reiniciou seu ritual de aguardo. Nós, levantamos acampamento e fomos para casa.

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Fernando Ceravolo
Enviado por Fernando Ceravolo em 09/10/2020
Código do texto: T7083243
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