É dia de Reis
Folia de Reis vem lá! Seis de janeiro. Às vezes os foliões saem bem antes do dia pra ver se arrecadam um trocado a mais, pois em cada casa é tradição serem recebidos com mesa farta e algum “agradinho” para o grupo.
Em casa abastada espera-se um pouco mais, mas casa abastada não é sinal de gente generosa.
O homem na casa ao lado está em cólicas.
Não deseja a visita do reisado, não gosta, sei lá! E eles vêm vindo. Já é possível ouvir a canção de despedida, estão vindo! “Meu Deus e agora? Finjo que saí?”
O homem barrigudo, cabeça ralinha e branca, olhos de profundo azul e óculos na ponta do nariz se contorce, caminha pra lá e pra cá. Não é devoto, não tem fé, não quer saber dessas violinhas bestas e desse povo de roupa colorida. Não quer saber de nada. Além disso, vai acabar perdendo a novela, tá quase na hora. “Esse povo não tem mais o que fazer?”
No seu conflito interno o homem ajeita os óculos, puxa a calça pra cima onde deveria ser sua cintura, abotoa a camisa velha e desbotada e sorri. Teve uma ideia.
Lá vem o reisado, para uma surpresa como nunca se viu. Saindo a cantarolar pela rua, encaminham-se para a casa do velho rabugento. As luzes estão acesas, sinal de que tem gente. Provavelmente gente esperando por eles. A comida deve estar farta. Vão encher o bucho novamente e encher os culotes de dinheiro. Vão cantar até esgoelar pra aquele homem de semblante engraçado de tão malicioso.
Mas não esperavam ser importunados por um moleque descalço que vem correndo na direção do cortejo.
“Para, minha gente! Para!” – Grita o menino esbaforido, quase vomitando os pulmões. “O homem da casa ao lado pediu para os senhores não irem lá, mandou pagar antecipado só pra não ser visitado.”
Por hoje encerrou-se o reisado.