“Tamo Tudo Fudido!”

03/10/2020

269 - S/CRRÇ.

O casal foi passar um final de semana em uma pousada na serra, logo nos primeiros dias do mês de janeiro daquele ano. Era rustica, toda em madeira bruta, espaçosa e aconchegante. Encravada em uma mata preservada e densa, o lugar era bucólico e tranquilizante.

Chegaram ao meio da tarde do sábado, com o dia ainda claro e quente de verão.

Os donos, um casal simpático e alegre, hospitaleiros e conversadores, os receberam como se fossem seus familiares, mostrando-lhes os aposentos e dizendo tudo sobre o que se podia fazer na região e na cidade.

Também, comentaram sobre as comidas, os embutidos e bolachas de manteiga, "cucas" e outras guloseimas típicas alemãs, pois a cidade fora quase toda colonizada por eles, o que deixou o casal interessado, pois a hospede era descendente e ficou eufórica:

-Nossa, eu adoro essas coisas, inclusive agora nesta época das festas de fim de ano, deve ter aqueles biscoitos típicos alemães, que se colocava na árvore de Natal na minha casa quando eu era criança. - comentou.

-Ah sim, tem sim. É feito por uma senhora, alemã é claro, meio rabugenta e que não atende muito bem, mas faz os doces, biscoitos e tudo o mais muito bem. São deliciosos. - respondeu a proprietária, com o seu marido ao lado dando risada.

-E tem uma historia muito engraçada com essa doceira, que aconteceu com a minha esposa. - diz ele ao casal recém-chegado.

-E qual é? - pergunta o hospede interessado no caso.

-Uma amiga da minha mulher fez um pedido de um bolo de aniversário para a rabugenta e ficou combinado que a minha mulher iria retirar. Tem um detalhe, a doceira sofreu um derrame e tem o lado direito do rosto paralisado, prejudicando a sua fala!

-Sim. - acompanham os hospedes atentos a historia que começava a ser contada.

-Só que outra mulher pediu um bolo igual ao da amiga da minha mulher, no mesmo dia e horário de entrega. A doceira se confundiu, estava com muitos pedidos e fez só um deles, que foi retirado antes por essa cliente!

-E o que aconteceu? - pergunta a hospede curiosa.

-Fomos então eu e a minha mulher buscar o bolo encomendado. Quando a alemã nos viu, não entendeu nada, perguntando: "Sua amiga já retirou o bolo!" Disse-nos ela com sua fala torta e carregada. - continuando a história.

-Nossa, que enrosco hein! - replica a hospede.

-Minha mulher então respondeu brava: "Minha amiga? Não, ela não retirou não! Eu vim agora para pegar o bolo! E como ficamos, é o aniversário dela e fiquei de levar o bolo, que não tem! Como ficamos?"

O hospede começou a rir do imbróglio , imaginando o que viria. O proprietário também , pois chegava ao desfecho do "causo":

-A rabugenta da alemã olhou firme para a minha mulher, e falou curto e grosso na sua delicadeza germânica: "Como tamo? Tamo tudo fudido, tudo fudido!"

O casal hóspede começou a gargalhar, pois foi inesperada e hilária a resposta dada, despertando neles ainda mais curiosidade em conhecê-la.

Instalaram-se os hospedes no chalé e saíram a pé para um passeio pela cidade, voltando já noite. Fizeram uma refeição leve para dormirem bem.

No dia seguinte, no café da manhã, combinaram com os proprietários de lhes mostrarem os pontos turísticos da cidade e irem até a doceira da rabugenta, pelo grande interesse pela historia do bolo, e pelos doces também.

Chegaram à confeitaria, curiosos. Estava fechada, pois era domingo, mas o dono da pousada disse que ela morava lá, tocando a campainha.

Abriu a porta uma senhora alta e forte, de cabelos curtos como algodão, olhos azuis e o rosto um pouco deformado pela paralisia, denunciada pela tortura da sua boca.

-Bom dia! - cumprimentou a todos, que entraram na loja admirando os doces, bolachas e tudo o mais que ela tinha disposto nas prateleiras para a venda.

A hospede maravilhou-se com os biscoitos de Natal da sua infância, com seus formatos de coração, estrela, Papai Noel, todos eles embalados em saquinhos de plástico fechados com fitas coloridas, comprando, exultante, vários deles e outros de manteiga e de amendoim. Fez ela a festa, deixando a doceira alemã rabugenta feliz.

O hospede e o proprietário ficaram junto à porta de entrada, rindo dissimuladamente da doceira, relembrando a historia do bolo.

Depois, voltando no carro dos donos da pousada, o hospede comentou:

-Querida, pelo menos não "tamo fudido"! Tinha tudo o que você queria, não é mesmo?

Todos no carro gargalharam alegremente.

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Fernando Ceravolo
Enviado por Fernando Ceravolo em 04/10/2020
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